sexta-feira, maio 30, 2008

Russos e ingleses

Por muito que se fale em Cristiano Ronaldo e na sua participação (decisiva) na conquista da Liga dos Campeões pelo Manchester, as vitórias nas competições europeias deste ano ficam inegavelmente ligadas a dois países: Reino Unido e Rússia. As escolhas dos recintos das finais e o simples engenho encarregou-se de cruzar estes estados que até andam de candeias às avessas que se devem a casos de espionagem - em especial o do envenenamento de Litvinenko - que se esperam entre duas potências com ambições internacionais.
Na Taça UEFA, no estádio do Manchester City, o surpreendente Zenit S. Petersburgo venceu sem discussão o Glasgow Rangers. Os jogadores da sumptuosa cidade dos czares não deixaram o crédito de golear o Bayern por mãos alheias e não deram hipóteses aos proletários da industrial Glasgow Leais à Rainha.
O Manchester United, como se sabe, e num encontro de craques, teve a sorte dos penaltis no escorregadio relvado de Moscovo contra o Chelsea de Avram Grant e levou a sua terceira Taça dos Campeões.
Méritos à parte, constata-se que os russos foram ganhar a Inglaterra a uma equipa britânica (escocesa pró-Inglaterra); e duas equipas inglesas foram medir forças em Moscovo, tendo uma delas por sinal um presidente russo. O que tira todas as dúvidas sobre quais as nações dominantes do futebol europeu este ano - sim, os russos também o foram (e merecem parabéns pela decoração do estádio e pelo logótipo da final).
Tudo isto para dizer o seguinte: a Supertaça europeia deste ano vai valer a pena. Bom seria que mudassem para um estádio mais majestoso do que o acanhado Louis II do Mónaco.

quarta-feira, maio 28, 2008

Linha do Tua ameaçada
Já há muito que devia ter postado isto, mas mais vale tarde do que nunca. Está online uma petição para impedir a destruição da histórica linha do Tua, uma das últimas de Trás-os-Montes, coisa que acontecerá se a barragem projectada para a zona, com uma cota planeada, for avante. É o próprio Douro, como património da humanidade, que se encontra em perigo.
Fica este aviso telegráfico, mas voltarei a este assunto brevemente e com mais pormenores.

terça-feira, maio 27, 2008

A faraónica sede da Caixa


Uma das evidências do que falei no post dos bancos e urbanismo é a sede da CGD, em Lisboa. Tive oportunidade, há pouco tempo, de observar mais atentamente o ciclópico edifício entre o Campo Pequeno, o Arco do Cego e a Avenida de Roma. Da autoria do Arquitecto Arsénio Cordeiro, e terminado em 1993, é um expoente do novo-riquismo Cavaquista da altura, bem expresso noutros sinais exteriores de "riqueza" (contemporâneo da CGD são o CCB e a Torre do Tombo, do mesmo autor). Quem der alguns passos ao lado da construção não pode deixar de ficar espantado com as suas dimensões hiperbólicas, o comprimento desmesurado, o volume esmagador, recordando as obras totalitárias da URSS, da Itália de Mussolini e da Roménia de Ceausescu, e que certamente seria do agrado de Duarte Pacheco. Aliás, outra comparação pode ser feita com as loucuras romenas: o edifício, aquando do início da sua utilização para que aí funcionassem todos os serviços centrais da Caixa, estava subocupado, tal como ainda acontece com o "Palácio do Povo" de Bucareste. De forma a explorar melhor toda aquela massa enorme e conseguir alguma rentabilidade, Rui Vilar criou a Culturgest, uma empresa de gestão de espaços culturais dependente do banco, da qual ressalta o grande auditório, com 700 lugares. Foi a solução encontrada para de alguma forma humanizar aquele elefante branco, meio soviético, meio neoclássico, com entradas formadas por uma espécie de cúpulas em estilo neobizantino fashion (quanto é que essas cúpulas não terão custado, Deus meu!), que esmaga e domina toda a área vizinha. O bairro do Arco do Cego fica ali todo acanhado. Meia Avenida João XXI pertence-lhe. E a praça de touros do Campo Pequeno perde o protagonismo de zona que lhe caberia. Em suma, toda uma vasta área pertence ao monolito cor de creme.


A sede da CGD podia até ser parecida com a actual, mas em dimensões mais suaves e diminutas, (e sem as horríveis cúpulas). Não seria difícil juntar os serviços centrais e a Culturgest numa obra um tudo de nada mais modesta. Mas não. Tinha de ser em grande, como qualquer obra de relevo em Portugal. Os nossos governantes, especialmente os que têm a tutela das obras públicas, e os gestores de empresas estatais julgam-se certamente reencarnações dos faraós. Mas a sede do maior banco português não é apenas um monumento visível ao desperdício de fundos (pelas empresas públicas) ou um dos maiores edifícios comerciais da Europa: é também mais um exemplo de como os bancos alteram e dominam o skyline de uma cidade, ou parte dela, e de como o simbolismo do seu poder se torna tão incomodamente concreto e visível.

sábado, maio 24, 2008

Pequenos ódios

Respondendo ao desafio do Samuel Paiva Pires, do Estado Sentido, aqui deixo seis coisas pelas quais não nutro grande afeição:
- Deitar-me e levantar-me cedo (esta deve ser a mais respondida)
- Risinhos parvos, altos e indiscretos
- Arquitectura de tijoleira de casa de banho e vidros fumados, que depois dos subúrbios atacam indisfarçadamente as cidades
- Esta atmosfera climatérica chata, nublada mas sem realmente chover (especialmente quando o sol devia rondar)
- Salada avinagrada, tomate, pepino e queijo, "alimentos" que me despertam a mais viva repugnância
- Para finalizar, um sentimento: a mentira descarada e consciente

sexta-feira, maio 23, 2008

Lucas Pires

Nos dez anos da morte de Francisco Lucas Pires, não há melhor homenagem do que relembrar o blogue com o seu nome, administrado pelos seus 4 filhos, com alguns dos textos que escreveu.

quinta-feira, maio 22, 2008

Nas asas das Águias - o êxodo dos judeus iemenitas

Ao ler este post de A. Teixeira publicado no Herdeiro de Aécio sobre as tribos israelitas e as migrações de judeus provenientes da África ou de outros territórios do Médio Oriente, lembrei-me do caso particular dos judeus iemenitas.

Perdidos na colónia britânica do Iémen, no canto sudoeste da Arábia, a velha comunidade judia, ali existente desde tempos imemoriais, encontrava-se na sua grande maioria na zona de Aden, o maior porto da região. Com a proclamação do Estado de Israel (de que se comemoraram há dias sessenta anos), a maioria muçulmana iniciou com um processo de hostilização e de agressões aos judeus, que envolveu incêndios a casas e armazéns e algumas dezenas de mortes. Tendo também notícias da criação do novo estado hebraico, os judeus resolveram então fazer o seu Êxodo e rumar a Israel. Como viviam praticamente na Idade Média, sem quaisquer meios motorizados (só havia um automóvel em Aden) ou telecomunicações, formaram uma extensa caravana, de contornos bíblicos, disposta a atravessar os desertos das Arábias, que muito surpreendeu as autoridades britânicas colocadas na ainda colónia.

Quando souberam da intenção de tal façanha, os israelitas resolveram formar uma ponte aérea para trazer todos os que quisessem ir para a "terra prometida". Assim, recorrendo a aviões americanos e britânicos, realizaram várias centenas de voos no espaço de ano e meio, transportando quase 50 mil pessoas, entre as quais se contavam igualmente alguns judeus da Etiópia. Os voos eram secretos, para impedir eventuais sabotagens árabes e garantir a segurança dos refugiados.

Todo este esforço ficou conhecido como Operação Tapete Mágico, ou Operação nas Asas das Águias. Se a primeira se percebe bem, a segunda precisa de uma explicação: no seu primitivismo, os judeus iemenitas não conheciam o avião, e ficaram naturalmente atemorizados com a perspectiva de voar naquelas máquinas enormes e brilhantes. Todavia, os seus sacerdotes encorajaram-nos a embarcar, dizendo que era apenas o cumprimento das profecias bíblicas, segundo as quais alcançariam a Terra Prometida montados nas asas de águias (em Êxodo 19:4 e Isaías 40:31). As águias em questão eram DC 3 americanos. Ainda que amedrontados, ficaram convencidos e deixaram que a sua fé os levasse de avião para Israel, adaptando-se rapidamente ao novo meio de transporte. Cumpria-se assim a profecia e chegaram novas levas de judeus a Israel, originários do sul da Arábia.
O que é que a EXPO comemorava mesmo?

Tendo em conta que passam hoje dez anos que abriu a EXPO 98, só estranho que ao anunciar isso ninguém se tenha lembrado do óbvio: que faz 510 anos que Vasco da Gama arribou a Calecute, culminando assim a primeira viagem marítima da Europa à Índia.

segunda-feira, maio 19, 2008

Os bancos, inimigos das cidades?
Tornou-se um lugar comum dizer que o capitalismo de hoje em dia é financeiro e especulativo, e não produtivo; que os bancos ganham lucros fabulosos por via dessa especulação; ou que a dada altura começaram a abrir agências bancárias como cogumelos.

Só que muitas vezes os lugares-comuns são a representação fiel da realidade, e os casos de cima seguem essa mesma regra. O capitalismo é muito mais especulativo, como se pode ver por estas subidas vertiginosas dos preços do petróleo e de bens alimentares, ou por alguns estranhos humores da bolsa. Poucas esquinas haverá sem a sua pequena agência bancária, anunciando as melhores taxas do mercado.

Essa mudança dos padrões económicos manifestou-se em diversas áreas, entre as quais uma certa imagem das cidades. Quem estiver atento verificará que os bancos, tirando as suas sedes históricas, funcionam normalmente em prédios modernos, sobretudo em mamarrachos revestidos a vidros fumados, castanhos ou pretos, construídos nos lugares onde antes havia edifícios da Belle Époque. Em Lisboa, nas Avenidas Novas, há inúmeros exemplos disso. Muitas vezes entalam-se entre pequenas pérolas arquitectónicas de há várias décadas, seriamente ameaçadas de demolição. Noutros casos, descaracterizam-se gravemente os edifícios. O exemplo que me vem à cabeça é o do Palácio Atlântico, no Porto, na Praça D. João I, outrora um dos mais elevados prédios do país, em belo mármore castanho, e hoje coberto por placas de cor creme. Felizmente, restaram as pinturas do pórtico e da entrada.
Depois, há os casos bem conhecidos de cafés de renome, palcos de tertúlias, discussões ou longos almoços de cavaqueira das "elites" locais, com as compridas salas de bilhar e vidraças para as movimentadas ruas da respectiva localidade, que ao longo do tempo foram desaparecendo para dar origem a mais uma agência com as tabuletas rosa, laranja, verde e todas as outras cores de que as instituições de crédito se quiseram munir para criar um efeito visual mais poderoso mas nem por isso mais atractivo. Tantas são que poder-se-ia atribuir a cada um dos principais partidos portugueses um banco diferente: ao PS caberia o BCP (na prática não anda muito longe disso), ao PSD o BPI, o PCP ver-se-ia convertido à classe dos capitalistas financeiros com o Santander Totta, o CDS arrebataria a estatal CGD, Os Verdes ficariam com o BES, e, tendo em conta o novo lilás que o BANIF adoptou, deixar-se-ia o banco madeirense aos cuidados do BE (além de que o Centauro que faz parte do novo símbolo é uma minoria que urge proteger).
Dessa poluição visual não sofrerá A Brasileira do Porto, se se tiver em conta as promessas de Artur Santos Silva. O edifício onde funciona o histórico café pertence ao BPI, e os actuais locatários, incluindo o Café di Roma, têm ordem de saída, apenas adiada por interposição de uma acção de suspensão. Seja como for, e mesmo crendo na palavra de Santos Silva, é um bom exemplo de como os bancos modelam, controlam e gerem as mudanças da vida urbana, condicionando as suas instituições e até o seu modelo de urbanismo. Estranhamente, o crescimento das agências é inversamente proporcional ao do número de bancos, com todas as fusões e aquisições que se verificaram nos últimos anos (apesar da entrada de bancos estrangeiros), que deram origem aos grupos actuais. Mas não haja dúvida: os letreiros berrantes são mesmo mais numerosos e ocuparam o seu próprio espaço, seja em blocos espelhados e desenhados à pressa, seja em edifícios de traça mais clássica que em tempos albergaram outras instituições, menos dadas a créditos e débitos, mas com outra relevância cívica e social. Era bom que pensássemos mais nisso ao dar de caras com mais um inestético anúncio bancário, ente mais uma dúzia num raio de 50 metros.
As previsões de Marcelo

Marcelo Rebelo de Sousa disse, nas suas habituais homilias dominicais nocturnas, que percebeu enfim que "Luís Filipe Menezes é emocionalmente instável". Que clarividência! Tantas previsões falhou que agora só se atreve a dizer o que toda a gente já está farta de saber fazendo isso passar por análises para o futuro.

quarta-feira, maio 14, 2008

Há meio século, o Porto aclamou Humberto Delgado

Este mês de Maio é mesmo a época de todas as efemérides, comemorações e aniversários. algumas sem grande importância, outras que merecem ser recordadas. É o caso do dia de hoje, quando passam 50 anos da maior manifestação política a que o Porto já assistiu: a chegada de Humberto Delgado, em plena campanha eleitoral.

O "General sem Medo", que dias antes atirara com o famoso "Salazar? Obviamente, demito-o" que tantas preocupações provocara no seio da União Nacional e da candidatura de Américo Tomás, candidatava-se com o apoio de quase toda a oposição política, numa lista de apoiantes que juntava nomes tão díspares como António Sérgio, Rolão Preto e Aquilino Ribeiro. Iniciou uma campanha "à americana" (Delgado era aliás um entusiasta da NATO e dos EUA), sempre em carros descapotáveis e com enormes comícios onde quer que fosse. O de Chaves, por exemplo, ficou famoso. Em quase todas as localidades, com pontuais excepções, era recebido com os eufóricos brados de "Humberto, Humberto". Até dada altura, os líderes da União Nacional, i.e. é, do próprio regime, pouco se importaram. Mas quando Delgado chegou de Foguete ao Porto, eram milhares e milhares os que os aguardavam em frente a S. Bento, enchendo toda a Baixa da cidade. O general teve de prescindir do seu carro para atravessar aquele mar de gente até à sede da sua candidatura, em Carlos Alberto, onde pela primeira vez falou à multidão entusiasmada. Houve também um comício que transbordou de emoção no Coliseu, e outras acções de campanha, que verdadeiramente atingiu a apoteose no Porto. As autoridades, até aí serenamente vigilantes, ficaram apreensivas. O Ministro do Interior, Trigo de Negreiros, em completo desespero, deu ordens ao Governo Civil para parar com as manifestações de apoio ao General, nem que fosse com recurso a disparos sobre a multidão; do Porto, obviamente, recusaram-se a cumprir qualquer ordem, recordando ao ministro os avisos que recebera.


O Estado Novo aprendeu aí a lição, e dias depois, em Lisboa varreu todos os que estavam no exterior do liceu Camões e que não puderam entrar para assistir ao comício. A contrapropaganda e as proibições para "manter a ordem" fizeram a sua aparição. Nas eleições propriamente ditas teve lugar a monumental fraude que é conhecida, com urnas trocadas, pides a votarem várias vezes numa "eleição divertida" e, em certas localidades, Tomaz obteve mais votos do que os inscritos, assegurando assim a sua escolha. Humberto exilou-se no Brasil e encontraria a morte às mãos da PIDE num caso ainda difícil de deslindar. Um erro crasso da parte dos seus mentores. O Estado Novo, que até 58 nunca tivera grande oposição nem preocupações internas de maior, sofreu um enorme abalo com a candidatura de Delgado, a que se lhe juntou a sua morte e a guerra em África. A recepção no Porto foi talvez a maior e mais visível demonstração desse abalo inicial, que tornaria Humberto Delgado, porventura com algum exagero, num herói nacional, e cujo nome passaria a figurar no cimo da Avenida dos Aliados, recordando esse 14 de Maio em que o repetiram em altos brados, como nunca se ouvira antes.

terça-feira, maio 13, 2008

Um dos maiores


Além do Boavista, outras tristezas há, como ficar em quarto lugar (esse sim, seria o lugar natural dos do Bessa). Mas despedida do Maestro Rui costa provocou uma comoção e um afluxo de público como este ano não se tinha visto na Luz - além de uma vitória segura. Precisámos de chegar à última jornada para isso. Mas sobraram apenas a homenagem e o orgulho, como deve ser próprio de um grande clube. Rui saiu em festa aplaudido pelos seus, como estava escrito. Vestirá outras roupagens doravante. E eu poderei um dia dizer que não faltei, que estive lá, a assistir ao último passe de grande classe de um dos maiores jogadores portugueses de sempre.

domingo, maio 11, 2008

A desgraça do Boavista
A decisão da Comissão Disciplinar da Liga acabou por ser arrasadora para o Boavista: a descida de divisão. Depois de todos os problemas financeiros, ameaças de rescisão e de insolvência, épocas sem ir à UEFA e Sérgios Silvas, só faltava esta machadada, a anteceder a inevitável pázada de terra que provavelmente será o destino dos axadrezados. Sem meios para acudir às suas inúmeras dívidas, o clube, se os eventuais recursos nada alterarem, tem o destino traçado, graças às manigâncias dos Loureiros.


Um cenário em que o xadrez se torna apenas negro e que me entristece muito. Cresci com a convicção de que o Boavista era o quarto grande, e por influência de familiares e amigos ganhei apreço pelo clube, aliás perto da minha casa. Aprendi a jogar lá ténis e refiz-me sócio anos mais tarde, quando pela primeira vez a armada do Bessa jogou na Liga dos Campeões (estreando-se com um embaraçoso 0-3 em casa, frente ao Rosemborg). Vi jogos memoráveis, uns contra a equipa da casa, em que o meu Benfica venceu categoricamente, e outros apoiando os do Bessa. Lembro com saudade os jogos contra o Sporting em 96, que ditaram a saída de Queirós, em 97, na meia final da Taça, em em 2001, o jogo chave do título desse ano; contra o Porto, em especial em Janeiro de 2001, no dia em que se inaugurava a Capital Europeia da Cultura, em que o Boavista ganhou o primeiro lugar que não mais largaria; exibições fantásticas contra o Borussia de Dortmund, o Kiev, o Hertha de Berlim, o golão do meio do campo de Mário Silva ao Feyeenord, o enorme roubo frente à Roma, o massacre do Manchester United e a desilusão com o Celtic, nas meias finais da UEFA. E o jogo com o Aves, em que o Boavista se sagrou campeão e desfilou avenida abaixo, em que o público invadiu o relvado, boavisteiros e não só, abraçando-se, levando pedacinhos de relva, festejando efusivamente um campeão novo em folha.

Também me lembro do velho Bessa, do pião, do Topo Sul onde ficavam os Panteras Negras, das bancadas laterais com telhado de zinco, por cima da qual, no prédio atrás do Dallas se viam alguns mirones, ou por onde fugiam algumas bolas mais altas. E da construção gradual do novo estádio, o primeiro a ser começado e o último a ser inaugurado, com um jogo contra o Málaga, ou do Jogo das Estrelas, de Figo, Zidane, Schumaker e companhia, numa bancada ainda sem cadeiras.


Tudo isso me enche de saudade das noites e tardes do Bessa. Revolta-me o laxismo de vários anos, o chico-espertismo do Major, que continua impune, a hipocrisia e parcialidade de Nuno Cardoso, que deu dezenas de milhões de Euros ao Porto e uma migalha aos axadrezados para a construção dos respectivos estádios, a ingenuidade a roçar a estupidez dos dirigentes actuais quando um qualquer Sérgio Silva acenou com cheques de brincar, e os pesos e medidas diferentes para os castigos aplicados.


A possível descida de divisão do clube ainda é o menos: com algumas ajudas financeiras, seria apenas algum tempo no inferno, antes de regressar à divisão maior. O problema são as ciclópicas dívidas e a falta de investidores de peso que ajudem a aliviá-las. Da CMP nada virá, já que o boavisteiro Rui Rio não está para aí virado. Os salário em atraso (alguns funcionários não recebem há coisa de um ano!), as dívidas a outros clubes, ao fisco e à segurança porão provavelmente um cheque mate ao Boavista tal como o conhecemos. A SAD declarará falência, o clube fará ligeiras alterações da sigla e terá de recomeçar do zero, das distritais. Com a popularidade que apesar de tudo conserva, galgará em poucos anos os diversos escalões nacionais, tal como teve de fazer nos anos sessenta, em que andou pela terceira aos chutos no pelado campo do Bessa, onde toda a vida jogou. Voltará ao escalão maior e à Europa do futebol, recuperar as memórias das equipas das "camisolas esquisitas" que chegaram a provocar espanto e temor nas competições da UEFA.
A voz de Humberto
Hoje ouço pela primeira vez a voz do General no programa que está a passar na RTP1 da autoria de Lauro António.Uma voz gravada e desvanecida pela técnica do tempo mas ainda solta e determinada.De quem sabia o que queria.Como teria sido Portugal caso Salazar fosse demitido na altura?

Boa pergunta. Será mais uma razão para um conjunto de "What if"? No que toca à Guerra do Ultramar, em especial, pergunto-me como é que o Presidente do Conselho nomeado por Delgado reagiria.

Também nunca tinha ouvido as palavras do "General Sem Medo". Aquelas que foram reveladas, pronunciadas num comício em Chaves durante a campanha de 58, eram firmes, tronitruantes, e sobretudo iradas, muito iradas.

quarta-feira, maio 07, 2008

O futebol precisa de dinheiro, não é?
O Trofense subiu e vai-se estrear na primeira divisão de futebol. Seguir-se-lhe-à o Rio Ave, clube de Vila do Conde que dista uns 15 quilómetros da Trofa, ou o Vizela. O quarto classificado, o Gil Vicente, já não tem hipóteses.
O que é que estes 4 clubes têm em comum? Ficam todos na região entre Ave e Cávado, que já tem o Vitória de Guimarães e o Braga na primeira divisão e o Varzim e Desportivo das Aves na divisão de Honra, além do quarteto referido. O que eu gostava de saber é como é que uma das regiões económica e socialmente mais deprimidas do país, que assiste a uma crise aguda da sua indústria e implora pela ajuda do Governo e dos empresários, tem meios para colocar tanto clube de futebol nos escalões profissionais. O dinheiro falta num lado mas aparece noutro.

segunda-feira, maio 05, 2008

A Tragédia da Superga

 
Maio parece ser o mês de todas as efemérides. Algumas há que são mais facilmente recordadas, sejam mais recentes (o desaparecimento de Maddie, por exemplo), ou menos (o Maio de 68). Mas hoje vi no jornal um acontecimento que, embora algo esquecido, comoveu a Europa da altura do pós-guerra.

Aqui há tempos falei do desastre aéreo de Munique que vitimou parte da equipa do Manchester United, em 1958. Mas anos antes tinha havido um ainda pior. Em 1949, a fabulosa equipa do Torino veio a Portugal para um jogo particular com o Benfica, como convidado para a homenagem ao jogador Francisco Ferreira. Os rivais da Juventus tinham na altura a melhor equipa italiana, comandada pelo atacante Valentino Mazzola, muitos dos quais internacionais da Squadra Azurra, e estavam quase a atingir o quarto scudetto consecutivo. No regresso a Turim, depois de jogarem com o Benfica, o avião onde seguiam envolveu-se no nevoeiro, e quando tentava descer para recuperar visibilidade, com deficiente apoio radiofónico, bateu violentamente contra a Basílica da Superga, numa colina perto de Turim. Todos os que seguiam a bordo do avião pereceram.
O acidente provocou viva comoção em Itália e por toda a Europa. Em Portugal, onde os jogadores do Grande Torino tinham realizado a sua última partida, milhares de pessoas acorreram à Embaixada Italiana, na zona do Paço da Rainha, em Lisboa, para assinar o livro de condolências, como atesta o recente livro de fotos dos anos 50 da autoria de Joaquim Vieira. Nas quatro jornadas finais do campeonato italiano, o Torino lançou os jovens da sua formação. Todos os outros clubes os imitaram, e os turinenses venceram o campeonato. Só seriam novamente campeões nos anos setenta, altura em que também ganharam uma Taça UEFA. Depois disso, alternariam subidas e descidas na Série-A. Nunca mais surgiu uma equipa do Torino como aquela dos anos quarenta. O filho de Mazzola, Sandro, tornar-se-ia ele próprio um craque, mas pelo Inter de Milão. A tragédia da Superga seria um choque terrível para o futebol italiano e para o clube que continua, apesar das adversidades, a ser mais popular na sua cidade do que a poderosa Juventus, sua adversária eterna no Derby della Mole.