O regime verde do coronel Kadhafi vive, ao que tudo indica, os seus últimos dias. Acantonado em Tripóli, quando as cidades da região foram conquistadas pelos revoltosos, resiste graças às tropas de elite ainda fieis e aos mercenários contratados por chorudas somas na Nigéria, Burkina Faso ou Congo. Todos os dias soldados regulares e polícias passam-se para o lado dos revoltosos, que se apoderaram dos depósitos de armas existentes em Benghazi e em toda a Cirenaica.
Há dias, Kadhafi, que desde o início dos tumultos apenas aparecera fugazmente na televisão em duas ocasiões com fraca imagem, surgiu em finalmente em público. Da muralha do castelo de Tripoli, rodeado pela sua guarda pretoriana, falou aos seus apoiantes que na Praça Verde, dominada pela fortaleza, ostentavam a bandeira verde do regime e inúmeros cartazes com a efígie do "guia da revolução". Muitos seriam sinceros devotos do "cão raivoso", mas como sempre acontece nos ajuntamentos organizados por ditaduras, havia inúmeros"profissionais" a soldo. Notava-se a certa altura nas imagens televisivas nalguns negros envergando sweats desportivas da Juventus, o que condiz com a descrição dos mercenários africanos, além de que os Kadhafi têm acções na Vechia Segnora de Turim. Ou seja, os apoios fictícios também partem de gente de fora do país.
O comício parecia ser o canto do cisne do regime que dura há já mais de quarenta anos. A "comunidade internacional", a ONU, União Europeia, Estados Unidos, Rússia, etc, todos se apressaram a condenar os actos de retaliação das forças leais ao que resta do estado, por vezes com encantadora hipocrisia, como bem demonstrou o Ministro Luís Amado ao pedir o fim "do anacrónico regime"... cujos quarenta anos ele tinha comemorado na tenda de Kadhafi. Só mesmo o patético Hugo Chavez e o calculista macróbio Fdel Castro vieram em socorro do dilecto amigo, proferindo discursos contra a "tentativa de ingerência ocidental". Se do cubano não se espera nada, quem tinha ainda ilusões sobre Chavez bem pode perdê-las definitivamente.
Mas apesar de toda a oposição internacional, da expulsão da Líbia da Comissão dos Direitos Humanos da ONU (uma aberração que deveria servir de exemplo para que no futuro se definam melhor os estados a compô-la), da crise humanitária provocada pelo Êxodo em massa de líbios e estrangeiros, das inúmeras deserções e do cerco cada vez mais apertado, Kadhafi conseguiu resistir nos últimos dias em Tripoli e Sirte, e já lança contra-ofensivas a leste, com recurso à aviação e à artilharia pesada. Hoje discursou perante algum público, comemorando os 34 anos da Jamahiriya, altura em que "entregou o poder ao povo" ficando apenas como "guia da revolução", e ameaçou uma hipotética intervenção internacional com "milhares de mortos". De um psicopata como Kadhafi é de esperar tudo, até que tenha secretamente conservado armas de destruição massiva alegadamente destruídas, e usá-la em último e desesperado recurso. A sua aviação militar aí está para mostrar que não se importa de destruir toda a líbia para conservar o poder. E o que é realmente mau é que tem de se dar razão ao seu filho mais velho (e putativo sucessor), que preveniu no início da revolta para a probabilidade de uma guerra civil. Ela aí está, não sabemos por quanto tempo mais, e pior ainda, quem a vencerá.
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