segunda-feira, outubro 30, 2006

Se não é o "eduquês", é outra coisa qualquer

Parece que as notícias sobre a supressão das férias de Natal, Páscoa e Carnaval aos professores pelo Ministério da Educação não eram afinal verdadeiras. Ainda bem. Só faltava mais essa para considerar as entidades governamentais dessa área uns perfeitos irresponsáveis, por muito que alguns gostem de gabar a "autoridade" e a "coragem" da Ministra que acha que os professores não podem ter medo de jovens delinquentes que os ameaçam nas aulas. E que geralmente confundem esta classe profissional com os seus ineptos e irrealistas sindicatos.
Infelizmente, muitas outras medidas sem sentido parecem estar a tomar corpo. Uma opinião lúcida e informada sobre o assunto é a de António Barreto, no seu artigo do Público de hoje, sobretudo sobre ideia peregrina das aulas de oito horas diárias. É precisamente o que eu penso sobre o assunto

sábado, outubro 28, 2006

Eleições
De novo sobre o Benfica, e deixando para trás a antevisão de um jogo inquinado à partida, realizaram-se discretamente eleições para os orgão sociais do Benfica. Luís Filipe Vieira venceu de novo, com espantosos 96%. Provavelmente teremos mais do mesmo, o que nem é mau, tendo em conta o retorno aos triunfos desportivos, ao saneamento financeiro das dívidas do clube (e da SAD), à concretização de novas infra-estruturas, como o centro de estágio, e ao autêntico resurgimento das modalidades amadoras, fora outras coisas (duplicação do número de sócios, acordos para patrocínios, etc). Mas a grande novidade, a par do regresso de Manuel Vilarinho para Presidente da AG, no lugar de Tinoco de Faria, é a ausência de listas concorrentes e de alternativas aos corpos vigentes. Uma situação inédita e constrangedora, num clube que sempre se caracterizou pelo pluralismo, pela escolha democrática e pelo debate (por vezes bastante exaltado, como se sabe), antes de todos os outros. Um dos traços identificadores mais importantes do Benfica fica assim interrompido por falta de comparência de quem tinha uma palavra a dizer sobre o que não correu bem nos últimos anos. A pesar do bom trabalho realizado, eram bom que a legitimidade desta direcção, com a sua maioria digna de um Al Hassad (ou pior, de um Pinto da Costa), não tivesse a aparência de ser absoluta, o que poderá dar tentações a vieira de ser ainda mais autoritário e de dizer aquelas grandiloquências que só ele. A rever absolutamente. Pense-se nisso nas próximas eleições.
PS: como temia, o Benfica perdeu o jogo do municipal de Contumil. No último minuto, com um golo caído do céu, e quando procurava o tento da vitória, perante um público quase 100% adverso. Protestam os portistas contra a lesão de Andersson, originada por uma falta de Katsouranis (que daria amarelo). Para quem apoiou a expulsão de Micolli, é um bom exemplo de humor negro. E nem é preciso falar das lesões de Rui Costa e Karagounis. O desfecho do jogo só prova que a velha máxima "a sorte protege os audazes" tem excepções visíveis. E nem é a "estrelinha de campeão", que só aparece a quem por ela procura e nem a quem consegue ganhar sem saber ler nem escrever.

segunda-feira, outubro 23, 2006

Resultados calculados

Depois da benesses concedidas ao Porto em Avalade, como o inexplicável perdão a Paulo Assunção, e das tropelias de Carlos Xistra na Luz, com um belo trabalho impedindo o Benfica de marcar mais golos na Luz e atirando Micolli para fora do jogo nas antas, confirma-se que o caso do Apito Dourado está definitivamente morto e enterrado e que a compra de resultados, ou pelo menos de árbitros, está aí, de volta e mais descarada do que nunca. Nem vale a pena ter esperanças de repetir a brilhante vitória do ano passado. Mais vale que quem está por trás desta tramoia encomende já as faixas. Assim como assim, já nem disfarçam.

sábado, outubro 21, 2006

Justiça e esquecimento no Nobel da literatura

Também sobre o valor estritamente literário do prémio se podem fazer inúmeras considerações. Na lista de galardoados há uma imensidão de figuras que provavelmente só ficaram para a posteridade por causa do galardão, mas que são desconhecidos na maioria dos países. E depois há o contraste com a quantidade de autores que mereceriam indiscutivelmente constar do quadro.
No Corta-Fitas falou-se bastante do assunto nos últimos dias. Aqui fica uma lista de alguns indicutíveis que ganharam o prémio, à qual eu acrescentaria Pasternak, Sartre (nenhum deles o recebeu, o primeiro porque não o deixaram, o segundo porque não quis, sob inúmeros pretextos), Cela, Octavio Paz e Gide. Segue-se outra dos esquecidos pela Academia, o que faz pensar quais os critérios das escolhas. Também aqui, acrescentaria mais alguns, como Duras, Fitzgerald, Kundera ou Vargas Llosa, sendo que estes dois ainda podem lá chegar. E também mais alguns artistas da língua portuguesa. Bem sei que Pessoa era em vida um desconhecido, e que a literatura brasileira e PALOP só tarde desabrocharam internacionalmente. Mas um Torga, uma Agustina, um Vergílio Ferreira, um Amado, um Guimarães Rosa, um Melo Neto, até um Lobo Antunes, não desmereceriam menos que Saramago. E mesmo sabendo-se que a Academia é nórdica, não deveriam ficar atrás dos dinamarqueses, que só à sua conta conseguiram três laureados.
As razões do Nobel

A atribuição do Nobel da literatura a Orhan Pamuk não surpreendeu excessivamente. O escritor turco estava já na lista de candidatos, pelo que não houve reacções de escândalo ou euforia. Como quase só ouvi falar dele na última semana, não posso deixar aqui uma opinião crítica sobre a sua obra, que tem merecido rasgados elogios, ou a justiça do prémio. Outros havia, mais sonantes, mas se ganhou este é porque o júri tinha justificadas razões.

O que já me incomoda mais são as colagens políticas que inevitavelmente fazem sempre aos vencedores ou candidatos, ou porque uma determinada causa se cola a um deles, ou porque o comité do Nobel está "politicamente comprometido" (normalmente é acusado de ser "politicamente correcto"), ou ainda porque os adeptos dos que não ganham ficam irados pelas razões extra-literárias dos seus escolhidos não são tidas em conta.

Caso paradigmático é o do ano passado. Muitos atiraram-se à escolha de Harold Pinter pelas suas preferências pró-comunistas e anti-americanas (que o dramaturgo inglês tratou de confirmar num violento discurso por audiovisual, na cerimónia de entrega do prémio), vendo aí um inequívoco compromisso dos votantes escandinavos com as ideias defendidas pelo laureado. A ser esse o caso, seria de um facciosismo e de uma irresponsabilidade atrozes. Simplesmente, alguns desses críticos também estavam contra a escolha, não por discordarem da obra em si (muitas vezes nem sequer a conheciam, como muitos dos que se atiraram a Pinter), mas exactamente porque o vencedor ostentava uma conotação política adversa da sua. Caiem todas as eventuais razões de indignação e fica apenas a mesquinhez e a hipocrisia, muitas vezes cobertas com um véu de ignorância sobre o mérito do prémio.

Neste caso, dá ideia que a Academia premiou o escritor um pouco por causa da sua luta contra o abafamento do genocídio arménio e da repressão contra os curdos que vigentes na Turquia. São causas nobres, sem dúvida, que merecem o maior apoio. Só que o Nobel da Literatura devia estar reservado para os grandes trabalhadores da escrita e da língua, para os que escrevem deleitando, em prosa e poesia, para os que revelam sensações, angústias, emoções, estados de alma ou de espírito, para os que criam novos estilos e novas linguagens, para os que legam à humanidade as suas obras inspiradas pelo génio e pelo engenho. Nobeis para boas causas serão os outros, nomeadamente os da Medicina e da Paz (muitíssimo bem entregue, o deste ano, esperando que vingue ainda mais), pelas quais foram aliás criados. Por isso não posso concordar com entusiastas desta escolha pelas razões que apresentam, como José Manuel Fernandes, que disse no Público que "A Academia desta vez acertou". Talvez tenha acertado, mas não certamente por essas razões.

sexta-feira, outubro 20, 2006

Na casa de Bernarda Alba, 70 anos depois.

Aparte todo o registo trágico-cómico-melancólico de Volver, o último filme de Almodôvar (e o primeiro em muitos anos com Penélope Cruz), houve um pormenor que me chamou a atenção. Na altura em que a irmã de Raimunda (a personagem de Cruz) chega à casa da tia morta na véspera, depara-se, ao fugir do suposto fantasma da mãe,e vai dar por engano ao pátio onde estavam os homens, macambúzios, falando baixo com um copo na mão. Num compartimento mais acima, as mulheres carpiam-se, trazendo à baila recordações e abanando-se vigorosamente com leques. Toda esta acção se passa numa aldeia fictícia da Mancha, entre uma paisagem árida e ventosa, onde se destacam campos de ventoinhas eólicas.

E lembrei-me dela pelo seguinte: os mesmíssimos elementos aparecem por esta ordem na peça teatral de Garcia Lorca A Casa de Bernarda Alba (onde cheguei a entrar como figurante nos meus tempos de liceu), salvo que aqui a cena passa-se na Andaluzia, mais sul. Mas a estrita divisão homens-no-pátio/mulheres-dentro -de-casa-abanando-se-com-o-leque está lá, numa divisão sexista, arreigada. E a obra data de 1935, pouco antes do assassinato do poeta e dramaturgo espanhol. Já o filme passa-se na actualidade. Acaba por ser uma homenagem involuntária de Almodôvar a Lorca. E revela como é espantoso que certos hábitos permaneçam em algumas regiões que parece que pararam no tempo. E que, pese a tragédia e o clima de inflexibilidade extrema que paira sobre a peça de Lorca, muitas tradições de velar os mortos conservam um respeito e uma austeridade imutáveis, não deixando ainda assim de olhar a morte com certa naturalidade. Será uma manifestação de obsoletismo arcaico, mas não deixa de ter uma dignidade que impõe respeito.
PS: pensando bem, estava-me a esquecer de alçguns velórios onde estive presente. O costume dos homens ficarem cá fora e as mulheres a carpir-se lá dentro também existe em Portugal, embora menos nas grandes cidades.

quinta-feira, outubro 19, 2006

No Barroso

Abraçando os concelhos de Boticas e Montalegre, com 1279 metros de altura no ponto mais alto, fica a Serra do Barroso, já uma antecâmara da Peneda-Gerês. De Boticas começa-se a subir, passa-se por Carvalhelhos e chega-se à aldeia de Alturas do Barroso, perdida lá no alto. Uns centos de metros adiante ficam os "Cornos das Alturas", dois cabeços com vestígios castrejos no seu cocuruto e que lembram os chifres do gado desta região, aquele mesmo que nos proporciona combates violentos entre os seus machos, além da carne de primeira ordem. A paisagem é pedregosa, a vegetação predominantemente rasteira; mais abaixo abundam os lameiros e os bosques de abetos, que no Inverno, com neve, revelarão seguramente uma paisagem autenticamente natalícia.
Depois dos Cornos desce-se até à zona das grandes barragens. A maior de todas está lá em baixo, a do Alto Rabagão, ou Pisões, que em Portugal só é ultrapassada em área e capacidade pelo Alqueva. A vista daquela quantidade de água, de um azul profundo, neste Verão, é um enorme contraste com as penedias que se erguem atrás, envoltas no tojo. Um cenário de beleza selvagem mas serena, de autenticidade transmontana, em que se se pode ouvir perfeitamente os zumbidos dos insectos, tão escasso é o tráfego por aqui.

Os Cornos das Alturas, Barroso, Agosto de 2006.

Depois do Alto Rabagão seguem-se mais barragens, Montalegre, com o seu castelo roqueiro, Pitões das Júnias, Tourém, Espanha. Um itinerário que será igualmente objecto de umas breves notas, quando um dia o percorrer.

Barragem do Alto Rabagão, Agosto de 2006.

Sobre esta região, ver também este post do Abrupto (há reamente uma eólica juntos aos dois cotos, provavelmente para alimentar a aldeia), este blogue, e mais estes dois.
Desconsolo

Demasiada gente à frente, distracções a meio campo e falta de rins para travar os adversários em corrida de lebre deram no que deram em Glasgow, onde um resultado volumoso e mentiroso tira quase todas as esperanças do Benfica seguir em frente. Depois da soberba goleada em Leiria, frente ao FCPorto-b, esperavam-se mais arrancadas de Micolli e passes de Nuno Gomes, mas só ficaram as intenções e bolas ao lado. Assim são as "vitórias morais", com os inevitáveis chutos à barra (e não nas redes interiores), mas infelizmente não dão pontos. Nem euros.

terça-feira, outubro 17, 2006

Pequeno calendário das festividades que passaram
Em Setembro, por confusão de datas, falhei a festa da Senhora da Pena, em Mouçós, Vila Real, embora estivesse a poucos quilómetros. O interesse do evento era o de os andores terem uma dimensão anormalmente elevada, tanto que este ano concorriam para o Guiness com um de 22 metros de altura, sustentado por 50 almas.
Não estive nessa festa nem na Srª da Almudena, às portas de Vila Real, e muito menos na famosa romaria dos Remédios, em Lamego, no mesma fim de semana. A época estival é abundantíssima em festas populares em honra do Santo ou da Santa y, ou de Nosso Senhor de Qualquer Boa Aventurança. São as descendentes directas dos cultos sazonais pagãos, de recordações milenares. quem viaje por Trás-os-Montes nessa estação, por exemplo, vê cartazes alusivos em todos os concelhos e freguesias, e o mesmo se passa noutras regiões.
Este ano, no Minho, depois do Santo António de Famalicão (que apanhou com uma tromba de água) e do S. João em Braga, havia festas dia-sim dia-não: as de Cerveira; as Gualterianas de Guimarães; a Stª Rita, em Caminha; as de Valença; as de Paredes de Coura (logo antes do festival); a Senhora da Agonia, em Viana; Senhora das Dores, em Monção, apesar da mais conhecida ser a da Coca, no Dia do Corpo de Deus; o S. Bartolomeu, em Ponte da Barca e povoações do concelho de Esposende; e ainda a Senhora dos Navegantes, em Âncora; e, para finalizar, as Feiras Novas de Ponte de Lima, que fecham a saison de festas. E não esquecer os novos gêneros que estão a surgir por toda a parte: as feiras medievais, uma categoria de eventos que serve de filão renovado a muitos concelhos e que prometem concorrer com as tradicionais festividades. Ou complementá-las. Seja como for, ainda é cedo para avaliá-las, mesmo porque até ao momento só se destacaram as de Santa Maria da Feira. A confirmação pode vir no próximo Verão, que este ano, só resta mesmo o de São Martinho.

segunda-feira, outubro 16, 2006

Um filme conveniente

Já deve estar em poucos cinemas, mas a verdade é que Uma Verdade Inconveniente é uma agradável surpresa. Pedagógico, bem explicado, divertido e muito eficaz, afastando dúvidas prementes. E Al Gore é, imagine-se, um bom actor para o filme em questão. Totalmente aconselhável a cépticos e negacionistas de um dos maiores, se não mesmo o maior, problemas do nosso tempo.

sexta-feira, outubro 13, 2006

A retirada do Pai Guerra
Nos anos que passei na faculdade conheci inúmeros professores, alguns dos quais já com alguma notoriedade, e outros que viriam a alcancá-la. Havia porém uma figura que marcava toda a vida académica, alguém que parecia omnipresente, que estava umbilicalmente ligado áquela instituição.
Francisco Carvalho Guerra, o "Pai Guerra", projectou e criou a Universidade Católica no Porto, desde as exíguas instalações da Torre da Marca até aos dois modernos pólos hoje existentes. Lembro-me particularmente de uma assembleia geral de estudantes a pedir a demissão do reitor da UCP na altura, Isidro Alves, que pretendia afastá-lo do seu cargo. E de uma manifestação por ocasião de uma visita de D. Ximenes Belo com o mesmo intuito. Mas Carvalho Guerra permaneceu no lugar, ostentando o mesmo ar bonacheirão e paternal, e o infindável entusiasmo contido. Até ontem, dia em que se despediu entre um coro de emoções e elogios de todos os quadrantes, a acabar no Cardeal Patriarca. Imaginar o "Pai Guerra" na reforma é coisa de difícil hábito e que requer esforço mental sobre-humano.
Continuação

Parece que depois do meu último post se multiplicaram as declarações em sentido parecido em diversos blogues. No Público de hoje, Pacheco Pereira escreve um interessante artigo sobre o mesmo assunto, e sobre o semi-paradoxo do preconceito de querer colocar Salazar na lista vir precisamente do "respeitinho" tão inculcado pelo Estado Novo (só é pena que recorra ao seu tão querido e exausto "politicamente correcto", mas aqui até é aplicável).
Entretanto já actualizaram " lista de sugestões" de forma mais consensual, ou pelo menos mais sensata. Além de Salazar, incluíram igualmente Marcello Caetano. E Pedro Hispano, outro nome imprescindível, que se não me engano, não constava lá há dias. Ainda assim há falhas: puseram lá dois Eduardos, Gajeiro e Souto Moura, que eram escusados, e esqueceram-se do Lourenço. E D. João IV continua de fora. Vá-se lá entender...

terça-feira, outubro 10, 2006

E o cardeal D. Henrique, não lhe arranjam um lugar?
Eu já desconfiava. Anda agora a ser anunciado um concurso promovido pela RTP para saber quem foram "os maiores portugueses", à imagem do que fizeram outros países (com resultados surpreendentes e discutíveis, diga-se desde já). Anúncios em barda circulam pela TV pública, com pregões de mercado e discussões de café, lançando para o ar nomes das mais diversas personalidades. Num desses reclames, lembrei-me como teria graça alguém mencionar o nome de Salazar. Não é que sinta particular afeição ao vetusto ditador da pachorrenta Santa Comba, nem ao seu regime corporativista, repressivo e rural. Mas faz-me alguma espécie como é que em plena UE, e com a democracia consolidada, ainda que com falhas graves, o simples nome do professor de finanças continue a provocar mais histeria que o de Belzebu. Devem ser raríssimas as recordações onomásticas- só conheço uma ruela com as palavras "Oliveira Salazar" em Santo Tirso, e talvez as haja igualmente na sua terra natal.
Também não sou daqueles que falam constante e incessantemente da "ditadura cultural da esquerda" ou de "vivermos sob um regime socialista", como é próprio de direitistas mais radicais. Mas às vezes até apetece. É que dando uma vista de olhos às dezenas de "sugestões" que o site nos dá, e mesmo tendo em conta que a escolha da personalidade é "livre", não consigo encontrar o nome de antónio de Oliveira Salazar, pelo meio. Goste-se ou não, trata-se de um estadista que esteve mais de três décadas no poder, que caracterizou uma época, um regime, uma Constituição, e que teve os seus aspectos positivos, como o controlo das finanças públicas. Em contrapartida, aparecem-nos lá figurões com idêntica concepção da liberdade, mas menos influentes, como Afonso Costa, Vasco Gonçalves ou Otelo Saiva de Carvalho, e ainda figuras pouco mais que irrelevantes, uma Catarina Eufémia, Manuel dos Santos, e ainda aqueles que, merecendo fazer parte desta lista como prémio pelo seu trabalho em diversas áreas, não estão à altura de serem considerados "o maior português" (casos de Cesariny, Manoel de Oliveira, Joaquim Agostinho, Siza Vieira, etc).
O meu voto? Camões, Pessoa, Nun Álvares, D. Henrique, D. Afonso I...talvez o autor dos Lusíadas, a quem todas as homenagens são justas. Mas noto agora outra grave falha: então não é que na parte relativa aos reis metem-me D. João V, D. Carlos e D. Maria II e esquecem-se do Restaurador? Como é possível terem posto de parte D. João IV? E ainda acrescentaram o demente D. Sebastião, que de relevante só nos deixou um mito e uma esperança brumosa (além do seu tio-avô, o vetusto e cardinalício D. Henrique, como rei).
Isto é que é "Serviço Público"? O tanas!

quinta-feira, outubro 05, 2006

Entretanto, na Áustria
Na Áustria, os socialistas do SPO voltaram a ganhar as eleições, superando o OVP, que estava no poder. Como não obtiveram maioria, tiveram, à imagem da srª Merkel, de fazer uma "Grande Coligação" com os conservadores. A direita mais quezilenta e xenófoba, que obteve votações elevadas, a isso os obriga. Com mais esta imitação dos vizinhos germânicos (mas não inédita, note-se) e os largos votos obtidos pelos herdeiros de Jorg Haider, sabe-se lá se não aparecerão alguns "germanistas", correspondentes lá do sítio aos nossos iberistas, a exigir novo Anschluss. Felizmente, a economia austríaca não está assim tão má (e não é graças a Hayek), a Alemanha não anda para aí virada - ainda bem que existe a UE - e o primeiro-ministro cessante Wolfgang Schüssel não é, apesar de tudo, nenhum Engelbert Dolfuss (uma espécie de Salazar austríaco, mas com menos sorte).
Nos próximos dias vou dar uma volta a zonas, como a Beira Baixa que lamentavelmente ainda não conheço. Bom fim de semana prolongado a todos os que o puderem aproveitar, e boas comemorações do feriado que assinala a fundação do Reino de Portugal.

terça-feira, outubro 03, 2006

Espanha?

Outra conversa da semana passada, resultante da tal sondagem do Sol, que dizia haver 28% de portugueses que queriam ser espanhois. Normalmente, há dois tipos de iberistas: os que vivem no interior profundo, e se sentem abandonados pelas autoridades centrais, e em geral pelo resto do país, e aqueles que por causa da nossa emperrada economia e baixo crescimento, à vista das Zaras, dos Seats e de Penélope Cruz, lamentam-se da sua sorte e clamam ardentemente por Espanha. Se os primeiros têm a sua dignidade, os segundos são de uma precipitação mesquinha e néscia coberta por argumentos inexplicáveis, como os do Arquitecto Saraiva (isto deve andar tudo ligado), que diz que "estamos a atravessar a maior crise da nossa história". Seria bom que alguém fizesse aos senhores iberistas a seguinte pergunta: teriam a mesma vontade de se juntar ao país vizinho se vivessem em 1936?

segunda-feira, outubro 02, 2006

It ´s not the economics, stupid
A semana blogoesférica ficou alvoroçada com o anúncio de que Pedro Arroja iria colaborar regularmente com o Blasfémias. Já tinha ouvido uns tímidos elogios ao economista radicado no Porto, mas a ideia que tinha dele vinha de uma entrevista que deu à saudosa Grande Reportagem, que conservo algures, em Maio ou Junho de 1994 (inclino-me para a segunda hipótese, já que a capa era sobre o Dia D), feita por Fernanda Câncio, que em boa hora a disponibilizou na íntegra.
Recordava-me sobretudo da passagem em que ele defendia que os votos deviam poder ser vendidos, e "não deitados fora", e que "os pobrezinhos sairiam beneficiados". Ou da defesa de um partido nortenho encabeçado por...Pinto da Costa(!!!). Se já tinha ficado altamente deagradado com as ideias do senhor, ainda mais fiquei ao reler a entrevista, nas opiniões sobre a escravatura ("Eu não quero dizer que a escravatura era aceitável, mas não foi má para os negros em termos económicos"), a pena de morte ("O que se concluiu é que por cada pessoa executada na cadeira eléctrica havia sete crimes que deixavam de ser cometidos. Então o que é que é desumano?"), apresentando conclusões contrárias à maioria dos estudos, que provam que o crime é mais elevado exactamente devido à pena de morte. E não só: ao longo da conversa, Arroja debita uma falta de ética, um apego aos números sobre qualquer outra realidade, uma asséptica ideia do mundo ("O que é que é sagrado para si?" "Nada. Nada."), e aquela crença fanática, e simultaneamente determinista, científica, de que a pura economia de mercado sem qualquer intervenção estadual é infalível, e que o mercado prevalece sobre qualquer forma de política e forma de governo, inquinando inclusivamente a escolha democrática feita pelos cidadãos. O neoliberalismo em pleno estado de pureza, escarrapachado, cristalino.
Alguns chamarão a isto de "liberdade". Eu recuso-me a confundir esta dogmática economicista com o primeiro valor da trilogia francesa, que aliás Arroja não deve apreciar. A Liberdade não pode caír na anarquia moral, na dissolução dos valores de uma sociedade, e mais ainda, de uma civilização, que nos é proposta pelos neoliberais de laboratório. Podem os blasfemos considerá-lo "um dos mais importantes defensores da Liberdade que Portugal conheceu nas últimas décadas". Tenho, como aqui já disse, respeito e apreço pelo blogue em questão, do qual aliás conheço vários elementos, embora a maior parte das vezes discorde deles. Por isso lamento que venham com proclamações bombásticas que roçam a idolatria do referido economista, e que acabam por caír no ridículo. Não serei, certamente, assíduo leitor dos futuros escritos do Dr. Arroja. Perdoem-me, mas o megafone ultraliberal acaba por tirar a paciência a um santo.
PS: o maradona deixa aqui a sua própria visão da coisa. Ó Carlos, essa de ser comparado a um Quindim não devia passar impune.