Uma semana depois, eis-me de volta, regressado que estou da "Ville Lumiére". A fazer jus ao nome. A luminosidade de Paris no Domingo, dia das eleições, fazia inveja ás esconsas nuvens que cobriam o céu portuense. A Primavera já lá chegou, enfim, com o suplemento de Chirac e a sua política de semi-gaullismo sinuoso estarem no ocaso. Resta saber qual o futuro da política em França, já que os vencedores da hora, o PSF, PCF, Verdes e a Gauche des Citoyens não são movimentos lá muito actualizados. Parece-me que esta amálgama está longe do "Big-Bang" reclamado por Michel Rocard há dez anos atrás, em que propunha um novo partido de centro-esquerda centrado nos socialistas, ecologistas e defensores dos direitos humanos. Desde então, nada foi feito ou proposto.
À direita o panorama é ainda menos animador. Reféns de uma geração que anda pela política há quase 40 anos, Chiracs, Giscars e outros tantos, os liberais e gaullistas estão sem referências e sem rumo, não sabendo muito bem a quem recorrer. Está visto que a nova UMP, aglutinadora do ex-RPR e de parte da UDF, nada trouxe de novo, e não passou de nova jogada do Presidente para recuperar forças. Para sua consolação, a Frente Nacional, que poderia muito bem ter aproveitado a psicose do terrorismo para crescer ainda mais, ficou aquém do previsto.
Só não compreendo aqueles que em Portugal vieram dizer que tinha sido o voto dos eleitores "contra a política de confronto com os EUA protagonizada por Chirac", a propósito da guerra do Iraque. Essas pessoas saberão quem ganhou as eleições, serão ignorantes ou tomar-nos-ão simplesmente por parvos? Qualquer resposta é viável, mas outras haverá, igualmente pertinentes, que respondam a tamanhos disparates.
A confusão dos meandros da política reflecte-se nas medidas sociais e, consequentemente, na rua. Os protestos nunca foram escusados em França, mas agora há um autêntico fartar vilanagem. Quando passava em frente à Ópera (sim, a do Fantasma da dita), e em direcção à Madeleine, uma enorme manifestação de bombeiros, cobertos com respectivos capacetes e brandindo até bandeiras da Bretanha e do País Basco (para além da inevitável CGT), carregou sobre as barreiras organizadas pela polícia de choque, que respondeu com jactos de água. Perante petardos, very-lights e outros objectos arremessados pelos "soldados da paz" (nunca este epíteto poderia ser mais irónico do que aqui), as forças da ordem recorreram então ao gás lacrimogéneo. Qual repórter no calor da guerra, o que escreve estas linhas, que estava no local a registar fotograficamente o evento, teve de fugir dali rapidamente, acompanhado pelos seus companheiros de viagem. Os minúsculos pátios daqueles prédio centenários que constituem os boulevards podem muito bem servir de refúgio num caso destes, não obstante deixarem passar réstias do ardente gás, e foi exactamente o caso. Aconselho quem quer que seja a não querer saber como são tais descargas gasosas, que muito se irá arrepender, nem se fie nos que ao lado estiveram no Maio de 68, "que aquilo sim, aquilo é que era a sério". Mas não precisei de mais coisas "sérias" para ver um protesto "à la grande et à la française". Nem esperei muito tempo no local, mas ainda pude ver a turba em retirada, apesar dos apelos vigorosos dos seus comandantes, dirigindo-se para a Place Vendôme, onde se situava outra barreira policial. Um very-light voou mesmo por cima do Hotel Ritz, estragando o toldo de uma ourivesaria das imediações. Para mim era porém o epílogo da tarde proletária; tinha de me despachar para um compromisso numa noite burguesa, na mais recatada Montmartre.
Enfim, "Paris é uma festa", como dizia Hemingway. Curioso é como a Sorbonne e o Boul Mich´estiveram tão calmos nesses dias.
Ah! Só um acontecimento triste perturbou o brilho parisiense: a injusta, heróica e de todo imerecida eliminação do SLB pelo Inter. Não vi o jogo, apenas ouvi o desenrolar do marcador por sms constantes, mas pelo que todos dizem, nada teria sido mais justo que a passagem do Benfica. A falta de experiência, os (eternos) erros defensivos, uma arbitragem habilidosa, algum azar à mistura e sobretudo a falta de golos da 1ª mão determinaram a queda do SLB. De pé, como as árvores.
E como talvez cá não volte antes, há que não esquecer que os Blóscares são já no apropriado dia 1 de Abril. A Ágora não recebeu qualquer nomeação, mas já se sabe como é a indústria dos blogs comerciais: alguns dos melhores, por não serem tão visíveis, ficam de fora.
Ainda assim, é tempo de preparar o smoking e a faixa para a gala que se avizinha, com o inevitável glamour, sobretudo o feminino, claro. Quem não puder estar lá sempre pode acompanhar pela Origem do Amor, que obteve a transmissão exclusiva do evento.
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