Por João Pedro Pimenta. Blog de expressão portuense, benfiquista, monárquica, católica e politicamente indeterminada. Pelo menos até ver...
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Os The National estão aí com álbum novo, Trouble Will Find Me. Há dois anos, por estes fins de Maio, tive a oportunidade de os ver no Coliseu do Porto. um concerto emotivo e que só será esquecido quando tiver problemas degenerativos, com as habituais corridas de Matt Berninger entre o público. Por isso mesmo recordo-me que estava à espera que tocassem a excelsamente melancólica Sorrow, do álbum que apresentavam na altura, High Violet, mas infelizmente o meu pedido mental não teve correspondência.
Só que, talvez atacada pelo remorso, a banda resolveu compensar a música esquecida de forma particularmente enfática: numa dependência do novaiorquino MOMA, no âmbito de uma instalação artística, tocaram Sorrow durante seis horas. Isso mesmo, a mesma música tocada de forma seguida por um quarto de dia. Não sei em que estado saiu o grupo e o público, caso alguém tenha resistido à repetição constante da canção. Gosto muito de Sorrow e tive a maior pena que não a tivessem interpretado no Porto, mas se quisesse ser compensado desta forma avassaladora, teria provavelmente acabado com uma crise aguda de melancolia. Para este mês, já me bastou o Benfica.
Em cima, performance da música no MOMA; abaixo, versão original
Quando leio um artigo de jornal sobre política internacional, ou sobre factos passados noutras paragens, longe ou perto, confio que tenham um mínimo de isenção. Não é o caso do último artigo de Angel Luis de la Calle no Expresso, sobre o que se passa em Espanha. Todos sabemos da delicadíssima situação do país vizinho, com um desemprego monstruoso, uma situação bancária insuportável, ameaças de separatismo, acusações à coroa e descrédito dos partidos políticos. Escrever sobre tudo isto pretensas colunas informativas com óbvios preconceitos políticos é mera desinformação grosseira. O título já é logo apocalíptico: "genocídio social a pretexto da crise". Depois, De la Calle afirma que o governo do PP quer instalar um modelo de "neoliberalismo" e "neocon", como "a ala mais à direita do Partido republicano nos EUA". Se a comparação já é infeliz, a confusão de conceitos, entre um modelo económico e uma teoria política, ainda é mais. Com a inevitável farpa à influência da "hierarquia católica", nos casos do aborto, células estaminais e eutanásia, acaba eloquentemente a declarar que "a maioria da população(...) não está disposta a seguir a tendência nacional-populista (deus, pátria e família) que tenta impor-se na Europa". A conclusão não é apenas facciosa: é puramente estúpida, porque além de na Europa a trilogia "Deus-Pátria-Família" tem sido severamente fustigada e mesmo abertamente desdenhada, o autor parece não se lembrar que foi precisamente depois de instaurar medidas fracturantes e regras aberrantes (como a permissão de aborto abaixo dos 16 anos sem permissão dos pais, ou a imposição do politicamente correcto nas escolas) que o PSOE teve a sua maior derrota de sempre e o PP a maioria mais ampla.
De La Calle pode ser um saudosista da república a vontade, mas pede-se-lhe que comente a situação com factos e descrições, não com opiniões pouco isentas que levem o português ao engano. Para ler panfletos políticos vou à procura de um, não preciso de abrir a secção Internacional do jornal Expresso.
Acabou. Depois do que vi na Final da Taça, não há hipóteses de Jorge Jesus permanecer no Benfica. Não existem condições emocionais nem materiais, os adeptos não o querem, o ambiente entre a equipa não é bom. Sim, já sei, Jesus devolveu o bom futebol ao Benfica, ganhou um campeonato, valorizou jogadores que renderam bom dinheiro ao clube, tudo isso. Mas acabou. Já são quatro anos em que um dos técnicos mais bem pagos do Mundo apresentou escassos títulos, muitas desilusões, e pior que isso, iludiu aqueles que nele tanto confiavam. Esta época de 2013, que chegou a parecer fabulosa naquela semana em que vencemos o Fenerbahçe, acabou em tremendo desapontamento, com zero títulos e derrotas amargas no espaço de quinze dias. Nunca pensei que o caso do Bayer Leverkussen de 2002 (que ficou conhecido como "Neverkussen") se pudesse repetir no Benfica, para mal dos nossos pecados, embora estejamos igualmente bem acompanhados pelo Bayern do ano passado e pelo Real Madrid de 1983, em tudo semelhantes. Jesus não terá toda a culpa, claro, ele que chegou a considerar a competição europeia um estorvo e não teve outro remédio senão continuar nela. Mas as suas reacções, a sua incapacidade emocional e de dar alento aos jogadores (excepto talvez no jogo da final europeia), traçaram o inevitável: agora que acaba o contrato, Jesus deve rumar a outras paragens. Chega de míngua de títulos com enormes condições para o fazer. Chega de salários milionários a troco de quase nada, e acima de tudo, chega de ilusões fulminadas nos últimos minutos. Jorge Jesus esteve quatro anos no Benfica. Toni e Trapattonni estiveram menos e mostraram mais. Voltemos esta página. Contrate-se um novo técnico (fala-se em Rui Vitória, nosso algoz da Taça, que eu há muito queria que fosse o próximo, até porque é homem da casa e lançou promissores talentos). Vendamos Gaitan, já que precisamos de algum encaixe financeiro e já temos quem o renda, e mais alguns emprestados, conservemos a maior parte do plantel e compremos um defesa esquerdo, fazendo regressar jogadores como Nelson Oliveira e Airton. Já agora, um novo guarda-redes também não seria má ideia. Já estou por aqui com os falhanços de Artur em jogos decisivos.
Se Jesus ficar, possibilidade não tão irreal assim pela teimosia de Vieira, não pretendo assistir aos jogos do Benfica ao vivo enquanto ele lá continuar. Tudo tem limites, e quatro anos é mais que tempo para os perceber. De qualquer modo, não pude deixar de sentir uma certa pena de JJ no final da Taça (a que não pude assistir a vivo, por falta de bilhete, que deixei de ver a partir do golo do empate, prevendo o desfecho). Há anos que ele a persegue, por razões familiares e pessoalíssimas. Perdeu uma final contra o Sporting, à frente do Belenenses, perdeu há dois anos numa meia final com um golo em fora de jogo, voltou a perder perto do fim, de novo com um golo em fora de jogo (que não serve de desculpa). É natural que não tenha contido as lágrimas. Espero sinceramente que ganhe um dia o "caneco", para honrar o seu avô, e no Jamor, não num qualquer estádio modernamente asséptico, num nó de auto-estradas. Mas noutro clube que não o Benfica. Há que virar a página.
O inquietante caso do ensaísta e historiador francês ligado à extrema-direita que se suicidou esta semana em plena Catedral de Notre-Dame tem muito mais que se lhe diga do que uma mera acção espectacular de protesto desesperado contra a aprovação do casamento/adopção gay em França.
Olhando para as suas ideias e para o seu currículo, parece ser o típico militante da extrema-direita identitária e nacionalista, anti-semita e anti-emigração, com poucas ligações ao cristianismo e à mensagem cristã mas que admira a estrutura e autoridade da Igreja Católica, embora neste caso a acuse de "patrocinar a imigração afro-magrebina". Ou seja, um representante contemporâneo da Action Française, que dominou a intelectualidade e os meios universitários com as suas campanhas virulentas nos anos vinte e trinta.
A escolha de Notre Dame parece ajudar a essa ideia: o templo maior de França, símbolo, juntamente com Chartres e Reims, da cristandade e ao mesmo tempo do poder real centralizado, como guardião dos valores da "velha" França, bastião contra a invasão estrangeira e a degradação dos costumes. O símbolo de uma ideia de ordem e de autoridade, mesmo que depurada da mensagem do Cristianismo, inspiração que já vem desde os tempos de De Maistre e continuou com Maurras e outros ideólogos legitimistas.
O editor de Venner, comentando a sua morte, aludiu ao suicídio de Mishima. Como se sabe, o escritor japonês, também ele defensor dos valores tradicionais japoneses pré-Guerra (e que curiosamente era homossexual, tendo elevado a figura de S. Sebastião martirizado a ícone homoerótico), suicidou-se cometendo sepukku ao falhar um levantamento militar destinado a devolver os poderes de semi-divindade ao Imperador. Para Mishima, o passado glorioso e tradicional do Japão não voltaria, pelo que preferia abandonar o mundo através do terrível e "glorioso" ritual de morte próprio dos samurais. As declarações finais de Venner, prevendo a "substituição" da população francesa, e um novo sistema de valores no qual não se reconhecia de todo, em boa parte contraditório, e o seu suicídio carregado de simbolismo, são em tudo parecidas com a do escritor japonês. Mais do que "um acto tresloucado de ódio", como vi escrito, tratou-se de um fim desesperado, de alguém que já não se reconhecia num mundo emergente (que ninguém sabe dizer qual será), e cujo fim violento e público é consequente com as ideias mais radicais que defendia.
Outro caso similar, provocado também pela ideia angustiante do fim de um certo modelo civilizacional, neste caso muito diferente dos anteriores, é o de Stefan Zweig. O escritor, ensaísta e biógrafo austríaco, quase esquecido durante décadas e hoje de novo editado, suicidou-se no Brasil, em plena Segunda Guerra, assistindo ao segundo suicídio da Europa, crendo que o seu mundo, construído na faiscante Viena dos Habsburgos pré-Grande Guerra, tinha sido esmagado pelo totalitarismo. As suas ideias eram em boa parte opostas às de Mishima e Venner, mas a assunção de que o seu modelo de civilização tinha acabado, que os valores que defendia estavam a ser espezinhados e extintos, é exactamente a mesma. A sensação de fim de uma ideia de mundo, aliada a acontecimentos preocupantes, pode em muitos casos levar ao desespero e a colocar um fim à vida. Sejam quais forem os valores que se defende. e o suicídio tumultuoso de Venner deve ser entendido mais como um último acto de revolta contra um estado de coisas, ainda que tresloucado, do que mera acção radical de propaganda.
A prova infalível de que o francês não era realmente cristão é que atentou contra a própria vida, dádiva de Deus, diante do altar que O celebra.
Acabado o campeonato, parece que a mini-conversa futebolística mais ouvida é que Jorge Jesus não deu os parabéns ao FCP e a Vítor Pereira. Devia dá-los? Não me lembro de darem parabéns a Jesus pelo últimos campeonato ganho (pelo contrário, diziam que era o "campeonato dos túneis", aqueles em que alguns andaram a espancar stewards, e a conversa continua até hoje), nem nos anteriores. Até duas semanas antes, ouvíamos o treinador portista a comentar com azedume um jogo que lhe era alheio e a dizer que o campeonato ia ser "sujinho,sujinho" (seria uma premeditação, depois do que se viu Domingo em Paços de Ferreira?) Ao que parece, tudo está esquecido em função do resultado final.
Ao mesmo tempo, os cronistas de serviço falam do "mau perder" do Benfica. Um dos que vem com essa conversa é Miguel Sousa Tavares, porque ele sim, "sabe ganhar". Eu não sei qual é o problema de falta de memória desta gente, ou se estarão simplesmente a gozar. Sabem ganhar, os mesmos que há duas semanas só falavam do "Capela", que nunca reconheceram os últimos títulos benfiquistas e que até publicaram uma suposta (e em boa parte falsa) lista de supostas aleivosias cometidas pelo Benfica nos últimos anos? Que cantam cânticos injuriosos para os benfiquistas como quando ganharam a UEFA? E têm bom perder, os que impediram os benfiquistas de festejar no centro do Porto com a justificação (dada por dirigentes portistas e pelo mesmíssimo Sousa Tavares) de que se tratava de uma "provocação" porque "queriam comemorar o segundo lugar"? Provocação essa que deve desaparecer quando se vêm cachecóis azuis no Marquês de Pombal. Sorte a deles que os benfiquistas jamais comemoraram segundo lugar algum.
Agora, exigem que Jesus lhes dê os parabéns. O treinador do Benfica reconheceu mérito a quem ganhava, e era tudo o que devia dizer. Queriam parabéns? Mais justo seria que lhes tivesse mandado um manguito, nunca pérolas a porcos. Já não há paciência para a hipocrisia futeboleira.
A votação da lei que permite a co-adopção pelos "cônjuges" em casais do mesmo sexo poderá parecer uma melhoria nos direitos das crianças. Percebo que se pretenda dar uma maior protecção à criança em caso de morte do progenitor. Mas tendo em conta os autores da proposta - a nova sacerdotisa das causas fracturantes, Isabel Moreira, e um ex-líder da JS (outro apaniguados das "fracturas") - e os seus intentos, aliás revelados, de se dar "um passo civilizacional" em direcção à "igualdade plena", desconfio que a intenção é mais de privilegiar os "direitos gays" do que das crianças, como bem explica Pedro Picoito. A tónica é sempre a mesma, por vezes mal disfarçada, e não me admira que, depois de muito se falar na urgência de tais "igualdades" e no "progresso dos direitos civis", se proponha mesmo a total adopção da adopção plena por casais do mesmo sexo. A ideia parece-me simplesmente absurda. A natureza e mesmo a psicologia, que tantas vezes falha na sua abstracção, já nos ensinaram que meras engenharias ou experimentalismos sociais e familiares têm resultados duvidosos. E a igualdade, que eu saiba, é tratar coisas iguais da mesma forma e coisas diferentes de forma diferente. Quando calcula tudo pela mesma bitola, transforma-se num igualitarismo esmagador, nefasto e anti-natura. Mas já se sabe, há dez anos todos se ririam da norma aprovada na sexta. Hoje, quem defende isto arrisca-se imediatamente a ser apelidado de reaccionário, preconceituosos, quando não de fascista. E no entanto, falamos de crianças e famílias, elementos de suma importância em qualquer sociedade, cuja importância concreta devia ser discutida e reforçada, mas que tendem a ser reduzidos e meras abstracções de combate ideológico pelos novos engenheiros sociais.
Ora lá vamos, à análise. Será curta. A doutrina divide-se, mas pouco: o Benfica jogou melhor, dominou a segunda parte, mas hesitou no momento do remate. O Chelsea mostrou-se mais matreiro e ganhou.
Em parte concordo. O Benfica hesitou em alguns momentos de início. o que me deixou aos urros. Ou por cerimónia ou porque estava lá sempre um defesa, a bola nunca tomava a direcção certa. Nesse período, Enzo Perez brilhou a grande altura: cortava, defendia, distribuía jogo, atacava, cruzava...um médio total. Quem diria, no início da época, quando víamos como extremo mediano, ou mais ainda, no ano passado, em que esteve quase a ser definitivamente recambiado. Nesse aspecto, o Benfica soube reconstituir o meio campo depois da saída de Javi e Witsel de forma notável, e sem mais custos.
O resto, já sabemos: golo de Fenando Torres num lançamento longo (ele já tinha marcado um assim na final do Euro 2008), penalty de Cardozo, que não falhou frente a um Cech especialista em defendê-los, remates perigosos de parte a parte, e no fim, aquele golo surgido num canto. Sim, houve falhas, segundo os comentadores, mas caramba, nos últimos minutos de uma final, como esperam sangue-frio a toda a prova? Num canto? A prová-lo, o mesmo Ivanovic que marcou o golo teve depois um falhanço em que Cardozo quase marcava, mesmo a acabar.
Pronto, perdemos mais uma final. jogámos optimamente, dominámos, etc, mas não ficámos com a Taça, apesar de posições nesse sentido dos "nossos" Ramires e David Luiz. De novo. Já são sete finais perdidas. Há bastante má sorte pelo meio, pelo que, supersticioso na bola como sou, me pergunto se a maldição do húngaro Bélla Guttmann seria real. Se não é, voltaremos a ganhá-las, mas para isso é preciso que regressemos às finais.
Indiscutivelmente, esta semana, porventura a mais decepcionante de sempre, deixou marcas no Benfica. Esteve muito perto da glória, mas ela escapou-se. Temos boa equipa, sem dúvida, com aquela pequena pecha do lateral esquerdo, mas mesmo assim não conseguiu ser A equipa. ainda assim, como vou passar por lisboa, farei os possíveis para ir ver o último jogo da época. Não que esteja crente num milagre, mas quero aplaudir os jogadores. Eles merecem. Até porque ainda há a Taça de Portugal (a que infelizmente não deverei poder ir). e depois, quem sabe, talvez este ano seja para o Benfica o que 1984 era para o Porto: o trampolim para uma grande (re)caminhada. Esperemos. Até lá, vejam o apoio incrível dos adeptos benfiquistas em Amsterdão.
É quase uma da manhã, e olhando agora, ainda tenho o cachecol do Benfica ao pescoço. Passaram mais de três horas desde que acabou o jogo, um dos mais cruéis a encerrar aquela que é, provavelmente, a mais cruel semana na longa história do Benfica. Ia escrever muita coisa sobre a injustiça do resultado verificado, a sorte que uns têm (o emprego de Hilário e Paulo Ferreira é que devia ser considerado o melhor do Mundo), e como a ousadia e a coragem muitas vezes acabam em desastre. Mas prefiro deixar para a amanhã, até porque francamente estas coisas arrasam com um homem. Amanhã tentarei fazer uma análise qualquer. Por hoje, só posso dizer que o meu clube me tira anos de vida e me dá tristezas, mas ainda me dá mais orgulho. E ainda não consegui tirar o cachecol...
Chegou o dia da Final. Aquela que já esperávamos há vinte e três anos. Bom, não é a final dos Campeões Europeus, chamem-lhe Taça ou Liga. Mas é uma final da UEFA (rebaptizada duvidosamente de "Liga Europa", ou euroliga, na minha versão preferida), digna dos campeões europeus, como vários lembraram, onde se defrontam o actual detentor do troféu e um dos clubes que mais contribuiu para a sua grandeza. Ou a "Velha europa" suportada pela paixão dos adeptos contra a "Nova Europa" dos cheques dos bilionários.
É uma evidência que à partida o Chelsea é favorito. Além de deter o título maior, depois de arrebatá-lo ao Bayern em plena Allianz Arena e de ultrapassar o Barcelona, e claro, o Benfica, tem jogadores incríveis e uma capacidade financeira quase sem fundo, mercê da fortuna do seu famoso proprietário russo Roman Abramovic. Depois de conquistar o troféu mais ambicionado, não está a passar propriamente por uma época de sonho: perdeu a Supertaça europeia (goleado pelo Atlético de Madrid de Falcao!), as outras taças, teve um campeonato modesto, e a meio da temporada contratou o mal amado Rafa Benitez como treinador assumidamente interino. Passa por um período de transição, à espera do regresso de Mourinho, de quem nunca se livrou de um certo sentimento de orfandade.
O Benfica vem de uma época longa e de um desaire psicologicamente tremendo, que muito dificilmente o impedirá de conquistar o campeonato nacional. Embora tenha uma boa equipa, substituindo muito bem as peças que teve de vender no ano passado, tem de lutar contra o cansaço, a memória dos jogos mais recentes, o favoritismo do adversário e o peso da história nas finais. Não é coisa pouca. São adversários tremendos, só superáveis por uma grande equipa. Jorge Jesus nem sempre se dá bem em momentos decisivos, mesmo que não tenha muitas finais no currículo. Preferia, hoje, que no banco estivesse Ronald Koeman, que nos ensinou a vencer equipas inglesas detentoras do título europeu na sua própria casa (e até treinadas por Rafa Benitez), como estarão certamente recordados. Mas não está, e só podemos contar com quem lá está.
Não sei se vamos ganhar hoje. A tarefa é complicada. O que peço é que joguem com a mesma garra como jogaram contra o Fenerbahçe, e com a mesma inteligência com que pisaram Anfield Road em 2006. Usando a linguagem do nosso adversário de hoje e uma expressão do país do seu treinador e de boa parte dos jogadores, aprendida nos Caminhos de Santiago, No Pain, No Glory. Honrem a camisola. É a única forma de alcançar os objectivos. Contra todos os favoritismos e "maldições". Para que hoje seja realmente Dia de Benfica!
A festa na Baixa, promovida pelo Centro Nacional de Cultura, está de volta ao Porto. É entre 22 e 25 de Maio, em vários locais do centro da cidade. A quem interessar, aqui fica a notícia e o anúncio onde podem ver o respectivo cartaz.
Amanhã joga-se o jogo do título deste ano. O empate de segunda-feira com o Estoril obrigou a que o Benfica fosse às Antas a precisar de não perder para não dar o campeonato ao Porto. O cansaço físico e a quebra psicológica dos jogadores, mais a final da UEFA na próxima semana, tornam essa tarefa particularmente hercúlea. Enzo Perez, preponderante a meio-campo, pode falhar o jogo. E o árbitro escolhido era o único que não podia ser: Pedro Proença, aquele que prejudica sempre, sempre o Benfica, seja com que clube for, e não apenas contra o Porto, há mais de dez anos. Com esta oportunidade caída do céu, já se sabe que à volta do jogo vai-se espalhar um ambiente de ameaça e intimidação, que aliás já começou à chegada dos jogadores do Benfica ao hotel de Gaia. Desde bolas de golfe a gases no balneário do Benfica, passando por agressões a dirigentes e árbitros, de tudo um pouco já aconteceu por aqueles lados, neste clássico. Houve quem soubesse contorná-lo, mas poucos o conseguiram.
Se acredito em milagres no futebol? Sim, mas são tão raros... Não tenho é ilusões. Muito dificilmente o Benfica sairá com qualquer ponto e a equipa inteira, tomando como referência os anos recentes naquele recinto (ou os últimos vinte, se quiserem), o homem do apito e a passividade da autoridade. Se o Benfica sair com um mero ponto, será quase um prodígio. Ganhar lá, sagrar-se campeão, já é uma quimera a que não me atrevo a tanto. Um dia acontecerá, mas tenho as maiores dúvidas que seja amanhã.
PS: como calculava, aconteceu. Não porque a equipa tenha jogado mal - equivaleram-se, mais uma vez - nem por erros arbitrais, mas por uma questão de sorte: além do primeiro golo do Porto ser daqueles "brindes" absolutamente involuntários, o que surgiu do céu nos descontos deu cabo de uma partida que em tudo tinha sido equilibrada. O título voará mais uma vez para uma boa equipa mas comandada por um dos maiores imbecis que jamais treinou equipas em Portugal, e os jogadores do Benfica ficaram certamente com a moral de rastos, proibitivo para quem tem uma final europeia daqui a dias. Percebem agora a descrença para estes jogos? O Benfica é a equipa que melhor futebol pratica em Portugal, e mais uma vez ficará a ver navios. Mas hoje, ao ver Jorge Jesus de joelhos, impotente para travar a má sina, fiquei a simpatizar muito mais com ele. Como se fosse uma personagem das tragédias gregas, um herói mortal e combativo que luta ingloriamente contra o destino, ou um Sísifo. Uma das imagens mais humanas que vi no futebol.
Morreu Giulio Andreotti, "Il Divo" da política italiana, aos 94 anos. Terá sido provavelmente a figura tutelar da 1ª república italiana, onde ocupou todos os cargos: membro da câmara dos deputados desde o início do regime, em 1946, ministro de quase todas as pastas, primeiro-ministro por várias vezes, entre os anos setenta e oitenta, e por fim senador vitalício. Só não ocupou a cadeira da presidência da república porque não lho permitiram, observadas as suas ligações suspeitas com círculos da máfia.
O regime que simbolizou, a 1ª república italiana, e o partido que dirigiu, a Democracia-Cristã, já se tinham estilhaçado sob o peso da corrupção e dos jogos de poder onde se mantinham sempre as mesmas formações partidárias (a começar pelo seu), e para os quais Andreotti muito tinha contribuído. Desapareceu agora o seu máximo representante, uma relíquia política apenas com peso simbólico, mas que conseguiu escapar sempre das acusações mais graves que lhe fizeram. Corcovado, com pequenos olhos melífluos, grandes óculos de massa e um rosto pouco expressivo (ou de expressão misteriosa), Andreotti era certamente um cultor de Maquiavel, com cujo nome era aliás apelidado, e provavelmente descendia de políticos florentinos do Renascimento, ou de tribunos romanos intriguistas. Em todo o caso, era o melhor representante desses traços conspirativos bem italianos.
Marlon Correia, estudante de Desporto e jogador e treinador de futebol amador, foi assassinado a tiro por um gang de encapuçados ao tentar defender o cofre com as receitas de bilheteira da Queima das Fitas do Porto, no recinto do Queimódromo (e ao que parece, os próprios amigos). A Queima arrancava oficialmente, um dia depois, à meia-noite de Domingo, como acontece todos os anos. Que decidiu a Federação Académica do Porto? Cancelar a noite seguinte, por respeito ao estudante que para eles trabalhava e que deu a vida no cumprimento das suas funções para com a FAP? Nada disso. O programa manteve-se inalterado, porque, segundo se dizia " seria um enorme prejuízo". É bom ver a real solidariedade e respeito que os dirigentes académicos têm para com gente que perde a vida ao seu serviço. E os valores actuais por que se pautam as academias - neste caso, a FAP. Fixem bem o nome do seu presidente, Ruben Alves. E depois não digam que a ganância parte apenas dos bancos e das agências de rating. Como se observa por este triste caso, há muitas outras entidades que mostram até que ponto são gananciosas e materialistas. Que raio de exemplos e valores têm estes dirigentes, "doutores" e "DUXes" a mostrar a quem entra nas faculdades?
23 anos depois, o regresso às finais europeias. Tacuara Cardozo, Gaitan e restante turma encarregaram-se esta noite de remeter os turcos para longe, mesmo com uma arbitragem fajuta. A crise que assolou o Benfica entre os anos noventa e 2000 atirou muito do prestígio internacional do Glorioso para o cano. Felizmente recuperámo-lo. A 15 de Maio, em Amsterdão, onde em 1962 o Benfica goleou o todo poderoso Real Madrid e se sagrou bicampeão europeu, tudo pode acontecer. Até acredito que o Chelsea esteja à frente nas casas de apostas, mas temos contas a ajustar desde o ano passado. Para já, o Raul Meireles, que entretanto se mudou para o clube dos otomanosdo lado asiático da velha Constantinopla, pagou as favas. Falta todo o resto da equipa de Abramovich. Mas até à final, temos um campeonato por que lutar. O prestígio europeu do Benfica, esse, está de volta e não vai voltar a escapar. Deves-nos isso, David Luiz. Os blues que se cuidem.
Passei esta semana sem blogar, o que por vezes é mentalmente higiénico, por força da minha peregrinação a Santiago de Compostela. Já lá tinha ido umas vezes de carro e por auto-estrada. A pé, submetido às intempéries, por caminhos com séculos e séculos, as coisas são bem diferentes.
Os Caminhos de Santiago são percorridos há mais de mil anos pelos peregrinos, aos quais devem essa mesma designação (per ager, pelos campos). Apesar da grande afluência e utilização, permanecem afastados das grandes rotas viárias modernas, que os pouparam, e em muitos troços não serão muito diferentes do que eram na Idade Média. Existem, como se sabe, muitos Caminhos de Santiago (o Inglês, o aragonês, os de Portugal, que são vários, o de Finisterra, etc), mas o mais frequentado, aquele que percorri, é o Caminho Francês, que começa em Saint-Jean-Pied-de-Port, passa para a mítica Roncesvalles e daí, por Pamplona, Burgos, Léon e Sarria, até Santiago. O Caminho assume muitas vezes forma de trilho florestal, o que é particularmente agradável quando as ávores são autóctones, ou de via campestre, não raras vezes coberta de lama ou quase leito de riacho, o que os torna complicados no Inverno.Ppelo meio, pequenas aldeolas de pedra, que parecem esquecidas no tempo, mas que vivem graças ao Caminho, cada qual com o seu café-venda onde se acrescenta um novo carimbo à credencial do peregrino, necessária para se obter a Compostela, o certificado que atesta que se cumpriram mais de cem quilómetros a pé (duzentos se for a cavalo ou de bicicleta).
Encontram-se caminhantes das mais variadas nacionalidades, sobretudo espanhóis e irlandeses. A maioria por Fé e devoção, mas também por aventura, desafio ou quaisquer outras razões. Grande parte transporta a sua mochila, por vezes um bastão, e quase sempre a Vieira, símbolo inconfundível de Santiago, a par da sua Cruz. A solidariedade entre peregrinos é grande, e presume-se que a sua idoneidade também, tanto assim é que há vendas à beira do caminho onde se serve do produto e se deixa o valor...sem que haja um vendedor ou quem quer que seja que controle. Mas além dos grupos de caminhantes, há também os que fazem solitariamente, alguns deles singulares. Encontrar numa floresta um templário com as suas vestes pode levar-nos a pensar que recuámos ao Século XIII, mas não é impossível: alguns fazem-no, recordando os cavaleiros que outrora tinham como missão proteger os Caminhos, e deixam mesmo um registo bloguístico.
Depois de um caminho encantador mas exaustivo (e que deixa mazelas), a chegada à praça do Obradoiro (provavelmente uma das mais bonitas do mundo) e a contemplação da soberba catedral, com o Apóstolo a acenar-nos lá em cima, é gratificante. E se se apanhar a missa do peregrino mais ainda: entre os muitos caminhantes que assistem à homilia, agradecemos a protecção divina no caminho e contemplamos o Botafumero no seu pêndulo majestoso, a derramar incenso sobre os assistentes.
Depois, com o objectivo cumprido, abraça-se o Santo, apresentam-se as credenciais na Casa do Peregrino para que obter a Compostela, recuperam-se forças na taperia mais convidativa e começa-se a pensar em novo percurso numa data futura qualquer.
O peregrino, escritor destas linhas, contempla a Catedral de Santiago, meta desta sua viagem