segunda-feira, junho 28, 2004

Não haverá bom senso?

Contrariando os meus vaticínios num post que escrevi há dias, Durão Barroso vai ser mesmo o novo Presidente da Comissão Europeia. A notícia não deixa de ser surpreendente, mesmo para quem conhece os meandros da Europolítica. Nunca este nome tinha sido sequer aflorado para o cargo. Levaram os critérios de que aqui falei a que tal acontecesse.
Ao contrário do que já ouvi dizer, não é propriamente uma vergonha ter-se um compatriota em tal cargo, embora se possa dizer que o mais beneficiado seja o próprio. Apesar de todas as considerações que se possam tecer, a ida de Durão para Bruxelas é um legítimo motivo de orgulho para Portugal, embora ainda ache que Vitorino, pela experiência e qualidades pessoais, tivesse mais perfil para o cargo.
Na realidade não está tanto em causa a saída de Barroso, mas antes a sua substituição. A hipótese mais provável é Santana Lopes, e não é sem um arrepio que escrevo tal coisa. De facto, se alguém há no PSD que não tenha o mínimo perfil para chefe do governo, esse alguém é Santana. Dificilmente se arranjaria pior nome.
E porquê tamanho receio da subida do Autarca de Lisboa ao poder?
Lembremo-nos, desde já, que raramente cumpre as suas promessas até ao fim. Falo, evidentemente, da sua promessa aos associados do Sporting em não abandonar o clube em prol da política; poucos meses depois fazia isso mesmo, para se candidatar à presidência do PSD. Ou quando apoiou Durão, jurando-lhe lealdade, não hesitando em disputar-lhe o lugar no congresso que se seguiu. E por fim prepara-se para deixar alegremente a Câmara de Lisboa, quebrando a promessa feita aos seus eleitores, rumo ao governo.
Outro motivo de desconfiança é a sua "obra" nos cargos de responsabilidade que ocupou. Começando pelo fim, nota-se que Santana elegeu como grandes objectivos para a capital a construção de um casino (que no início seria para reconverter o parque Mayer, e que agora é um mero capricho de bon-vivant), o retorno do moribundo e popularucho Teatro de Revista, com o financeiramente incomportável auxílio de Franck Gherry,e o inútil e dispendioso Túnel do Marquês, reconvertido a elefante branco e a atração turística por vontade do próprio autarca. Tudo para não falar da publicidade massiva das suas supostas obras, e que só á sua conta levam 60% do orçamento da cãmara. Acções que poderiam servir de exemplo de como não se dirige uma câmara. Quanto ao que terá realizado na Figueira da Foz, desconheço em absoluto.
Do que ficou na sua passagem pela cultura, haveria muito que dizer, mas relembro as traves-mestras da sua política: obras no Palácio da Ajuda, o eterno apoio à Revista e o esbanjamento de dinheiros públicos numa suspeita peça de teatro com a actriz brasileira Cristiane Torloni, que voltou ao Brasil dizendo cobras e lagartos do país e de Santana. Ao contrário do que afirma, a compra do Teatro S. João no Porto não partiu dele, mas de Teresa Gouveia, a quem se dirigiu há tempos de forma revoltante e desrespeitosa. Por fim, recorde-se que o mesmo Santana teve na ideia vender Serralves a um grupo de construtores civis, mas em boa hora Cavaco Silva o impediu de cometer o maior crime contra a cidade do Porto desde o desastre da Ponte das Barcas. Eis a "obra" do putativo PM.
Recuso-me a aceitar que não haja melhores nomes no PSD. Para além do mais, Santana não faz parte do governo nem era, creio, candidato a deputado em 2002. Tinha sim um compromisso com os eleitores alfacinhas. Por isso, não vejo porque há de ter ele mais legitimidade que outros para ocupar o cargo. Se o critério não for esse, então, nomes já avançados, como Marques Mendes e Miguel Cadilhe têm muitíssimas mais qualidades para chefiar o governo. O problema penso eu, está todo na imagem pública e no potencial chamamento que possam ter junto do eleitorado em caso de eleições. Mendes tem uma imagem de "Yes man" que desempenhou durante anos (além da sua estatura de metro e meio ser uma delícia para o "Contra Informação"). Cadilhe não é popular junto do grande público, pelo menos desde os tempos em que ocupou (competentemente) a pasta das finanças. Ao lado de um candidato pseudo-glamoroso, de discurso fácil e fluído e com fama de galã de discoteca, como poderiam concorrer perante o eleitorado? Terão qualquer espécie de influência que impeça Lopes de se mudar da Praça do Municipío para S. Bemto?
Resta esperar que haja bom senso, que não se convoquem eleições antecipadas, totalmente desnecessárias, e que Sampaio cumpra o seu papel com a serenidade que ele tantas vezes pede ao povo. De resto, Durão só irá para a Comissão em Outubro: temos assim todo um Verão para discutir o nome do novo Primeiro- Ministro, com o espectáculo político mediático que se anuncia, mais as intrigas partidárias da praxe.

PS: já critiquei aqui o Blasfémias por uma razão menor (ou talvez não) -o futebol- mas há que lhe fazer justiça pelo óptimo debate que tem feito relativamente a esta questão. Imprescindível.

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