sábado, novembro 18, 2006

Haverá plágios inevitáveis?


Sigo com particular atenção os artigos dessa personagem maior das colunas opinativas portuguesas que é o Miguel Sousa Tavares. Aprecio sobretudo os artigos mais generalistas ou políticos, que durante muito tempo acompanharam o Público e agora continuam no Expresso, apesar das muitas discordâncias. O mesmo não posso dizer dos seus escritos na Bola, em que são muito poucos os momentos em que lhe concedo razão. Este é um bom exemplo do radicalismo portista que por vezes lhe atravessa a mente, como a vitimização sem bases, o mau ganhar ou a mania de atirar para os outros os seus próprios pecados (já para não falar das suas mirabolantes criações normativas, como a dos jogadores portistas, tipo Andersson, serem uns génios e umas pobres vítimas, e por isso merecerem protecção especial dos "caceteiros" ou "jogadores banais", que é como ele apelida o Katsouranis; Paulinho Santos e André devem-se esfumar das suas memórias, sem dúvida).
Também conheço a sua singular carreira literária. Li as suas impressões políticas em Um nómada no Oásis e Anos perdidos; os percursos de Sul-Viagens e esse gênero sem categoria fixa, talvez a do conto, a que pertence Não te deixarei morrer, David Crockett; e a sua opus magnum, Equador, best seller prestes a ser adaptado a televisão (uma boa ideia, estranhamente vinda da TVI, já que a obra se presta ao formato). Não li os seus livros infantis e estou à espera do seu novo romance, que ao que parece, envolverá zeppelins. E fui fiel assinante da Grande Reportagem durante dez anos, até a revista adquirir o formato semanal que levou ao seu desaparecimento.
O recente caso do suposto plágio de um romance inglês que teria originado Equador não tem ponta por que se lhe pegue. As provas são próprias de chicos-espertos que não souberam fazer o seu trabalho devidamente, ou então não puderam pela razão natural das coisas. Acredito sem qualquer dúvida que Sousa Tavares ocupou-se naquele tempo todo do seu romance e em pouco mais.
O problema é que pode haver expressões, passagens, descrições, sensações lidas que fiquem no inconsciente e se revelem no momento em que se pega na caneta para redigir algo que, pensa-se na altura, é original e único. Por vezes não é. Olhando agora para os escaparates das livrarias, vêm-se as novidades, entre romances, (auto)biografias, ensaios,experiências vividas, etc. Os dois primeiros gêneros estão claramente na moda. Claro que a quantidade, que é muita, não significa um aumento percentual de qualidade, embora haja mais possibilidades de se encontrarem bons livros. Biografias são incalculáveis, de personalidades mais ou menos relevantes, de toda a vida ou parte dela. Os romances históricos, então, não param de saír do prelo: há-os de todas as épocas e situações, envolvidos em particulares situações temporais e suas circunstâncias. O Código DaVinci deu um valente empurrão a este tipo de literatura, que anto pode ser lida no aeroporto como pode ocupar umas boas noites de sono. hoje em dia, basta fazer uma pesquisa com algum aprumo a certo acontecimento e à sua época, delinear a narrativa e as personagens (de preferência juntar-lhe um toque "místico") e conseguir editar a resultado. Graças a esse boom, vivemos atafulhados em romances históricos, ou ensaios variados, que por vezes vêm a dar no mesmo.
É por isso que com tanta historieta, tanta aventura envolvida em acontecimentos reais, tanto novo autor a surgir, tanta publicidade e tantos novos locais onde comprar livros (e não me digam que não, entre supermercados, livrarias e feiras dos ditos), o mais provável é que se retenha uma ou outra coisa que se viu algures e que depois não se recorde. E ainda a velha história de haver pensamentos coincidentes, que muitas vezes se repetem em pessoas diversas. A pessoa não pode conhecer tudo quanto se edita. Sabe-se lá se alguma boa alma não está a editar o seu primeiro romance ficcionado, e descobe subitamente com horror que a sua ideia já estava imprimida num qualquer opus de esquina de um autor do outro lado do mundo. Com a avassaladora porção de literatura light/histórica/esotérica que hoje domina as prateleiras, e seus responsáveis, não é de espantar que novas acusações de plágio se repitam. E com as hipóteses de sacar dinheiro que estes processos às vezes proporcionam, tornam-se um filão ainda mais apetecível

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