Valsa com Bashir
Nem de propósito, um dos melhores filmes em exibição nas salas é Valsa com Bashir, do cineasta israelita Ari Folman. Com um buraco negro no lugar da sua memória de soldado do Tsahal na Guerra do Líbano, em 82, Folman reconstitui-a graças a variados testemunhos, até descobrir que tinha estado presente em Sabra e Shatila, os massacres de palestinianos efectuados pela falange libanesa, onde o Tsahal agiu com oportuna omissão. A revista da memória é simultaneamente tenebrosa e fascinante, e Folman resolveu colocá-la em documentário, mas em versão animada. O título deve-se a uma cena, em que um soldado israelita, no meio do tiroteio dos snipers em Beirute, desata numa desesperada fuzilaria para todos os lados, como se de uma dança com a metralhadora como par. Nas paredes, vêem-se grandes cartazes com a efígie de Bashir Gemayel. Líder do partido cristão Kataeb/Falange, fundado pelo seu pai, Pierre Gemayel, e das suas milícias paramilitares, Bashir tinha acabado de ser designado presidente do Líbano, com apenas 35 anos, mas seria assassinado à bomba antes de tomar posse. Toldados pelo ódio, com sede de vingança pela morte do seu carismático líder, os falangistas entraram nos campos palestinianos de Sabra e Shatila e mataram indiscriminadamente milhares de palestinianos, enquanto que os israelitas montavam cerco e esperavam pelo fim do massacre sem mover um dedo. O acto provocou a fúria na opinião pública em Israel e rolaram cabeça, tendo Ariel Sharon, na altura ministro da defesa, sido considerado responsável moral por inacção e exonerado de todos os cargos.
O filme tem um tom desencantado, mostrando a transição entre a figura romântica dos Israelitas que saídos do Holocausto defendiam o país contra o muito mais numeroso inimigo árabe, e a intervenção das suas tropas em países estrangeiros, por razões estratégicas. E tem também a virtude de mostrar a barbárie mas também a consciência e a responsabilidade daqueles que assumem as suas culpas e as expõem. Se é verdade que os israelitas não são santos e cometem inúmeros abusos, não é menos verdade que sabem muitas vezes reconhecê-lo e que só num estado de direito poderia existir um filme tão salutar como este. Será que para lá das suas fronteiras, naquele tórrido Médio Oriente, o mesmo poderia acontecer
PS: até pode, em parte, mas de forma clandestina e com a hostilidade das respectivas autoridades nacionais. Provou-o o também documentário animado Persépolis, sobre o Irão, baseado na BD com o mesmo nome, um filme irónico mas comovente.
PS: até pode, em parte, mas de forma clandestina e com a hostilidade das respectivas autoridades nacionais. Provou-o o também documentário animado Persépolis, sobre o Irão, baseado na BD com o mesmo nome, um filme irónico mas comovente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário