quinta-feira, novembro 12, 2015

Paulo Cunha e Silva 1962 - 2015


Se ontem fiz um curto epitáfio de uma pessoa que morreu com quase cem anos, hoje faço de outra que desapareceu com pouco mais de cinquenta. Paulo Cunha e Silva deixou-nos de repente, sem se despedir, tão subitamente que ainda estão no ar, sem tempo para cair ao chão, todos os seus projectos pendentes, todas as ideias que lançou recentemente, todos os eventos a cujo lançamento presidiu e que estão aí, a ser realizados.

Cunha e Silva andava a mil à hora. Estava em toda a parte, em todos os eventos, falava de tudo e a tudo acorria, sempre com ideias novas. Talvez por isso o coração o tenha traído depois de mais uma ronda em que tinha acabado de inaugurar o ciclo de toda a filmografia de Manoel de Oliveira, logo ele, que era médico de formação e professor de anatomia, tendo sido o aluno mais brilhante do seu curso (Eurico de Figueiredo conta que foi o único 20 que atribuiu a um seu aluno, embora não tenha sido o único que Cunha e Silva recebeu). Enveredou pelas artes, tornou-se colaborador de Serralves e acabaria por ser o programador cultural do Porto 2001. Com a aversão de Rui Rio à cultura (não entrou na CM do Porto entre 2011 e 2013), presidiu ao Instituto das Artes do Ministério da Cultura, foi conselheiro cultural da embaixada de Portugal em Roma, antes de regressar a Portugal e de ser eleito vereador na lista de Rui Moreira. Lembro-me de na campanha eu ter levado um oleado para a chuva que caía abundante por esses dias com a marca do Porto 2001, e dele me dizer que tinha perdido o seu e que aquele devia ser o único exemplar existente, e de na noite da vitória, há dois anos, quando estávamos cá fora, em plenos Aliados,  de o ouvir já a traçar planos para quando tomasse posse, começando pelo Rivoli. O tempo comprovou que não esta simplesmente a divagar, como se pôde ver pelo sucesso que teve na maneira como reorganizou a Feira do Livro.

Na última campanha, o MPT tinha algumas ideias arrojadas para uma acção com visibilidade que chamasse a atenção para o esquecimento e a inutilidade a que está votada a Ponte Dona Maria Pia, mas infelizmente ficou-se por uma faixa na base (e acreditem que colocar uma coisa em lona de 15 metros demora as suas horas, sobretudo quando só está duas pessoas a fazê-lo).



 A ideia seria aproveitar a visibilidade para depois discutir com a CM do Porto diferentes formas de a reabilitar. Nos próximos dias iríamos contactar Paulo Cunha e Silva, que aliás já estava a par da ideia. Há coisa de duas semanas vi-o a abrir a conferência sobre o centenário da morte de Alfredo d´Andrade, no consulado de Itália, organizado por uma querida amiga minha. No fim do seu discursos, em que falou da sua paixão por Itália e da sua alma dividida entre Itália e Portugal (considerando-se ali como que um "agente duplo"), despediu-se, já que tinha de estar naquela mesma hora noutro evento. Na altura queria falar-lhe da acção da ponte, mas pensei que ficaria para breve. Não imaginava que não teria outra oportunidade nem que o não veria mais.

Ironicamente, a última fotografia na página oficial do facebook de Rui Moreira antes da morte do seu vereador é exactamente da ponte Dona Maria, em contraluz. A que colocou a seguir mostra Paulo Cunha e Silva com a condecoração de Chevalier des Arts que lhe tinha sido atribuída em Outubro pelo governo francês. A última e justa homenagem a um homem que ainda tinha imenso para dar e que deixa o Porto e a cultura nacional tremendamente mais pobres.





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