quinta-feira, outubro 27, 2016

A batalha por Lisboa


A 29 de Setembro passaram 3 anos desde as últimas autárquicas e da noite chuvosa mas emocionante em que Rui Moreira chegou à presidência da Câmara do Porto. Falta portanto menos de um ano para a próxima contenda municipal, e as máquinas partidárias já pensam nos seus candidatos.

Ao contrário do que sucedeu em 2013, ninguém espera uma grande batalha eleitoral no Porto. Moreira reúne uma enorme taxa de aprovação e o apoio é mais que muito, de tal forma que o PS, chamado a partilhar a governação municipal, e ainda que com algumas resistências no aparelho, desistiu de apresentar candidato próprio e apoiará o actual presidente. O CDS, único partido na altura a apoiá-lo, continuará naturalmente na coligação municipal. O PSD, opositor à maioria, anda às voltas para arranjar um candidato que não perca por muitos. Provavelmente será o actual provedor da Santa Casa da Misericórdia do Porto, António Tavares, que anda com o típico discurso do "não estou disponível" até surgir com um "candidato-me com grande sacrifício movido por uma vaga de fundo...". Vai uma aposta? O resto deverá ser o habitual candidato da CDU a vereador e uma candidatura inócua do Bloco.

Em 2017 as situações nas principais cidades estarão invertidas em relação em 2013: uma eleição sem grande história no Porto e uma batalha trepidante em Lisboa. Fernando Medina parte com uns quantos espinhos no caminho por causa das obras intermináveis (e a "obra feita" já não atrai assim tantos votos), mas com a confiança de que não surgirá nenhuma candidatura forte o suficiente para a atrapalhar a sua eleição.
Até agora, só Assunção Cristas se chegou à frente oficialmente como candidata ao município. É duvidoso que ganhe ou mesmo que fique em segundo, coisa que não sucede desde os anos setenta, o que a acontecer seria uma humilhação para o PSD. Mas pode vir a complicar as contas, tanto para um lado como para o outro. Até porque não se esperam grandes maiorias. E depois, há a hipótese improvável do PSD vir mesmo a apoiar Cristas, tal como apoiou Abecassis, com sucesso, no anos oitenta (se bem que aí as condições fossem diferentes, até porque, como atrás se disse, nas primeiras autárquicas o CDS ficou em segundo, em parte talvez porque o PSD tenha perdido eleitorado ao apresentar uma mulher, coisa rara na altura, ainda para mais jovem, de seu nome Helena Roseta). Se assim fosse, Cristas poderia mesmo vir a governar Lisboa. Para o PSD, a tarefa de encontrar um candidato vencedor não parece nada fácil, e mesmo a hipótese Santana, nada certa, pode já não causar grande impacto. Veremos se prevalece o sentido de vitória ou se a trincheira com o CDS se cava, ou quem ganha entre o aparelhismo e sectarismo

Há também a hipótese do BE, que não tem tido resultados muito honrosos na capital, e numa lógica de "geringonça", apoiar Medina. E como muitos se lembrarão, também o PCP se juntou ao PS, em coligações de sucesso que duraram até ao desgaste com João Soares. Mas isso ficará para um próxima post.
 
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sexta-feira, outubro 21, 2016

Imagens da Caledónia


A Escócia é um bom destino de viagem de inícios de Outono, até porque as temperaturas parecem as de Dezembro em Portugal. Mas se se tiver a sorte de não apanhar chuva - difícil mas perfeitamente possível - vale bem a pena. As paisagens das Highlands são imponentes e belíssimas, principalmente a que rodeiam os lochs. Edimburgo é uma cidade ao mesmo tempo monumental e dinâmica. E as velhas tradições coexistem com a modernidade. Ninguém se admire se vir à noite, nos pubs ou restaurantes,  homens de kilt sem serem empregados ou guias turísticos.


Edimburgo ao pôr do sol, vista de um dos clássicos miradouros, a Carlton Hill.


O ex-líbris da capital escocesa, o imponente Castelo de Edimburgo, onde entre outras estão guardadas as jóias da coroa da Escócia, que em 300 anos, só de lá saíram uma vez para a abertura do parlamento, em fins dos anos noventa.

Urquhart Castle, sentinela do Loch Ness. Por ele passaram diversos defensores, invasores, como o clá MacDonald, e reis escoceses. Em fins do século XVII, em plena guerra civil, uma explosão provocada pela própria guarnição em fuga para impedir a tomada pelos Jacobitas retirou-lhe muita da imponência de outrora.


O Loch Ness, visto do Norte, perto de Dores.Uma combinação de cores única, com o famoso lago e os seus 35 quilómetros de comprimento em e evidência.


Inverness, principal burgo das Highlands, atravessada pelo rio Ness, que nasce no loch com o mesmo nome. Uma igreja por cada denominação. À esquerda, a igreja católica local, com um serviço de missa especial em polaco.

Uma curiosidade: como disse um amigo meu, encontra-se uma Union Jack nas Highlands é tão difícil como avistar a Nessie. E no entanto, no referendo de 2014 sobre a independência da Escócia, a maioria dos locais votaram pela permanência no Reino Unido.

sexta-feira, outubro 14, 2016

The Times they are Changing, ou uma nomeação justa


A nomeação de Bob Dylan para o Nobel da Literatura deste ano apanhou a maioria de surpresa. A mim também, em parte, porque já noutros anos tinha ouvido falar na possibilidade de escritores de canções, com Dylan e Leonard Cohen à cabeça, poderem ganhar o galardão, mas era sempre uma hipótese remota. Mas houve algum choque pelo meio, mesmo nos membros da Academia. Percebe-se agora melhor a demora e os sucessivos adiamentos na atribuição do prémio.

Os jornais de hoje noticiavam largamente a decisão e interrogavam escritores, músicos e especialistas na matéria. As opiniões e as razões mais que se dividiam. Se uns se regozijavam, outros não escondiam a indignação, o desprezo e até algum sentimento de ultraje. E não faltaram as piadinhas da praxe nas sempre activas "redes sociais".Se alguma qualidade este prémio tem é o de pôr as pessoas novamente a discuti-lo. Até agora, era a relevância e a notoriedade do galardoado o maior motivo de discussão. Duas características que não faltam a Dylan, pelo que o que se debate agora é a própria natureza da literatura, ou, quando muito, o seu conceito. Para os mais críticos, a escrita de canções é algo de inteiramente diferente da literatura. Pertence ao domínio de outra arte, a música, e logo nas suas vertentes menos "nobres", nomeadamente a pop. A literatura "a sério" serão pois a poesia e a ficção em prosa. E vá lá, a dramaturgia, senão Beckett e outros teriam de ser desnobelizados.

Por muita estranheza que este prémio possa causar, não me parece que se afaste do essencial. Falamos de música, evidentemente, mas acima de tudo da poesia que se emaranha nos sons para firmar as suas letras. Bob Dylan é um letrista exímio, um poeta da música, uma inspiração para os seus contemporâneos e para as gerações seguintes, um activista social através da poesia e dos sons que a sua guitarra emana. Mudará talvez a forma como é exprimida, mas como escreveu o agora nobelizado, The Times They are Changing . as premissas para ganhar o prémio estão lá. E depois, se só se aceita o puro trinómio poesia/ ficção/dramaturgia, como é que Churchill, com as suas memórias de guerra, ou Bertrand Russell, podem ter ganho o respectivo Nobel da Literatura, já que as suas obras não se encaixam nessas premissas?

Não sou um fã de primeira água de Bob Dylan nem conheço a fundo a sua obra. Mas pelo que apesar de tudo sei, tanto do que criou como da sua vida, e não sendo uma absoluta surpresa, compreendo a opção. Antes isso do que uma escolha politicamente correcta por um qualquer obscuro autor da Suazilândia ou do Laos. Só tenho mesmo pena que os de língua portuguesa continuem a ser olimpicamente ignorados desde Saramago.
 E claro, posso mesmo dizer que já assisti ao vivo a uma actuação do agora galardoado, no cenário espantoso de Vilar de Mouros.

A atribuição do Prémio Nobel da Literatura de 2016 ao homem que nasceu Robert Allen Zimmerman é inteiramente justa.

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quarta-feira, outubro 12, 2016

O discurso de Unamuno


No Delito de Opinião, Pedro Correia recorda que passam oitenta anos do corajoso e tonitruante, se não no tom de voz pelo menos na sua carga moral e emocional, discurso de Miguel de Unamuno na Universidade de Salamanca, em frente a Millan Astray, Carmen Polo e José Maria Péman. Aconteceu em 12 de Outubro de 1936, e seria a última aparição pública do velho filósofo da Geração de 98, numa altura em que Espanha mergulhava na mais horrível e dramática das guerras.

 

terça-feira, outubro 11, 2016

Uma reunião no telhado (com provas fotográficas)

 
E se numa viagem de lazer subir a um ponto alto no centro de uma cidade histórica, tirar uma fotografia a um edifício nobre numa cota um pouco mais baixa, e ao vê-la reparar que estão pessoas a discutir com ar tenso no telhado desse edifício? E publicar essa mesma fotografia nas redes sociais, e nas horas seguintes os jornais locais e nacionais a reproduzirem incessantemente?

Aconteceu isso, sem tirar nem pôr, ao Frederico Duarte de Carvalho. Numa fotografia tirada ao acaso do Monumento a Victor Emanuel (também conhecido como o "bolo de noiva"), que apanhou a parte de cima do palácio da Piazza do Campidoglio que serve de sede ao município de Roma, surge a "sindaca" da capital romana, Virginia Raggi, numa discussão com o seu assessor, no telhado do edifício. Nesse mesmo dia soube-se que a Cidade Eterna desistira de organizar os Jogos Olímpicos de 2024, além de outras mudanças da estrutura interna do município. Publicada no Facebook e no Twitter, a foto, com a legenda "supresas nos telhados de Roma", espalhou-se nas redes sociais italianas (ou tornou-se "viral", se preferirem"), e no próprio dia já era difundida pela imprensa transalpina. Alguns jornais citaram o nome do Frederico, outros não, mas o certo é que a foto tirada por "um jornalista português de férias" tornou-se a mais comentada em Itália por aqueles dias.







Se alguns, como o mítico Unitá, antigo órgão do Partido Comunista Italiano, citado nos livros de Don Camillo e hoje despojado de boa parte do seu conteúdo ideológico (mas ainda alinhado à esquerda), a fotografia enche a capa, noutros, como o La Repubblica, também é motivo de notícia, mesmo que não tenha honras de primeira página. E ainda houve caricaturas a satirizar a estranha reunião.



O que é certo é que depois das redes sociais e das capas de jornais houve várias reacções políticas, a começar pela própria Raggi, que tentou ironizar com a situação, coisa que o primeiro-ministro, Mateo Renzi, de que o movimento a que autarca pertence é adversário, não se coibiu de fazer, tentando ridicularizá-la um pouco mais.
Resta saber se depois de se apropriarem da foto, os jornais pagarão os direitos de autor ao Frederico Carvalho. Ou as imagens de Facebook são de livre disposição?

sexta-feira, outubro 07, 2016

Guterres na ONU (e uma previsão)

 
Fiquei particularmente contente com a nomeação de Guterres para Secretário-Geral da ONU por: 1- ser o mais elevado cargo exercido por um português desde o Papa João XXI; 2- por ser Guterres, um dos políticos mais qualificados e com mais carácter que já vi, e que apesar de nalguns momentos importantes ter tido falta de pulso, nomeadamente dentro do seu próprio partido, outros houve em que demonstrou uma fibra incrível (caso de Timor); e acima de tudo porque se tratou da escolha mais transparente e meritocrática possível (descontando todas as cedências, discussões e jogos de bastidores que necessariamente há nestes casos), resultando na escolha de um português excepcionalmente bem preparado, o que mostra que os portugueses podem mesmo ir longe com a sua competência. 
                                                                                 
Demonstra também o quão eficaz continua a ser a nossa velha e experiente diplomacia, que mantém o "pequeno milagre permanente" chamado Portugal há mais de oito séculos. todo um trabalho do corpo diplomático português, incansável, imperturbável e muitíssimo competente.

 Curioso é que há precisamente vinte anos Guterres era o chefe do governo e Marcelo Rebelo de Sousa o líder da oposição. E exactamente no mesmo ano de 2016 os dois velhos amigos, antigos adversários políticos e veteranos da vida pública portuguesa atingem o topo das suas carreiras, um à frente da ONU, o outro como chefe de estado de Portugal.
 
Quem havia de adivinhar? Ora, o major Valentim Loureiro. Ele é que já estava a prever isto e começou a "aclamação" de Guterres vinte e um anos antes do Conselho de Segurança o fazer.