terça-feira, março 29, 2016

Páscoa tranquila para uns e sangrenta para outros


Carnaval na rua, Páscoa em casa (ou vice-versa), diz-se popularmente. Este ano passou-se tudo em casa. Se bem que para os meus lados o tempo até tenha ajudado no Domingo Pascal e permitiu que se fizesse um conjunto de visitas a familiares nas proximidades e que o Compasso (este ano constituído em maioritariamente por raparigas, sinais dos tempos) não tivesse ficado ensopado. Chuva à parte, tudo correu bem por terras vilarealenses.

                                                    Viaduto sobre o Corgo, Páscoa 2016
 
O mesmo não puderam dizer aqueles infelizes paquistaneses que sofreram um atentado horroroso que matou mais de setenta pessoas, em grande parte crianças. Se na Europa os últimos tempos têm sido o que se sabe, imagine-se o que será no Paquistão, esse país caótico, violentíssimo e em grande parte tribal, que já viu de tudo, incluindo chefes de estado e de governo assassinados, fosse por ordem judicial, por transportes armadilhados ou por tiroteios. A população, essa, é vítima inúmeras vezes de atentados como o desta Páscoa, com os Taliban a quererem mostrar que estão activos também fora do Afeganistão. Ser-se de uma minoria, e particularmente, ser-se cristão nesse país deve ser um risco diário. Já agora, e dado que se fala tanto de islamofobia na Europa e de outras fobias, quando é que começamos a ouvir falar de cristofobia na nossa comunicação social? Os números e os factos não o justificam? Ou a linguagem politicamente correcta não o permite no seu vocabulário taxativo? 

terça-feira, março 22, 2016

Bruxelas, agora


Quando ouvi de manhã na rádio a notícia dos atentados de Bruxelas fiquei preocupado, mas não espantado. Era quase certo que mais dia menos dia haveria algo do género na sede das instituições europeias e capital do país que mais jiadistas enviou percentualmente para o Médio Oriente. A ameaça era latente, há poucas semanas Bruxelas tinha passado por um quase estado de sítio, depois dos atentados em Paris, e a prisão do seu orquestrador fazia pensar que as diversas células não iriam quedar-se no marasmo.
Mas fiquei particularmente incomodado porque ainda ontem à noite tinha estado a rever curiosidades e obras da BD fraco-belga, há muito um dos meus interesses, e a pensar que se fosse a Bruxelas, que não conheço, não seria para ver a Comissão Europeia, o Manneken Piss ou o Atomium, nem por causa dos chocolates (de que também sou fã), das moules frites ou dos jogos do Anderlecht, mas para ir ao museu de BD e às livrarias especailizadas. Na senda de Hergé, E.P. Jacobs, Bob de Moor, Morris e de tantos outros, um universo que em Portugal pode-se quando muito encontrar em alfarrabistas e antigas coleccções particulares e que se tornou na maior exportação e num dos cartões de visita da Bélgica. De tal forma que hoje, para exprimir o "luto", muitos cartoons inspiram-se em Tintin, provavelmente e ainda o "belga" mais conhecido.



PS: já que fazemos campanhas de solidariedade em cada atentado na Europa, que tal pensar na Turquia? Em duas semanas sofreram dois nas principais cidades, Istambul e Ankara, fora os dos meses anteriores.

domingo, março 20, 2016

Lula, Getúlio, Marx


A confusão que se vive hoje no Brasil, com as prisões saídas do Lava Jato e do Mensalão, as manifestações anti e pró-PT, a justiça federal tentando a prisão preventiva de Lula, as ameaças deste aos magistrados, a pouca idoneidade dos mesmos, a chico-espertice da actual Presidente ao nomear o antecessor para ministro para lhe garantir a imunidade, a suspensão judicial da nomeação, parece não ter fim. A cada hora há um novo capítulo e um novo caso. O país está sob fortíssima tensão, há quem apele às forças armadas contra o poder executivo de Brasília, outros clamam pelo poder popular, e pelo meio um dos partidos que suportava a presidência de Dilma, o PRB, conotado com a IURD, resolveu oportunisticamente mudar de barricada.
A história brasileira dos últimos cem anos é rica em caudilhismos, tentativas de afastamento de presidentes (algumas com sucesso) e manifestações populares mais ou menos histéricas. A tentativa de empeachment a Dilma e de prender Lula recordam o que aconteceu a Collor de Mello, e muito mais atrás, a Getúlio Vargas, um presidente muito popular que ao pressentir que o podiam prender, no exercício do cargo, por estar supostamente implicado na tentativa de assassínio de um adversário político, se suicidou, "saindo da vida para entrar na história". Não me parece que Lula seja do tipo suicidário, ou pelo menos espero que não. Mas talvez fosse bom mostrar-se mais razoável numa altura tão quente, e logo num ano em que se realizam os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, outra daquelas manifestações de regime decididas pelo PT e que se arrisca a tornar-se num requiem aos anos de crescimento económico que já lá vão. Se a confusão não aumentar no Brasil, Lula ficará talvez impedido de exercer cargos políticos por uns anos, inviabilizando qualquer veleidade presidencial. Não terá certamente o destino de Getúlio. Aqui Marx tinha razão: a história repete-se, primeiro como tragédia, depois como farsa.

terça-feira, março 15, 2016

Nicolau Breyner 1940 - 2016


Nicolau Breyner era daquelas personalidades de que não nos lembramos de não conhecer. Para além da sua participação em novelas (protagonizou a primeira novela portuguesa, "Vila Faia", como o camionista João Godunha), teatro, programas de humor, concursos, talk-shows, sitcoms desengraçadas e séries de humor engraçadas ("Gente Fina é outra Coisa", em que dirigiu Amélia Rey Colaço) e até uma breve passagem pela política - quando se candidatou à câmara da sua terra, Serpa, cometendo a proeza de levar o CDS ao segundo lugar em pleno Alentejo dominado pelo PCP - fica-nos acima de tudo a sua passagem pelo cinema, terreno onde demonstrava todo o seu valor e a sua versatilidade como actor, tanto em comédia como em drama. E resta-nos também essa obra e a imagem de um homem de fé - tal como este blogue, benfiquista, monárquico e católico - que parecia estar sempre bem com a vida.


segunda-feira, março 14, 2016

O partido de Assunção Cristas

 
Ainda não sei muito bem o que será Assunção Cristas no CDS. A sucessão de Portas será sempre complicada, se bem que aqui, ao contrário da anterior saída, tenha o apoio do ex-líder, e por isso não passará pelas dificuldades por que passou Ribeiro e Castro. Lançou algumas propostas que devem ser estudadas, como a reforma de segurança social e as regras de nomeação do governador do Banco de Portugal, reiterou o apoio a Rui Moreira nas próximas autárquicas e declarou que o CDS se vai lançar sozinho à câmara de Lisboa. São pontos importantes. Mas ideologicamente falando, se é que isso ainda conta para alguma coisa, Cristas ainda deixa dúvidas. Sendo democrata-cristã, é muito duvidoso que queria voltar aos tempos do CDS original e "rigorosamente ao centro" de Freitas, Amaro da Costa e Basílio. Mas também não pode seguir a linha tão pragmática de Portas, nem voltar ao conservadorismo eurocéptico de Manuel Monteiro, até porque os "monteiristas" no partido se devem contar pelos dedos. E o facto de ter chamado para o núcleo duro alguns nomes tidos como mais liberais, como Adolfo Mesquita Nunes e João Rebelo, ainda complica mais qualquer previsão.
 
Será interessante seguir o percurso do CDS de Cristas, tanto na sua parte ideológica como na programática. Sem esquecer, apesar de tudo, que pretende fazer um caminho com mais autonomia do PSD, agora "social-democrata sempre", com intuitos de apanhar o centro, o que liberta espaços à direita.
 
 

domingo, março 13, 2016

Uma semana inesquecível


Concluiu-se uma semana de sonho para o Benfica como há muito não se via. Todos os vitupérios, gozos e faltas de respeito para com Rui Vitória caíram por terra. Não que o técnica do Benfica tenha passado a ser exepcional, mas já deu provas de ser mais do que um mero "professor de ginástica". Demonstrou que é mesmo um técnico a sério e que o Benfica tem cérebro, ao contrário do que mastigava o seu antecessor.
Nos últimos dias, vimos o Benfica vencer em Alvalade - com sorte, mas com esforço e inteligência - depois de todos nos prognosticarem a derrota, para mais com a lesão de Júlio César, e o Porto a afundar-se em Braga nos seus próprios erros, e ainda fomos buscar a passagem aos quartos de final da Liga dos Campeões a S. Petersburgo, nas barbas de André Villas Boas. Ou seja, passagem para o primeiro lugar isolado do campeonato, derrotas dos dois rivais e uma vitória preciosa e emocionante frente aos milionários da Gazprom e ao insuportável Hulk, o "incrível" jogador que nunca subiu além da Rússia. Se na Luz o triunfo arrancado a ferros era um bom tónico depois do desaire com o Porto, na cidade dos czares, o Benfica, depois de uma primeira parte equilibrada, e de na segunda ter sofrido um golo estúpido e consentido, soube ir atrás do empate, ser inteligente, desequilibrar o adversário e dar o golpe de misericórdia, com uma vitória que já nem era necessária para a passagem aos quartos de final da prova mas que moraliza ainda mais para os próximos dois meses (e que melhora a classificação das equipas portuguesas na UEFA). André Villas Boas, que já se sabe que vai deixar o clube russo no fim da temporada e que tantos desgostos deu ao Benfica em 2011, volta a ficar com a carreira tremida. Uma pequena vingança co  saudações da Luz.
 
A semana pode ser de sonho, mas convém voltar à terra. Os quartos de final serão extremamente difíceis de passar, venha quem vier. Ainda há uma meia final da Taça da Liga por disputar em Braga. e o campeonato já está aí, com o Tondela, esse modesto clube da Beira Interior que está em último mas que já roubou pontos em Alvalade. E continuam a faltar alguns jogadores importantes. Cautela, portanto.
 
Mas o gozo dessa semana inesquecível já ninguém nos tira.
 
 

sexta-feira, março 11, 2016

Marcelo presidente

 
É oficial: Marcelo Rebelo de Sousa é o novo chefe de estado, já começou a quebrar o protocolo e as medidas de segurança e tem taxas de popularidade gigantescas. Não haja dúvida, é mesmo o oposto de Cavaco Silva, que exigia medidas securitárias exageradas em todas as situações e em todos os momentos. Mas é impossível não exibir pelo menos um sorriso nestes dois dias de Presidente Marcelo. Quebra as expectativas ao chegar a pé pelo lado oposto ao previsto, organiza um concerto nas ruas, homenageia mais portugueses do que era habitual e ainda estende a tomada de posse à segunda cidade do país. Hoje, na sua vinda ao Porto, na saída da câmara, na sua passagem no automóvel (a dada altura queria fazer o percurso entre os Aliados e o Palácio de Cristal a pé) e na visita ao bairro do Cerco, ficou visível a empatia que tem com o público e a espontaneidade dos gestos (digo não só pelas imagens mas também pelo que me contou quem esteve na cerimónia). Resta saber como será o mandato propriamente dito e a sua relação com todos os problemas que previsivelmente aí virão. Mas é sempre salutar ver um chefe de estado com tal à vontade e com um discurso de esperança. Quase que me concilia com a república. Mas falta o quase.
 
 
 
E só mais uma nota: aquelas bancadas do BE, do PCP e apêndices podem não ter aplaudido (julgo que com a excepção de uns BEs cá do burgo) porque "compreenderam bem o discurso de Marcelo que os desarmou e se aplaudisse freneticamente isso não caía bem entre as suas bases", segundo Freitas do Amaral. Mas quem passa o tempo a defender a Constituição, a república, e quando lhes convém, a democracia, devia ter um mínimo de coerência e aplaudir alguém eleito por mais de metade dos eleitores, que representa a república e que jura perante a CRP. Ao não o fazer, desrespeitam tudo aquilo por que se dizem bater. Mas não espanta nada vinda de formações com base no marxismo-leninismo, no maoísmo e noutros -ismos pouco recomendáveis, e que nunca tiveram o mínimo de respeito pelos seus adversários e ignoram olimpicamente o que seja a educação democrática. E pensar que desde Outubro que dizem que "a direita está raivosa". Nesse caso, a extrema-esquerda está esquizofrénica. Que sirva de aviso ao PS.

terça-feira, março 08, 2016

Sobre a retirada de cena de Cavaco Silva

 
 
 
Agora que Cavaco Silva está a poucas horas de se reformar fazem-se os balanços da vida sob o político que mais anos dominou esta terceira república. Na maior parte dos casos bate-se no homem. Não sou cavaquista e nem nunca votei nele, até porque em parte das ocasiões nem sequer tinha idade para tal. Nunca fui grande devoto do cavaquismo, que marcou uma década em Portugal, do seu triunfalismo, do arrivismo e do novo-riquismo que espalhou, ainda por cima com a sensação de que apanhou o poder no regaço e o manteve com uma boa dose de sorte e com uma grande dívida para com o PRD e a CEE. E muito menos gostei da sua face mais ressabiada e manipuladora em Belém, que revelou uma suceptibilidade e uma incapacidade de perceber inúmeras situações que não são dignas de um chefe de estado.

Dito isto, é bom recordar que se Cavaco esteve tanto tempo em S. Bento e Belém é porque alguém o colocou nas respectivas cadeiras. Ganhar três eleições legislativas, duas delas com maioria absoluta (e com 50%), não é para todos. Junte-se a isso duas vitórias nas presidenciais à primeira volta. Nem Mário Soares, com a sua alardeada popularidade, chegou a tanto. Como disse, o PRD, em 1985, ao roubar votos ao PS, e em 1987, ao canalizá-los para a enorme maioria laranja, a entrada na Europa, com os seus dinheiros, e a política de austeridade do Bloco Central ajudaram em muito à edificação do cavaquismo. Hoje é de bom tom criticar-se aqueles tempos, as construções faraónicas, o desperdício de dinheiro, a "destruição da pesca e da agricultura", etc. O que é certo é que a partir de 1986 houve uma sensação de melhoria, de começo de prosperidade e de paz social muito bem gerida pelos governos PSD. Construiu-se muito? Verdade, mas as auto-estradas, que servem em conversas jocosas como símbolo da "betonização" desse tempo são hoje em dia essenciais na vida do país, até porque as que foram então construídas ligavam os principais pontos do país. Ou alguém imagina a fazer Porto-Lisboa na velha Nacional 1? Ou a ir às capitais de distrito do interior nas velhas estradas às curvas? Quanto à agricultura e pescas, bastava que se recusasse o dinheiro oferecido em troca do abandono dessas actividades. Ainda me lembro de aprender que os países que se dedicavam mais ao sector primário eram os mais subdesenvolvidos. Na altura, poucos foram os que protestaram. em suma, grande parte da população sentia-se bem com o cavaquismo, ainda que o criticasse. Talvez porque se reconhecesse no governo e no político de Boliqueime e até no seu modo de vida.

A esquerda nunca gostou nem um bocadinho dele, responsabilizando-o por tudo, desde as acusações de ter pertencido à PIDE (uma acusação falsa e rancorosa, embora Cavaco não tivesse ajudado com a concessão de reformas a antigos pides) até ao tal despesismo (como se a esquerda fosse poupada), ou, ultimamente, de ter feito uma presidência de apoio ao governo de Passos Coelho, não se quedando assim "abaixo dos partidos" (quando Jorge Sampaio nomeou Santana Lopes, Ferro Rodrigues demitiu-se do PS acusando-o do oposto: de não ter sido fiel ao eleitorado de esquerda). A direita, sobretudo a mais classista e particularmente a que rodeava O Independente, nunca lhe desculpou o suposto provincianismo, a vulgaridade, o desdém pelas letras e as origens sociais de muitos vultos do cavaquismo (como aliás pôde ser comprovado com maior amplitude no recente livro sobre o jornal).
 
Mas o que é incrível é que apesar de tanta oposição, tanto achincalhamento e tanto desprezo (temperados por muitos "adesivos" e apoiantes oportunistas, em especial autarcas de outros partidos e artistas), e muitos o terem dado como acabado politicamente quando perdeu as presidenciais de 1996 para Sampaio, Cavaco Silva acabou por ser o político com mais sucesso do actual regime. Talvez não tenha sido directamente o sucesso de um país, mas resultou directamente de uma vontade popular que se reviu em Cavaco e no que ele representava. Bom ou mão, Cavaco é um produto do Portugal democrático. Reforma-se amanhã, finalmente. Os estudiosos vindouros aclararão o que realmente constitui o cavaquismo mais nas décadas que se lhe seguiram do que nos anos em que dominou o país.

sábado, março 05, 2016

Discos intemporais recordados


Avisado pelo Facebook, por amigos que me recordaram as datas, dei-me conta que o disco Out of Time, dos REM, que contém a grandiosa Losing My Religion, está a fazer bodas de prata. Surgiu em Março de 1991 e catapultou ao banda de Athens para o grande público (embora desde os dois álbuns anteriores que a sua popularidade estava em crescendo) e para o circuito dos estádios, tornando-a numa das maiores dos anos noventa. Já tem 25 anos.
 
Pela mesma via reparei que o álbum dos GNR Psicopátria está perto dos trinta anos. O disco que nos deu Efectivamente, Bellevue e Ao Soldado Desconfiado e que marcou a despedida de Alexandre Soares, e que reduziu a banda ao trio Reininho-Toli-Romão, está quase na idade de formar família. A primeira minha memória desse disco data do Verão anterior ao lançamento, em que vi cartazes colados na parede a anunciá-lo. Na minha meninice não percebi do que se tratava, e a capa com uma rapariga suspensa no ar sobre o Douro (que eu julgava ter um cabo invisível a segurá-la, ou coisa parecida) sugeria-me o anúncio da chegada de um circo. Levaria alguns anos até perceber o equívoco e a apreciar o álbum como um dos melhores, senão o melhor, que a banda já lançou. Já a rapariga da capa era mesmo um exemplo da juventude da Ribeira que cresceu a mergulhar nas águas ribeirinhas do Douro, e que, segundo uma entrevista da banda no ano passado, casar-se-ia mais tarde com o famigerado Guarda Abel - o que revela que era mesmo adepta de modalidades radicais.
 
 
Como sempre, fica o desabafo ao constatar a passagem dos anos: estamos a ficar velhos. Felizmente que os discos em questão não acusam a idade e continuam tão válidos como quando foram lançados.


PS: e como falamos de efemérides de recordações da infância/adolescência, registe-se que por estes dias Paulo Futre, essa enorme figura do futebol português, chegou também aos 50 anos.