Não escrevi muito nos últimos dias. Nesse tempo, meio país ardeu, 45 pessoas morreram, um ministério caiu sem contemplações e houve uma moção de censura contra o Governo, que sem surpresas não passou. Desde as horas tardias de Sábado, dia 14, com uma noite em que a temperatura alta já era motivo de conversa, até terça, às primeiras horas de madrugada, quando a chuva veio finalmente pôr termo ao inferno que tantas populações viviam, o fogo destruiu quase todo o centro e uma pequena parte do Norte do país. É impossível que ninguém tenha notado - excepto nas ilhas, e não sei se no Algarve - quando a coluna de fumo afectou mesmo o Reino Unido. A atmosfera era pesada e cinzenta. De manhã, algumas estradas à volta de Braga ainda estavam fechadas, viam-se colunas de fumo que se levantavam e a estrada para Guimarães ainda tinha amplos espaços a fumegar, com a supervisão dos bombeiros. Sorte a minha, que não tive de passar o que outros passaram. Todo o vale do Dão ardeu, além de boa parte de Lafões, do Pinhal Interior e da mancha verde perto da Marinha Grande conhecido em todo o país como Pinhal de Leiria, essencial na aprendizagem da história na escola. Dezenas de pessoas morreram, outras ficaram feridas, centenas de casas, algumas de primeira habitação, arderam, bem como dezenas de empresas, sustento de tantos municípios. As imagens de desolação e do horror após esse inferno terrestre estão por toda a parte. O rasto de destruição é incomensurável. Para mais, calhou-nos um primeiro-ministro insensível que só soube gaguejar desculpas burocráticas, uma ministra do Interior sem condições psicológicas, sapiência ou competência para o cargo, e uma protecção civil aos papéis, sem dispor de meios nem de aviões para combater os fogos.
Ficam relatos na primeira pessoas, como o do José Maria Montenegro, que felizmente conseguiu que a casa de família, em Tourais, Seia, se mantivesse. Menos sorte tiveram os meus primos Henriques Simões, de Poiares, que viram a sua centenária casa dos Moinhos, onde ainda havia arquivos dos primórdios do concelho, e onde tinha nascido o meu tio-avô Augusto Henriques Simões, arder quase por completo, restando as paredes, alguns anexos e a capela. Também as velhas casas perecem. Ironia das ironias, Poiares é precisamente o município de onde é originário e ao qual presidiu durante quase 40 anos Jaime Marta Soares, presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses.
Guimarães, 16 de Outubro de 2017- A estátua do Conquistador parece curvar-se à bandeira a meia haste.
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