segunda-feira, setembro 12, 2005

Pixies alive


Enquanto muito sonhavam ver Bono e os habituais óculos escuros, ladeado por The Edge de chapéu texano, Clayton e Mullen sob holofotes e neons, cantando o Vertigo entre os azulejos amarelos e verdes de Alvalade, o meu pensamento ia para aquela banda meio esquizofrénico, meio masoquista, proveniente de Boston, e que se tinha voltado a juntar após demasidos anos de separação. Isso mesmo: os Pixies.
 
Esse grupo, chefiado por um alucinado de mais de cem kilos com o estranho nome artístico de Black Francis/Frank Black, e por uma senhora com ar de dona de casa e voz estridente chamada Kim Deal, acompanhados pelo guitarrista filipino Joey Santiago e pelo baterista David Lovering, mudou a face do rock dos anos oitenta/noventa, com o seu noise (menor que o dos Sonic Youth, apesar de tudo) melódico, que influenciou gente como Kurt Cobain - ainda que este nunca lhes tenha chegado aos calcanhares. Músicas cantadas (ou berradas) ora em inglês, ora em espanhol, sobre OVNIs, praias portoriquenhas, mentes a explodir ou bastardias avulsas eram o mote deste quarteto. Claro que a dita influência não se notou assim tão bem a olho nu, já que os seus discos não rebentavam com as platinas da época, e muito injustamente, diga-se (veja-se esta notícia, se ainda estiver online). O que é certo é que a banda espalhou os pós que haveriam de criar o grunge e depois dissolveu-se, por decisão unilateral do seu líder que queria enveredar por uma carreira a solo.
A vida de Franck black não melhorou com isso; Kim Deal conseguiu alguma notoriedade com as suas Breeders; mas sabiam que a sua carreira se devia à mítica banda que fora a sua.
 
Há alguns anos atrás, também eu punha os Pixies como um dos três ou quatro grupos que mais gostaria de ver ao vivo, mas acrescentava sempre um desconsolado "mas isso é impossível, porque eles não se vão voltar a juntar", enquanto ouvia o seu álbum live.
Oh, homem de pouca fé que eu era! Algures no ano passado, os agora distintos quarentões decidiram-se juntar-se e fazer umas tournées, sem esquecer a Ocidental Praia Lusitana. Para meu infortúnio, não pude comparecer na comissão de boas vindas dos Pixies a Portugal, vulgo público do Superbock Superock, e, vésperas do EURO. Prometi a mim próprio que se me fosse dada mais uma oportunidade, não a perderia por (quase) nada. E assim sucedeu. Aí em Maio soube que voltavam para actuar no festival de Paredes de Coura. a 17 de Agosto. Essa data não mais me saiu da memória, até porque sabia que nessa altura ia estar igualmente no Alto Minho. Chegado o grande dia, e mesmo com problemas de óleo no carro (e mais de trinta kms pela frente), ainda sem bilhete e com os meus companheiros de romaria courense a cortar-se à última do hora, rumei ao local escolhido. Curvas e mais curvas depois, ao som do Death to the Pixies no discman da viatura, consegui deixá-la num qualquer campo convertido em parque por uma quantia exagerada. Tal como era a que se pagava pelo bilhete. Mas deu tempo para inspecionar o local, ( hélas, demasiado tarde para ver os Arcade Fire), comer e beber alguma coisa e dar uma vista de olhos à Blitz (a única coisa grátis em toda aquela noite). As rádios e TVs "jovens" andavam todas por lá, mas infelizmente não vislumbrei a Rita Andrade.
O sítio, novo para mim (Paredes de Coura era mesmo o único concelho do Alto Minho que desconhecia), é bastante acidentado, com numerosos altos e baixos e um anfiteatro natural, inclinado para o palco, com o rio Coura - ali quase um ribeiro - atrás. Devo dizer que o seu primo mais velho de Vilar de Mouros é bem mais confortável e menos poeirento, além da proximidade e acessibilidades.
O que é certo é que ainda assisti aos Queen of Stone Age, bem cá atrás, não fosse ser acometido de uma surdez crónica, tal era o som e a potência da banda, mas não desgostei. Com o hiato da praxe, aproveitei para me chegar umas centenas de metros à frente, até que, quase inesperadamente, sem nada que os anunciasse, os Pixies fizeram a sua entrada em palco. Carecas todos, menos a senhora. Frank Black ainda mais gordo e com ar de sono (Kim Deal também ganhou uns kilos), envergando roupas banais, nada de blusões de couro, óculos escuros ou chapéus de texano. O que é certo é desde o início atacaram os clássicos: Wave of Mutilation, Where is my Mind, Here comes your Man, tudo seguido, para pôr o público efervescente, muito embora algumas estátuas de cera no meio dessem a impressão de nunca ter ouvido tal coisa na vida. Estas figuras irritam-me particularmente, quase tanto como aqueles que no seu frenesim musical quase que agridem as pessoas ao lado à cabeçada involuntária.
Claro que depois de semelhantes temas, vieram as menos conhecidas, pontuadas sempre com um ou outro clássico a meio (como a soberba Gouge Away, óptima para se ouvir à noite, perfeita quando tocada sob o luar). Houve um encore e a oportunidade de ver Mrs Deal balbuciar coisas em português, na sua simpatia contagiante, antes de encerrar com o seu Gigantic. Sem grandes rasgos, foram 25 músicas em hora e vinte de espectáculo, mas é sabido que as canções do grupo de Boston não primam pela sua longa duração. Não sendo o concerto da minha vida, a coisa teve a sua piada e dei-me por satisfeito. Embora tivesse sabido a pouco, os lendários Pixies ficaram vistos ao vivo e a cores; mais um para a colecção; mas se voltarem a este torrão ibérico num futuro não muito longínquo, e se tiver uma oportunidade clara, não deixarei de os rever. Porque apesar de tudo julgo que ainda me devem algo; se assim for, considerarei sempre um tal evento como a segunda parte do concerto do qual estive à espera tempos a fio. Caso contrário, não será por isso que me vou chatear com eles.

PS: para provar a minha boa vontade, no regresso vim o caminho todo a ouvir a segunda parte do Death to the Pixies: um concerto ao vivo dado pelos mesmos em Utreque, por volta de 1990. Exactamente o que tinha ouvido antes, só que com mais voz e um pouco mais de "loucura".


2 comentários:

Freddy disse...

Admito q só conheço o clássico "Here Comes You Man..." mas quem conhece bem diz q gosta...

Abraço grande da Zona Franca

João Pedro disse...

Há muito mais para conhecer. Além das músicas que referia, há outras, como Monkey gone to Heaven, Debaser, Allison ou gouge Away (talvez a melhor interpretada em todo o concerto). Não faltam aí colectâneas da banda.