sexta-feira, janeiro 30, 2009

Lisboa-Gaza
Leio que a Assembleia Municipal de Lisboa aprovou a geminação da capital portuguesa com a cidade de Gaza, uma proposta do Bloco de Esquerda, com aprovação do PCP e abstenção dos restantes partidos.
Vinda de quem vem nem me admira, há sempre a eterna invocação do "povo martirizado". Mas já que vamos nessa, podiam também propôr a geminação com Grozny, Rangun, Kandahar, e sobretudo Lhassa. Nesta, em especial sempre gostava de saber o que diz o PCP.
A propósito, será que essa história da geminação implica visitas e recepções recíprocas entre as autoridades municipais de cada cidade? É que se assim é, ainda vamos ver António Costa a entregar a chave de Lisboa a um clérigo e a um bombista, com direito a discurso forçado sobre "os laços culturais" e os "traços de união".
(Quem quiser protestar contra o disparate, pode assinar a respectiva petição).

segunda-feira, janeiro 26, 2009

Efeméride esquecida

Passou-me a data da instauração da Monarquia do Norte, há uma semana. E logo nos noventa anos do dia em que a bandeira com a coroa real flutuou de novo nas varandas do Porto. Repito apenas as palavras que disse há um ano. Um acontecimento importante para o país, que como sempre a comunicação social, por ignorância ou oportunismo, deixou passar, com raríssimas excepções. Mas a culpa será também dos monárquicos, por se esquecerem ou pouco referirem o acontecimento - contra mim falo, como é óbvio. felizmente, houve quem não se esquecesse. Mas o movimento nunca chegou a unir os monárquicos, já que faltava o crucial apoio de D. Manuel II, que sempre recusou que a restauração da monarquia assentasse numa revolta armada. Talvez por isso os republicanos conseguiram virar as coisas a seu favor e através do seu exército civil, a Carbonária, dominar os monárquicos que se acantonaram em Monsanto, Lisboa, para depois voltar a controlar o país por inteiro.


O mais provável é que depois deste quasi esquecimento das semanas em que o Norte do país voltou a aclamar o rei, a 31 de Janeiro se ouçam as habituais hossanas e recordações da revolta republicana de 1890, também no Porto, e dos seus "bravos", como se de uma façanha homérica se tratasse. E no entanto, esta não teve, nem de longe nem de perto, o apoio nem a longevidade da Monarquia do Norte.

Ps: um aditamento precioso e esclarecedor sobre assunto, no Estado Sentido. Para quem quiser conhecer estes acontecimentos com grande pormenor, pode recorrer à obra escrita com conhecimento de causa por Rocha Martins, reeditados em dois tomos, pela Bonecos Rebeldes.

Valsa com Bashir


Nem de propósito, um dos melhores filmes em exibição nas salas é Valsa com Bashir, do cineasta israelita Ari Folman. Com um buraco negro no lugar da sua memória de soldado do Tsahal na Guerra do Líbano, em 82, Folman reconstitui-a graças a variados testemunhos, até descobrir que tinha estado presente em Sabra e Shatila, os massacres de palestinianos efectuados pela falange libanesa, onde o Tsahal agiu com oportuna omissão. A revista da memória é simultaneamente tenebrosa e fascinante, e Folman resolveu colocá-la em documentário, mas em versão animada. O título deve-se a uma cena, em que um soldado israelita, no meio do tiroteio dos snipers em Beirute, desata numa desesperada fuzilaria para todos os lados, como se de uma dança com a metralhadora como par. Nas paredes, vêem-se grandes cartazes com a efígie de Bashir Gemayel. Líder do partido cristão Kataeb/Falange, fundado pelo seu pai, Pierre Gemayel, e das suas milícias paramilitares, Bashir tinha acabado de ser designado presidente do Líbano, com apenas 35 anos, mas seria assassinado à bomba antes de tomar posse. Toldados pelo ódio, com sede de vingança pela morte do seu carismático líder, os falangistas entraram nos campos palestinianos de Sabra e Shatila e mataram indiscriminadamente milhares de palestinianos, enquanto que os israelitas montavam cerco e esperavam pelo fim do massacre sem mover um dedo. O acto provocou a fúria na opinião pública em Israel e rolaram cabeça, tendo Ariel Sharon, na altura ministro da defesa, sido considerado responsável moral por inacção e exonerado de todos os cargos.
O filme tem um tom desencantado, mostrando a transição entre a figura romântica dos Israelitas que saídos do Holocausto defendiam o país contra o muito mais numeroso inimigo árabe, e a intervenção das suas tropas em países estrangeiros, por razões estratégicas. E tem também a virtude de mostrar a barbárie mas também a consciência e a responsabilidade daqueles que assumem as suas culpas e as expõem. Se é verdade que os israelitas não são santos e cometem inúmeros abusos, não é menos verdade que sabem muitas vezes reconhecê-lo e que só num estado de direito poderia existir um filme tão salutar como este. Será que para lá das suas fronteiras, naquele tórrido Médio Oriente, o mesmo poderia acontecer



PS: até pode, em parte, mas de forma clandestina e com a hostilidade das respectivas autoridades nacionais. Provou-o o também documentário animado Persépolis, sobre o Irão, baseado na BD com o mesmo nome, um filme irónico mas comovente.

sexta-feira, janeiro 23, 2009

Israel e o futuro próximo

Um dos magnos problemas com que Obama se deparará será com o intrincado e quase irresolúvel problema israelo-palestiniano. Décadas de ódio e ameaças não permitem ver uma solução à vista; sempre que se avista uma luz de um lado, do outro alguém se encarrega de criar problemas. Tem sido um pesadelo recorrente de qualquer presidente americano, pressionados que são por todo o tipo de lóbis.


Não falei da actual frente de batalha de Gaza, momentaneamente parada, que começou no fim de 2008. Os "foguetões" do Hamas faziam prever a ofensiva israelita, como muito bem sabiam os detentores de Gaza. Israel naturalmente tinha de ripostar e mostrar aos integristas islâmicos que controlam aquela faixa caótica que não estava disposta a aceitar o seu comportamento. O problema é o mesmo de sempre: as razões de direito e de facto assistem aos israelitas, o modus operandi é que é sempre discutível.


Ataques por ar, terra e mar provocariam sempre razias no caos humano e material que é Gaza. Sabendo-se que depósitos de armas são instalados em escolas e outros armazéns pouco ortodoxos, percebe-se logo que os custos humanos serão duros. Torna-se difícil aos israelitas evitá-los, e não são panfletos atirados do ar a avisar qual alvo dos bombardeamentos com meia hora de antecedência que vão permitir o contrário. Mais culpas terão de ser assacadas pelos responsáveis pela destruição de um hospital da ONU bem identificável, além de outros equipamentos. A legitimidade de Israel é por vezes levada ao exagero e provoca abusos nítidos, como já acontecera no Líbano, há dois anos.



Entretanto, viram-se as manifs do costume. Milhares de pessoas desfilando contra "o genocídio em Gaza", misturando anarco-libertários, radicais, pacifistas, comunistas (de protestar contra a repressão no Tibete é que estes nunca se lembram) e extremistas islâmicos, queimando bandeiras israelitas e americanas e ostentando cartazes com coisas tão edificantes como "God bless Hitler" ou "Islam will dominate the world". Uma mistura perigosíssima de fanáticos, que de comum têm esse mesmo fanatismo. Contra natura, pois claro, mas Hitler e Estaline também assinaram pactos de não-agressão.



Entretanto, a intervenção israelita em Gaza está interrompida. Os mísseis do Hamas pararam de silvar. Mas ninguém acredita que isto fique por aqui. Enquanto a ordem e os tratados não forem cumpridos no essencial, nada se pode esperar de bom. E o essencial é que Israel cumpra as disposições contidas nas tréguas, que o Hamas recue e seja dominado, e que se reconstrua Gaza. Tudo isso demorará tempo a fazer, se o fizerem, claro. Até porque os ódios não se apagam de um momento para o outro.


Importante será que o Likud não alcance a maioria nas próximas legislativas. Se o conseguir, a situação piorará inevitavelmente. Diz-se cinicamente que a intervenção no Líbano é uma campanha pré-eleitoral mais acirrada. Pode ser. Mas se servir para Tzipi Livni se mantenha no poder em coligação com os trabalhistas, até servirá para algo mais do que enfraquecer militarmente o Hamas. O regresso de Netanyahu ao poder significará uma posição intransigente e a expansão dos colonatos.


A União Europeia, que já treina a polícia palestianana e que tem sido generosa na ajuda financeira e na construção de infra-estruturas, teria aqui uma oportunidade de ouro de fazer valer os seus galões: a deslocação de uma força militar para Gaza, com mandato onusiano, que controlasse os radicais do Hamas e os impedisse de lançar rockets, fazendo com que Israel recuasse militarmente mostraria um Europa com mais do que soft-power. Mas isso, claro, é uma ideia peregrina. Para controlar o Hamas, que conta com bom armamento e milhares de voluntários prontos a matar-se, só mesmo uma força numerosa e que não se ficasse pelos disparos para o ar. Mas os tempos económicos são pouco favoráveis a projectos desse tipo. Para mais, subsistem os problemas do costume: a Europa não é um todo, e teria de haver disponibilidade e comum acordo entre os principais países, só que a Grã-Bretanha só pensa em retirar, a Alemanha só tem tropas de "vigia", proibidas de intervir activamente, em Espanha Sapatero é um ambíguo com que dificilmente se pode contar, a França enviaria um pequeno contingente excepto se fosse muito do seu interesse nacional, e a Itália, militarmente falando, pouco conta (os italianos são tão maus soldados!). A "nova Europa" poderia enviar uma força de algum peso, mas lá está, a crise financeira não o permite, e quanto ao resto, Portugal unido, tem pouco peso, sem contar com países neutrais, como a Suécia (longe vão os tempos de Gustavo Adolfo). Para mais, não se sabe o que diria a opinião pública, que, a avaliar pelas manifestações dos últimos tempos, tem imenso receio em afrontar os radicais islâmicos. Numa delas, aliás, ficou a imagem inquietante de uma turba em Milão, que, depois de queimar a bandeira de Israel na praça do Duomo, se deitou a rezar para Meca em frente às escadarias da Catedral. Uma demonstração do despeito de certos fanáticos, mas que entretanto já teve consequências: o governo italiano proibiu manifestações frente a templos religiosos. Berlusconi sempre serve para alguma coisa. Mas se alguém se lembrasse de fazer uma missa campal em frente a uma mesquita, nem digo na Arábia Saudita, mas no Paquistão ou na Argélia, o que sucederia?

quarta-feira, janeiro 21, 2009



President Obama and Secretary of State Rodham Clinton


Não pude ver a tomada de posse de Barack Obama, o seu discurso e a enorme multidão que assistiu à cerimónia, no frio de Washington. Para alguma coisa me há de servir o Youtube. Noto apenas que toda a cobertura mediática é proporcional ao entusiasmo que o novo presidente americano despertou nos últimos meses. O seu carisma e vontade de mudança são razões plausíveis, mas o facto simbólico de não ser branco também ajuda e muito. O grande problema será estar à altura das enormíssimas expectativas que criou, ora pela desastrada comissão de Bush, ora pelo discurso renovador que trouxe à política americana, ou ainda pelos exageros do costume, aos quais Obama é alheio. Certo é que não começou a chover mel e que daqui a uns tempos começará a colher ódios (aliás já começou). A decisão primeira de começar a fechar Guntánamo é de louvar, mas bem maiores serão os problemas a partir daqui.



Fico também com curiosidade de ver o papel espinhoso de Hillary Clinton como Secretária de Estado, como sucessora de Condoleeza Rice (e de outra democrata que decerto conheceu bem, Madeleine Albright). Há um ano, é bom recordá-lo, quase todos a viam como futura chefe de estado americana. Não conseguiu atingir esse objectivo que durante anos almejou, mas responsabilidades não lhe faltam. Falhada a presidência, Hillary não deixará de tentar deixar a sua marca na história noutras funções.
A herança de Walker Bush e o contágio do ridículo

Bush desandou, por fim, como era desejo de grande parte da população mundial e americana. Um presidência eivada de erros, equívocos, abusos de poder e tensões. Um homem sem grandes conhecimentos ou rasgo, pouco inteligente, que deve o cargo ao apelido, e que acaba por ser um bom exemplo do oposto da meritocracia, tão contrário ao espírito americano. Deixou-se guiar por todos quanto o rodeavam, nomeadamente o grupo neoconservador e alguns oportunistas de sempre, como Rumsfeld e Cheney. Não deixará saudades. Sai com uma crise financeira e económica gravíssima, o seu projecto do Iraque numa incógnita, o Afeganistão mais inseguro do que nunca e o prestígio americano americano abalado por Guantánamos, Abu Grahibs e outras vilezas. O maior pecado de Bush será mesmo a forma incrível como desperdiçou todo o capital de simpatia que os EUA recolheram no 11 de Setembro. Tal coktail de inabilidade, falta de visão e incúria é quase uma proeza.

Bush terá sido também o maior alvo de sátiras nos últimos anos. Mas a sátira, quando exagerada, acaba por se tornar tão ridícula quanto o seu objecto. Nisto se inclui a plataforma Bush Bye Bye Party. Se a ideia, abstractamente colocada, tinha a sua piada, com alguns spots imaginativos (como a festinha do casal chinês, humor negro corrosivo), já as mil e tal festas sugeridas, devidamente localizadas e realizadas um pouco por todo o mundo caiem na mesma patetice que se vê em Bush. Se há uma organização global para comemorar por toda a parte a saída (anunciada) do último inquilino da Casa Branca, então que se fará quando um Mugabe, um Kim il Sung (e respectiva prole) e Than Shwe caírem do poder?
Agradecimentos

...pelos seus amáveis e lisonjeiros posts, ao Combustões, Estado Sentido e Corcunda. E a descoberta coincidência de A Ágora ser apenas um dia mais velha que o Nova Floresta, também de parabéns.

terça-feira, janeiro 20, 2009

Desaparecimentos precoces

No mesmo fim de semana, desapareceram Tereza Coelho, aos 49 anos, e João Aguardela, aos 39. A primeira era crítica literária, editora da D. Quixote e ex-directora da revista Os Meus Livros (ouvi falar dela pela primeira vez aí), e creio eu, da Ler. O segundo era um nome importante da música modernaportuguesa, patrono da fusão entre pop e o folclore popular, nos Sitiados, Megafone (o mais intrigante e mais etno-eléctrico)e, ultimamente, em A Naifa. Idades curtas demais para quem podia ainda dar tanto às letras e aos sons portugueses

Sitiados: Outro Parvo no meu Lugar

A fulanização do PP

 

Não percebi lá muito bem as mais-valias que Paulo Portas trouxe de um congresso em que foi o "Rei-Sol" quase sem oposição. Houve-a, muito tímida e frouxa, para que as moções ganhadoras não tivessem percentagens kimilsungescas, e nada mais. Se ao menos Nobre Guedes lá tivesse ido sempre se discutiria alguma coisa; já nem falo dos grandes embates Monteiro vs Basílio vs Lobo Xavier, em 92, Portas vs Nogueira Pinto em 98, ou Portas vs monteiro em 2002, salvo erro, em que nem faltou uma cena de pugilato entre Avelino Ferreira Torres e um dos seus odiados "copos de leite". Mas esta reunião nacional serviu, talvez, para ganhar alguma notoriedade nos media, mostrar a unidade da "família centrista" e reintronizar Portas e o seu discurso costumeiro.

Olhando para as sondagens, é possível que o PP, em eleições nacionais, se aguente nas urnas, com resultados pouco diferentes dos dos últimos actos. Mas a sangria constante de militantes, como o deputado José Paulo Carvalho e algumas dezenas de Bragança, mostram um partido cada vez mais exíguo. Ao contrário do que dizem os seus admiradores, Portas já não tem a frescura de outrora, já não é o factor novidade, pese o seu carisma. Em vez de aguentar a sua "travessia no deserto", em 2005, não aguentou e voltou a tomar o partido de assalto na primeira oportunidade. É, como disse (numa das raras vezes que acertou) José António Saraiva, um "lobo solitário", que faz várias sortidas sem acumular poder. E os resultados locais comprovam-no. Escrevia há dias Carlos Manuel Castro na Câmara de Comuns: Adelino Amaro da Costa dizia que o Poder Local estava para o CDS como os sindicatos para o PCP. Se o PCP ainda hoje controla muitos sindicatos, o CDS está a definhar no Poder Local. Nada mais certo. O CDS teve uma base municipal com algum peso, detendo capitais de distrito como Aveiro, Bragança, Viseu e Leiria, e outras autarquias importantes, como Paredes, São João da Madeira, Cascais, Esposende, Póvoa de Varzim e Mirandela. Hoje resta-lhe uma, o eterno bastião de Ponte de Lima, e é parte de algumas coligações relevantes, como no Porto. Dificilmente aumentará esse número. Diz-se que poderá coligar-se com Santana Lopes em Lisboa. Se assim for, poderá ser um suporte importante para o "Menino Guerreiro", e assim disfarçar os resultados humilhantes de 2007, consequências da saída intempestiva de Nogueira Pinto. Mas será apenas e só mais uma tábua de salvação para um partido que se fulanizou, que descurou as bases e que se centralizou à volta de uma mesma personagem, que, ironia do destino, cada vez mais se confunde com a sigla.

sábado, janeiro 17, 2009

Cinco anos

Já ando nisto dos blogues há cinco anos. Lembrei-me ontem, ao fim da tarde, mas não pude postar nada depois. Confirmei aqui, já que tinha ligeiras dúvidas. Fica então a nota de que A Ágora já tem cinco anos. Parece-me assinalável, com a blogoesfera sempre em constante mutação. Mas fico a sentir-me com um marido que se esqueceu da data de aniversário de casamento. Há que mostrar arrependimento e dedicação. Espero que este meu espaço não amue.

sexta-feira, janeiro 16, 2009

Mais um orgulho luso
O que eu sei é que o tal fotógrafo oficial de Obama que é "luso-descendente" esteve uma vez nos Açores, há vinte anos, o que só por si lhe deve dar uma Portugalidade danada. Um bocadinho mais do que Craig Mello, prémio Nobel da Medicina em 2006, e bisneto de um açoriano, que aquando do anúncio do galardão foi amplamente noticiado pela imprensa nacional, como se de um novo Egas Moniz se tratasse e os genes lusitanos tivessem tido o seu quinhão de contribuição para o seu trabalho. o problema é que, como apressadamente disse a um microfone entre as dezenas que o entrevistavam, não tinha tido ainda oportunidade de visitar as ilhas. Desilusão. Mas haja esperança. Por enquanto, sabemos que as fotos oficiais da Casa Branca passam pelo compatriota Pete Souza.

quarta-feira, janeiro 14, 2009

Olha que surpresa
Quando de manhã ouvi na rádio as palavras do Cardeal Patriarca de Lisboa sobre as relações dos cristãos com os muçulmanos, vi logo que ia dar estrondo. Não me enganei. Aqui e ali os remoques esperados, com as habituais críticas sempre que um responsável da Igreja fala de um assunto que não tem a ver com a caridade nem os mais desfavorecidos. As declarações podem ser ligeiramente polémicas, mas apenas e só um ponto de partida para o debate (o Sheik David Mounir reservou a resposta para mais tarde); além disso, no mesmo discurso, D. José Policarpo, fala da necessidade de compreender o que é o Islão e a sua compreensão de vida. A parte mais "religiosamente incorrecta" sobressaiu, e é ver nas caixas de comentários alusões à Inquisição que "matou milhões de pessoas" (só se se multiplicar ao quadrado) e a "mentalidade medieval" destas palavras, ao passo que o Cardeal é apelidado de nazi, fundamentalista, que devia ser preso e censurado, etc.
Decididamente, os tempos estão maus, ou chatos, para os católicos (como já se tinha previsto) e bons para minorias religiosas, mesmo que não sejam tidas nem achadas, como agora. O pior é se essas minorias se tornam maiorias. E assim acabam as civilizações.
Ps1: o Arrastão publicou cinco (!) posts sobre esta "polémica". Fico à espera de uns quantos quando houver mais notícias de homossexuais condenados à morte no Irão ou de mulheres condenadas à lapidação na Nigéria. Apesar de tudo, ficou aquém do número de postagens do Avenida Central sobre o Benfica-Braga: seis.
Ps2: ver o este texto no Estado Sentido, e este outro, que recorda um filme, Not Without my Dughter/Rapto em Teerão, baseado num caso real.

terça-feira, janeiro 13, 2009

Nem tudo funciona mal em Portugal

A lamúria nacional atinge todos os sectores da nossa sociedade, quer seja na política, na cultura, na famosa "mentalidade", no desporto (ver posta anterior) e nos serviços públicos na sua generalidade. Nestes últimos, costuma-se criticar amiúde a educação, a justiça, a segurança e a saúde. Se nos três primeiros até concordo com muita coisa - e por alguma razão coloquei a justiça em primeiro lugar, que me parece a mais vilipendiada - já na saúde vejo um bota-abaixismo de proporções exageradas. O nosso sistema, com base no estado social nascido em 76, mas já com antecedentes importantes no marcelismo e herdeiro das misericórdias, não é perfeito, como nenhum é. Há por vezes falhas graves do pessoal médico, insuficiência de meios de transporte e de pessoal, cortes sem fundamento nos orçamentos, problemas que atingem sobretudo o interior e as povoações mais isoladas, como se vê pela demora em criar os Serviços de Urgência Básica (SUBs) por esse país fora.


Contudo, ao lermos nos fóruns e espaços de comentários que abundam sobre todos os assuntos, encontra-se sempre a mesma coisa. "a saúde é uma vergonha", "O governo tem de ir para a rua", "isto nos países civilizados não acontece", etc. A comparação é sempre feita ao nível dos tais "países civilizados", como se ali jorrasse mel e os hospitais funcionassem de forma perfeita, o atendimento fosse perfeito e os doentes ficassem todos em quartos individuais com cama de dossel, flores na mesinha de cabeceira e ecrã plasma com leitor de DVDs.
Quem passou pelos estabelecimentos de saúde "lá de fora" desejou voltar a Portugal o mais rápido possível. Em crónicas recentes directamente escritas do hospital onde estava, Miguel Esteves Cardoso perguntava-se onde é que os hospitais ingleses eram melhores que os portugueses (recordar que o Reino Unido foi pioneiro num sistema de saúde público). As filas de espera na Grã-Bretanha e em França conseguem piores que as nossas. Nos Estados Unidos, conhecidos meus tiveram o desprazer de terem de se deslocar a um hospital público americano, de onde saíram horrorizados; recorreram a um privado, e mais horrorizados ficaram com os custos. E na Noruega, sei igualmente de quem teve experiências traumáticas em Hospitais, a nível do atendimento e de administração de medicamentos e injecções.
No último fim de semana a minha Avó teve de ser hospitalizada no Hospital Distrital de Vila Real, com problemas respiratórios. Nas primeiras horas havia alguma angústia pelo que estaria a passar, e que tivesse de passar a noite no corredor, esquecida numa qualquer maca, dada a enorme afluência de gente neste tempo gelado. Com a neve e o gelo a cortar as estradas, era praticamente impossível chegar à cidade por estrada. Mas com um simples telefonema, soube-se que estava numa enfermaria, devidamente tratada, como andava o respectivo estado de saúde e quais os sintomas. tudo isso em dois minutos. No dia seguinte conseguimos mesmo falar pelo telefone, e pela voz parecia-me satisfeita. Finalmente, quando as estradas abriram de novo, pôde-se lá ir e comprovar o tratamento cuidadoso e a boa organização que nos tinha permitido ficar informados quase de imediato, sem qualquer traço de negligência nem de impaciência.


Tudo isto num hospital distrital do interior, num fim de semana mais frio do ano, com os acessos bloqueados pela neve, e com uma afluência monstra às urgências. Não constituiu, para mim, uma revelação, antes uma confirmação daquilo a que já tinha podido assistir: que o sistema de saúde português é bom, muito melhor do que o que se diz na rua e na net, apesar das falhas e das negligências que por vezes ocorrem, e já ficou, creio, classificado em 12º a nível mundial. E quando recorrei aos hospitais, tive de esperar bastante tempo por se tratar de casos de pouca monta, enquanto que as prioridades passavam à frente. Por isso, quando vejo as tais comparações que nos rebaixam perante "os países civilizados", rio-me ou passo à frente, na impossibilidade de responder à retórica dos engraçadinhos. Fico com a certeza de que tais pessoas nada, ou muito residualmente, conhecem dessas tais "civilizações", e que se há alguma coisa em que Portugal está cá para baixo, é no amor-próprio.
Escândalos oportunos


A euforia durou pouco, e o Benfica já está de novo em primeiro lugar, depois de uma vitória sofrida contra o Braga. Como já se ouviu enormemente, o resultado é contestável por erros de arbitragem, como o facto de no único golo do jogo David Luís estar em fora de jogo, e de haver um penalty não assinalado contra o Braga. O problema é que, como sempre, os prejudicados resolvem utilizar isto como se fosse o apocalipse do futebol. Uso o "como sempre" porque parece que o escândalo só existe nos jogos contra o Benfica, como ficou patenteado naquele senhor do Estrela da Amadora - sim, esse que não paga salários aos jogadores - quando num penalty mal assinalado contra o seu clube, ameaçou "deixar o futebol". Em todos os outros jogos, a coisa assume menores proporções, ou por subserviência, ou por cumplicidades várias, ou então porque não os incomoda tanto. Quando o SLB é ocasionalmente mais bem tratado pela arbitragem do que aquilo que merecia, é isto. E isto são os protestos violentos de António Salvador e as acusações de Mesquita Machado, esse dinossauro apegado como uma lapa à presidência da câmara de Braga, esse protector da promiscuidade entre a autarquia e o futebol, responsável pela onda de betão que assolou a cidade dos arcebispos, para quem, nas suas palavras,



Mais cómico mesmo é ver alguns blogues "de referência", como este, para quem o mesmo Mesquita Machado é o inimigo público nº 1, mas cujas declarações subterrâneas dá razão porque «soube defender os interesses de uma cidade e de uma região que tem sido trucidada, no futebol e no resto, pelos interesses dos poderes instalado» Mais abaixo lê-se: «Roubo! Benfica e Sporting continuam levados ao colo da arbitragem». A ideia está à vista, e explica-se pelo facto de António Salvador ser um confesso portista (ao falar do árbitro, chamou-lhe o "Calabote do Séc. XXI", como não podia deixar de ser) e do Braga ser um lacaio servil do clube que lhe empresta os jogadores. Quanto a Mesquita Machado, que é além do mais é presidente da AG da Federação, em anos e anos no futebol deve ter criado amizades duradouras e proveitosas.


Depois dos jogos em que o Benfica sofreu inúmeros prejuízos, e das queixas dos benfiquistas terem embatido em pesados "deviam era jogar mais", ou "só sabem é chorar reclamar dos árbitros", eis que o país ficou em fúria porque finalmente a situação inverteu-se. Jesualdo, cujo discípulo Bruno Alves continua a exercer à vontade o seu passatempo de partir cabeças adversárias, e os dirigentes do Sporting não deixaram o crédito por mãos alheias e também botaram faladura no caso. Enquanto o Benfica estiver em primeiro, a indignação perdurará. Caso desça para outras posições, tudo ficará na paz do Senhor.

segunda-feira, janeiro 12, 2009

Neve


Sexta e Sábado a frente polar que também arranhou Portugal deixou a sua marca. Há vinte anos que não se via nevar tanto. Ver o Minho urbano coberto de neve é coisa rara. Há dias dizia-me uma amiga de Lamego que na sua cidade era raro nevar, por causa da humidade das barragens. Ei-los servidos com neve que cortou as estradas da região e deixou automobilistas à beira de um ataque de nervos. Trás-os-Montes esteve inacessível, com o corte da A4 desde quase Valongo, e até no Porto se viram uns flocos, coisa que da última vez que passou pela cidade ainda eu andava na escola.

Não apanhei ponta de branco até Sábado, onde ao passar em Valongo ainda se viam camadas nas bermas e nas encostas, onde o sol menos batia. Também ontem, já a noite tinha caído, mas deu para perceber que o cimo da Serra de Aire e Candeeiros estava branco.

Claro que à parte ser muito bonito (e quem sempre viveu em ambientes sem neve no Inverno não pode deixar de ficar encantado), causou engulhos terríveis nas estradas e não só. Tinha uma pessoa próxima no hospital em Vila Real e de forma alguma podia lá chegar. Tios meus demoraram seis horas a atravessar o Marão. Pobres dos motoristas e dos condutores que passaram a noite na estrada. Ficou a beleza da neve, a consolar quem com ela teve problemas. Os outros limitaram-se a sentir o frio. E houve quem juntasse o útil ao agradável. Sorte a deles.

                                           
                                                  Braga

                                        Barcelos, Igreja do Bom Jesus da Cruz. E pensar que em
                                               Julho aguentei aí um calor tórrido e gotejante.

Nota: as imagens de cima são retirados do álbum de fotos do IOL Diário. Aos autores, o meu obrigado e espero que não se importem que eu coloque aqui as suas fotografias.

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Cá está
O prometido é devido: Caminha, vista na primeira hora de 2009. Atrás da árvore distingue-se a velha torre do relógio, re-inaugurada nessa mesma noite, que se tingiu de todas as cores e onde soaram as badaladas da meia-noite.


Pena que não dê para perceber a quantidade de gente que enchia a praça, e que duas horas depois, se dirigiria em peso para a Rua Direita da vila, que começa exactamente na porta da torre, rumo aos muitos pequenos bares que se sucedem dos dois lados da artéria. Pena também que esta fotografia não tenha saído no próprio dia, juntamente com um video dos concertos de Ano Novo de Viena. Mas agora é tarde...
Qual quê! Afinal só passou uma semana. Cá fica então o encerramento do último, dirigido pelo célebre maestro Daniel Barenboim; como sempre, eis a Marcha Radetzky.

terça-feira, janeiro 06, 2009

Ligações

Retribuir o agradecimento ao Pedro Correia, pela sua menção. E avisar que agora escreve também no Delito de Opinião.
Aproveitar a visita a visita ao Corta Fitas, que por sua vez ligam dois interessantes posts de A Terceira Noite, um bom exemplos de que na questão israelo-palestiniana também há esquerda com lucidez e bom senso, e não apenas os tresloucados de braços dado com islamitas ou o Daniel Oliveira, filo-judeu que praticamente atribui todas as culpas a Israel (do outro link, de a Natureza do Mal, falarei depois, noutro post sobre esta situação).
Depois da revista, subsistia o blogue. Agora, também "o" Atlântico se despede e se dispersa. Para que novos rumos é que ainda não se sabe.
Janeiro
Só hoje, dia de Reis, é que A Ágora se estreia em 2009. Queria começar com a postagem duma foto tirada na minha passagem de ano, em Caminha, mas ficará para os próximos dias. E antes de tudo, um desejo de bom ano a quem mo desejou, no post anterior.


A coisa começa tremida: previsões económicas más (Sócrates já admite um ano de recessão), o Benfica a estrear-se com uma derrota no galinheiro do último classificado (Trofense), a incursão militar israelita em Gaza com evidentes estragos, e os histerismos da praxe que isso sempre provoca, etc. O Público volta com ligeiras alterações, uma das quais um texto diário de Miguel Esteves Cardoso. E o Inverno vai apertar esta semana, com um frio polar que nos vai fazer tirar dos armários as peliças, as samarras, os capotes e os gorros. Escusado falar dos cachecóis e echarpes, que isso são peças que agora se usam o ano inteiro. Que saudades da tepidez do "Reveillon".


Ah, e o Natal acaba hoje, e com ele as iluminações, prova acabada e inilidível do início de novo ano.