segunda-feira, setembro 30, 2024

O fim das livrarias do centro da cidade

A Fnac de Sta Catarina fechou hoje, para dar lugar a uma Primark, no edifício Palladium. Era um fim anunciado há meses, mas não deixa de provocar um sentimento de vazio. Era uma espécie de "homónima" portuense da Fnac do Chiado, uma loja-âncora em plena baixa. Nos últimos dias, quando por lá passei, já dava sinais de fim de época e de mudanças, sem boa parte dos produtos e com alas fechadas.

Desde que abriu, seguramente no início do século, por junto passei lá muitas horas, desde que os CDs, que eram aos milhares, ainda eram a melhor foma de adquirir música. Se pensarmos bem, uma Fnac naquele local era uma sorte, um luxo, aparentemente, já que a Baixa está reduzida cada vez mais, tirando as instituições públicas, a cafés, restaurantes, marcas para turista ver e hotéis (está planeado outro para o edifício de cor bordeaux em frente). Dizem vozes amigas que estão à procura de novo local para a reimplantar. Espero e estimo que o consigam, porque as rendas das Primarks desta vida estão cada vez mais difíceis de suplantar. Até lá, quem quiser comprar livros naquelas paragens sempre se pode socorrer à excelente Livraria Latina, quase em frente.

PS: incrivelmente, a Latina também vai fechar. Com excepção da Bertrand da rua da Fábrica, a Baixa fica SEM UMA ÚNICA livraria, tirando um ou outro arfarrabista. Já teve várias, e prestigiadas, mas a Leitura é agora um bar e a Lello, essa, é um museu instgramável com armadilha para turistas de Harry Potter.

quinta-feira, setembro 19, 2024

Os fogos

Uma hora e pouco de viagem e deu para ver numerosos incêndios, sobretudo no Marão, onde helicópteros atacavam as chamas que ocupavam toda uma ravina. Noutros pontos era mais complicado, mesmo para meios aéreos. O ar estava completamente esfumaçado, formando um nevoeiro denso e sufocante.

A partir de amanhã a chuva deve ajudar a afastar todos estes fogos malsãos e a dar tréguas às populações e bombeiros. Entretanto, nas caixas de comentários vêem-se sobretudo coisas como "era apanhar estes incendários e fazê-los pagar na mesma moeda", "enquanto não apanharem os culpados não temos paz", ou as variantes ideológicas, como "a culpa é das celuloses que plantam eucaliptos/madeireiros/gente paga pelos partidos adversários/exploração mineira, etc" (riscar o que não interessa). Não tenho dúvidas de que haverá por aí muita mão criminosa e alguns interesses pelo meio (se bem que tenha dificuldade em perceber isso do ponto de vista dos reacedimentos: como é que num terreno irrespirável e queimado, com pouco combustível, alguém tenta reacender um fogo, para mais correndo um risco tão grande?), sobretudo quando os fogos deflagram de madrugada. Mas temo que isso também sirva para desculpar a negligência grosseira de muito portuguesinho que põe-se a fazer trabalho de campo quando não pode, senão até a fazer queimadas, a atirar o cigarro para a berma da estrada, onde cresce mato seco, ou, como aconteceu na Madeira, a lançar foguetes quando tal estava proibido.
Mas seja crime, seja negligência, não pode estar aí a causa única. Os portugueses do Sul não são melhores nem piores e aí os incêndios rareiam mais. Ouvindo a entrevista a Henrique Pereira dos Santos, um dos grandes especialistas na matéria, volto a ouvir a mesma explicação: a agricultura tal como era feita até há 60, 70 anos quase desapareceu. A migração para o litoral e o estrangeiro desertificou boa parte do interior do país, que tirando uns breves anos com a recepção de "retornados" de África, perdeu imensa população. E quanto mais para a "raia" com Espanha, pior. Cingindo-me ao Norte e Centro, olhando para os censos a cada década (na Wikipedia), veja-se por exemplo Vinhais, que tinha 26 mil habitantes em 1960 e agora tem menos de 8 mil; o Sabugal tinha quase 40 mil e agora pouco passa os 10 mil; e Montalegre, de 32 mil para 9 mil. A pastorícia quase desapareceu, os campos foram invadidos por mato, e por mais que se ouça que "os proprietários têm de limpar os seus terrenos", olhem para a densidade populacional e para a faixa etária que caracteriza esses concelhos e vejam se é possível.
Dificilmente se conseguirá inverter nos próximos anos o declínio populacional e o ordenamento do território nessas regiões envelhecidas e escassamente habitadas. Até lá, e mesmo que haja melhorias, como já tem havido (apesar de tudo isto ficou longe da trágida de 2017), o fogo só dará tréguas em anos de maior pluviosidade e sem invernos secos. E continuarão a ouvir-se os resmungos contra "os verdadeiros culpados". Como sempre, as soluções são bem mais complexas e não envolvem polícia.
Adenda: ver João Miguel Tavares e Manuel Carvalho, hoje no Público, que vão na mesma direcção.



sexta-feira, setembro 13, 2024

Sexos por gêneros

Definitivamente já não há sexos, só há gêneros. Aí está no vocabulário, a prová-lo. A palavra gênero extravasou e ocupou quase totalmente o lugar que dantes era dos sexos. Exemplos: alguém escreveu num jornal que a filha de um chefe de estado africano se tinha declarado bissexual, o que significava que "apreciava pessoas de vários gêneros".

Mas a melhor para mim é ter visto, por mais do que uma vez, que não sei quem tinha efectuado uma "operação de mudança de gênero". Fico a pensar como raio se pode operar o gênero. Tendo em conta que parte de pressupostos mentais de identificação, calculo que uma "operação de mudança de gênero" só possa ser uma lobotomia.