terça-feira, junho 30, 2015

Um fim de semana com duas desgraças

 
Fim de semana para cima e para baixo, cansativo, enervante, apenas atenuado por um bom e velho jantar em casa de amigos, neste início de Verão. Mas além de tudo, notícias negras relacionadas com senhoras respeitáveis.
No sábado, já sabia da notícia do internamento de Maria Barroso, mas não imaginava a gravidade. Vi então que tinha dado uma queda, e depois de observações inconsequentes no hospital, uma hemorragia deixá-la-ia em estado crítico, até ao dia em que escrevo. Vi essa notícia precisamente num tasco da rua em que mora, ao Campo Grande. Minutos depois, sob um sol abrasador, passava na entrada do prédio onde imaginei que morasse, e decorridos segundos, reparei que saía de lá João Soares, cabisbaixo, provavelmente depois de visitar o pai. Não pude deixar de sentir pena por aquela família que de repente fica privada da sua matriarca. Tanto se tem falado de quão caído e envelhecido está Mário Soares, e afinal de contas pode sobreviver a Maria Barroso. Resta saber se conseguirá durante muito tempo.
Por essa altura também já sabia do terrível atentado em Sousse, na Tunísia, onde um psicopata sob mando do chamado "Estado Islâmico" baleou todos os que encontrou na praia, matando dezenas de turistas. Entre elas, estava a senhora portuguesa que lá tinha ido recordar outras visitas ao país. A notícia e os pormenores já impressionavam e emocionavam, mas à noite soube por um amigo de quem se tratava e cheguei à conclusão de que eu próprio a conhecera em tempos, salvo erro na feira de Vila Real, que era amiga da minha família e que costumava andar pelos mesmos circuitos, entre o Porto e Trás os Montes. Aliás, um jantar em casa de primos vilarealenses ficou cancelado por serem bastante próximos de Glorinha, como era conhecido por todos. Custa a crer como é que pessoas que conhecemos desses meios e locais, que parecem tão longínquos em tudo dos horrores da maior praga da actualidade, e que não tinham o menor envolvimento com questões religiosas ou políticas, possam ser vítimas dessa violência diabólica. O que só prova a globalidade e a proximidade dessa ameaça. O terrorismo dos jiadistas atingiu-nos agora, ainda que fora de Portugal, na pessoa de Glorinha, que desgraçadamente acreditou como tantos outros que na Tunísia podia fazer umas férias tranquilas.

segunda-feira, junho 22, 2015

Maus da fita



Há muito que o papel de mau da fita é particularmente apreciado (e desejado) no cinema. Distingue-se sempre pela complexidade da composição, pela personagem cativante ou sinistra, pelo interesse criado no espectador, em contraste com um vago tédio que as personagens "boas" causam. E não faltam intérpretes que se especializaram nos papéis dos maus da fita.


Estou-me a lembrar assim de repente de John Malkovitch (do Valmont de Ligações Perigosas até Con Air vai uma lista interessante), Alan Rickman, Kevin Bacon ou James Woods, isto para nos cingirmos à cinematografia mais visível de Hollywood.


Na semana passada desapareceram dois nomes que honravam a nobre arte do vilão cinematográfico.

Nuno Melo tinha uma carreira que passou pelo teatro e pela TV, por programas cómicos do Herman e por diversas sitcoms e novelas. Também se distinguiu no cinema, sobretudo em filmes de Edgar Pêra, e muito particularmente em O Barão, adaptação do conto de Branquinho da Fonseca graças ao qual ganhou o prémio da Sociedade Portuguesa de Autores. Aí, num filme a preto e branco carregado de sombras, surgia como uma personagem autoritária, ameaçadora, vampírica, um tirano que nas suas terras de atrás do sol posto (no caso, o Barroso) vergava pelo medo que inspirava todos os que o rodeavam.
Nuno Melo passou por muitos outros papeis, tanto de "vilão" como de comédia. Ainda há uns meses, num casamento memorável, discutia a carreira do actor com a Joana, sua filha, sem sabermos que já cá não estaria menos de um ano depois. As pessoas reconhecem-nos de outros trabalhos, mas se há interpretação que ficará na história, será sem dúvida a do Barão.

Ainda mais vampírica e ligada a papeis de mau da fita é a carreira de Christopher Lee. Aliás, ele era o protótipo do actor que é reconhecido como um eterno vilão, embora na realidade fosse muito popular. Drácula, Frankentsein, Múmia, vilão de James Bond (Scaramanga, o Homem da Pistola Dourada), criado pelo seu primo Ian Fleming, Jedi caído no "lado negro" em A Guerra das Estrelas, participante frequente nos bizarros filmes de Tim Burton, Saruman, o feiticeiro negro das adaptações cinematográficas de Tolkien, papel mais recente que lhe trouxe nova notoriedade...Recentemente vimo-lo num dos últimos filmes de Scorcese, Hugo, e em Comboio Nocturno para Lisboa, em que representava um padre português. Para além disso, teve uma vida digna da sua carreira cinematográfica: descendente de aristocratas italianos e cantores líricos, primo de Ian Fleming, viveu em França e na Suíça na adolescência, combateu na II Guerra em África, sobretudo na Líbia e esteve na invasão aliada a Itália, assistindo à terrível batalha de Monte Cassino. Só depois é que se dedicaria à carreira de actor. Pelo meio, conheceu algumas personagens que mais tarde representaria. Era mesmo o único actor de O Senhor dos Anéis e O Hobbit que tinha conhecido pessoalmente o autor das obras, J.R. Tolkien. E já com certa idade ainda participou e até editou em nome próprio discos de heavy metal, com registos de ópera pelo meio. Uma vida preenchidíssima, que merecia uma biografia, e não apenas para os apreciadores do sedutor e carismático papel de mau da fita.

terça-feira, junho 16, 2015

Com o nome da águia


Rui Vitória chegou finalmente ao Benfica. O treinador que eu quis para o clube chega dois anos depois, com a pesada tarefa de substituir Jorge Jesus. Não é só esta missão, já de si dificílima, que cabe à equipa técnica chefiada por Vitória. É não deixar cair o ciclo de vitórias que deram dois campeonatos consecutivos (e mais alguns títulos) ao Benfica, vencer a aposta na formação, conseguir substituir jogadores tão importantes como Salvio, numa primeira fase, e provavelmente Gaitan e Maxi, além de uma média de idades respeitável, melhorar as prestações na Liga dos Campeões, etc. Mas apesar de tudo, confio no novo treinador. Espero não me enganar, já que os meus desejos normalmente são gorados e os meus pessimismos normalmente transformam-se em boas surpresas. Mas aprecio o percurso estruturado ascendente de Rui Vitória, a sua capacidade de com pouco fazer muito, a sua serenidade e a sua convicção, bem visível não seu discurso de apresentação. Agora precisa de dar confiança aos adeptos, conhecer e motivar a equipa, e claro, guiá-la fazendo jus ao seu apelido.

quarta-feira, junho 10, 2015

O best of de 1995



Uma publicação inglesa já o tinha referido, mas o Sapo voltou a recordá-lo: em 1995, ou seja, há vinte anos, saía cá para fora uma chusma de discos do mais reluzente e intenso pop/rock (ou pope-roque, como diria a Amor Fúria) de que há memória. Havia rock sonoro com as vocalistas femininas dos Garbage e No Doubt, a trip hop dos Massive Attack, o punk-anos-noventa dos Green Day, os mega-êxitos de Alanis Morrisete, o inigualável, inqualificável e colossal Mellon Collie and the Infinite Sadness, dos Smashing Pumpkins, o início a sério dos Radiohead e de PJ Harvey, e a grande declaração de guerra da Britpop, The Great Escape dos Blur contra o icónico (What’s the Story) Morning Glory dos Oasis, com o superlativo Different Class, dos Pulp, a servir de terceira via, e os Elastica a ver se lhes caía alguma coisa.
Para ser perfeito, só faltavam os REM, por essa altura a debater-se com problemas de saúde dos seus membros que os impediram de se estrear nesse ano em Portugal, e vá lá, os U2, em década experimental, os James, ainda no auge da popularidade, e os Suede e Cure, também entre álbuns. Ainda de 1995, a lista do SAPO omitiu alguns álbuns de músicos como Morrissey, Red Hot Chili Peppers e Morphine, talvez por só poder escolher vinte nomes e esses não serem exactamente os pontos altos das carreiras dos seus autores. Ainda assim, uma indigestão de boa música pop/rock dos anos noventa. Daquela que já não se produz, como dizem os nostálgicos e os que não se conformam com a época em que vivem.


PS: em Julho, num dos incontáveis festivais que há por aí, neste caso o Super-Bock Super Rock, que também ele faz vinte anos, conseguiram atraír ao mesmo tempo os Blur e Noel Galhagger (isto é, metade dos ex-Oasis). Será um festival de saudades, para gente grande, que provável e infelizmente não terá provocações nem luta corpo a corpo.




domingo, junho 07, 2015

A saída de Jesus



Alguns dias depois do rebentamento da "bomba" e dos efeitos do choque inicial, acho que já se pode opinar com alguma propriedade sobre o caso da transferência de Jorge Jesus.

No início, chocou-me que o homem que tinha assumido a missão de conduzir o Benfica nos últimos anos saísse assim de chofre para o principal rival local. Depois, vindas à superfície as histórias sobre o seu pai e o desejo de o ver a treinar o Sporting, as ligações do passado, o contrato no fim e a vontade de Luís Filipe vieira em mudar a política desportiva e financeira do clube, apostando mais na formação e reduzindo gastos, percebi-o, apesar da mágoa. E por fim, quando soube os contornos das negociações, a vontade de que JJ fosse para o estrangeiro, as tentativas de Vieira em contactá-lo com ideia de manter o salário, e o acordo que Jesus estabeleceu com o Sporting antes de qualquer resposta ao presidente do Benfica, voltei a rogar-lhe pragas: o homem que quando perdeu tudo para o Benfica tinha recebido a confiança do seu presidente contra a opinião de tudo e todos (incluindo a minha, claro), e que além do mais fora remunerado como nenhum outro em Portugal e a quem tinham dado condições excepcionais, traiu a confiança desse mesmo presidente pela calada, sem dizer água vai. Se tivesse anunciado que tinha resolvido aceitar o convite do Sporting antes de passar as coisas para o papel, compreendia-se, apesar de tudo. Assim, a única coisa que fica é uma "facada" nas costas ao homem que o tinha defendido e lhe proporcionou tudo o que ele pediu.


A partida pode fazer rir muita gente e levar outros tantos a dizer que "Bruno de Carvalho vibrou o golpe do século ao Benfica". Também Sousa Cintra tinha feito o mesmo no Verão quente de 1993, lembram-se? De um golpe, levou Paulo Sousa e Pacheco e quase fazia o mesmo a outros como João Pinto. Ao Benfica, já em tremenda crise financeira, previa-se a catástrofe. Ao Sporting, a glória. E afinal, a catástrofe cairia em cima destes últimos com a goleada tremendíssima que sofreram em casa, no mais decisivo dos derbys, com João Pinto como pesadelo máximo dos sportinguistas e a entrar na história do Benfica (e do jornalismo desportivo, porque A Bola, excepcionalmente, deu-lhe nota 10). Curioso notar que o Benfica começaria o seu período negro meses depois ao trocar Toni por Artur Jorge, também considerado "o mais conceituado" técnico português de então. Viu-se.



Tenho as maiores dúvidas que Jesus consiga no Sporting os êxitos que obteve no Benfica. Parece que já todos esqueceram os fracassos, particularmente entre 2010 e 2013, a incapacidade de passar mais do que uma vez em quatro a fase de grupos da Liga dos Campeões, a quantidade de jogadores que teve ao seu dispor e os que passaram sem deixar rasto. Como se o treinador, sozinho, fosse o responsável único por tudo o que de bom aconteceu ao Benfica na última meia dúzia de anos. Depois, a personalidade ditatorialzinha do inenarrável Bruno de Carvalho deixa muito a desejar naquilo que serão as relações com Jesus. Quase que dá para rir imaginar um diálogo (ou uma discussão) entre os dois. Acresce que, sabe-se agora, em caso de despedimento o Sporting terá de pagar integralmente o salário a Jesus. Estarão os grupos suportados por Álvaro Sobrinho e pela Guiné Equatorial dispostos a tanto? E a financiar novas aquisições do Sporting, que com a saída de Nani, bem precisará delas?


Do despedimento de Marco Silva e da respectiva "justa causa", já quase tudo se disse. Uma atitude rasteira, ridiculamente argumentada (aquela de não usar o fato oficial do Sporting com os patrocínios só mesmo para crédulos ou gente sem coluna vertebral), típica de Bruno de Carvalho, que aliás, ainda há meses desmentia toda e qualquer conflito com o treinador e dizia o pior possível de Jorge Jesus.


Do novo treinador no Benfica, há muitos que querem Marco Silva e poucos a quererem o mais provável Rui Vitória. Pertenço a essa minoria, como deixei vincado há dois anos, e parece-me que o ainda técnico do Vitória de Guimarães não vai deixar o Benfica mal servido (para quem acha que não tem "currículo", sugiro que vá ver o de Jesus antes de chegar à Luz). O único receio é que Marco Silva vá parar ao Porto, onde teria inegável êxito. O que eu desejo é sucesso ao próximo treinador do Benfica. Quanto a Jesus, espero que no dia 9 de Agosto comece a sofrer na pele a sua mudança. Desejo que ganhe talvez uma Taça de Portugal, para não ficar assim tão abaixo de Marco Silva, e voltar a homenagear a sua família. E tão só. A sua passagem pelo Benfica é agora passado. E para os que queriam que fosse o Fergusson do Benfica, olhem para o que tem sido a vida do Manchester United desde que o treinador escocês deixou uma vazio difícil de preencher nos mancunians. Provavelmente seria mesma a altura certa para Jesus sair.


Ps: seja como for, aquela ideia de tirar já a imagem de Jorge Jesus do resto da equipa, na megastore do Benfica, parece-me muito infeliz. Não será exactamente estalinismo, mas...

quarta-feira, junho 03, 2015

O mosaico de Bilbao



Voltando ao tema da bola, e acabadas as provas nacionais ( com o Benfica a ganhar a costumeira taça da Liga frente a um Marítimo raçudo, talvez até demais, voltando a ser o detentor do maior número de troféus em Portugal, e os "lagartos" a arrebatar já no fim a Taça de Portugal a um Braga que se acomodou cedo demais, e que por isso mesmo não a merecia levar), ainda temos a final da Liga dos Campeões no sábado, para desgosto de quem tenha bilhete para o Primavera Sound no mesmo dia para ver espectáculos as mesmas horas. Mas entretanto houve mais algumas decisões, como a da Taça do Rei.

O resultado em si não interessa, já que o Barcelona de Messi jogava em casa e venceu um Athletic de Bilbao que teve uma época uns furos abaixo do que se previa e que tarda em regressar aos títulos (desde os anos oitenta). E também pouco interessa aquele triste momento em que tocou o hino espanhol, e em que o Rei assomou à tribuna, e que pôs muitos catalães e biscainhos a apupar ambos. É o que dá realizar uma final de taça de Espanha com a chancela real num estádio composto em grande parte por independentistas (e se o são, porque é que aceitaram que a final fosse ali?). Mas gostei de ver o imenso mosaico que os adeptos do Athletic compuseram no Nou Camp. Sim, os culés também, mas estavam em casa, são milhões, têm mais adeptos, etc. É absolutamente admirável como é que uma cidade de 300 mil habitantes, com raivais nas proximidades, como a Real Sociedad, leva dezenas de milhares de fãs e consegue fazer um mosaico impressionante formando as cores do clube e do País Basco, com o símbolo e nome do clube e palavras de incentivo pelo meio. O Athletic, além de se manter fiel à tradição de só jogar com bascos, continua a ser um clube incrível, como incrível é o seu novo estádio. O Vitória de Guimarães e o Braga bem podiam olhar para aqui e fazer as devidas comparações.







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