quarta-feira, junho 24, 2020

S. João eclipsado


Este dia, ou antes, esta noite é esperada todo o ano. No Natal pensa-se que "só/ainda faltam seis meses para o S. João" (segundo a Bíblia, João Baptista nasceu seis meses antes de Jesus, daí o dia). Quando chega Junho, o Santo António já é uma antecipação; aos poucos vão-se vendo cartazes a anunciar a data, descobrindo majericos à venda, instalam-se palcos, carrosseis e carrinhos de choque na Baixa, Boavista, Foz, Fontainhas e por todo o Porto. E chegada a noite, vêem-se fogareiros a assar sardinhas, famílias ou bairros inteiros a instalar mesas compridas nas ruas e largos, ouvem-se os primeiros martelinhos e começa-se a avistar as luzes dos balões no ar. Assim se inicia a noite mais longa do ano, colada ao solstício, com o epicentro perto do rio, com os bailaricos habituais, da Ribeira até à Foz, passando por Miragaia e Massarelos. No fim, a habitual dificuldade de voltar para casa, sem carro, táxi ou Uber; a solução é mesmo uma caminhada já a ver a alvorada.
Era a noite mais esperada do ano. Agora é igual a todas as outras, nesta época miserável de gente desfigurada nas ruas. Pela primeira vez desde que há registos (e os primeiros vêm de Fernão Lopes, no séc. XIV), não haverá festas de S. João no Porto ou em parte alguma. Ainda hoje vi um entristecido Germano Silva a referir que nem o Cerco do Porto, nem as revoltas ou as outras epidemias todas pararam o S. João. O Covid conseguiu-o. Não sei o que se passa de diferente, mas isto impressiona pela sua dimensão. Pensar que pela primeira vez em séculos não haverá S. João (ou outras festas populares) perturba e entristece. Era daquelas coisas que nos fazia viver. E agora nem sabemos quando voltará, neste mundo em que um surto de 40 contagiados na China é imediatamente notícia. Estamos no meio de uma desgraça inédita ou ficamos mais paranóicos?

DGS divulgou hoje as medidas para os festejos de São João. Porto e ...

PS: soube entretanto que o S. João já tinha tido outras paragens, por razões similares, como a peste bubónica de 1899 (não creio muito, porque só a detectaram em Julho) e outras maleitas.