O resultado de pôr a mão própria em obra alheia
A decisão de cancelar a ópera Idomeneo de Mozart é a todos os títulos lamentável. Não há que ter contemplações: não é o facto de haver ameaças abstractas de alguns bárbaros que justificam tal vergonha. As medidas de segurança existem por algum motivo. O temor de ofender os crentes islâmicos não colhe, e desrespeita o cristianismo e o budismo, por razões idênticas.
Simplesmente, como bem notou Luís Aguiar Santos, o único deus que entra na ópera é Neptuno e a sua cabeça não é exibida no fim. Eu nem conhecia esta obra, confesso, mas pela lógica dá para perceber: seria uma enormíssima impiedade surgir a cabeça cortada de Jesus num espectáculo do Séc. XVIII, em pleno Sacro Império Romano-Germânico. Buda não era muito divulgado naquele tempo, e mesmo Maomé não aparece aqui, apesar das memórias do cerco à capital do Império pelo otomanos, cem anos antes (Neptuno era imortal, devido à sua condição divina).
Quer dizer: primeiro desvirtuam a obra original, e depois queixam-se das ameaças às alterações. Grande coerência. Grande coragem.
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