sábado, dezembro 31, 2016

Adeus a 2016


E já agora, ficam os desejos de bom ano a todos. Não considero que 2016 tenha sido um ano especialmente bom (e algumas das suas consequências virão já em 2017), mas teve alguns momentos inesquecíveis. e claro, consegui escrever mais posts do que em 2015. Que 2017 seja um ano melhor, ou que pelo menos traga alguns momentos de grandeza idêntica como os que vivemos neste quente Verão de 2016.




Bom ano a todos.

2017, um ano arrasador para realizadores de cinema


Nas habituais revistas do ano, é sempre exibida a necrologia. Este ano, como era de esperar, ressalta o desaparecimento de músicos de vulto, como David Bowie, Prince, Leonard Cohen, e agora, já no dia de Natal, para o qual ironicamente tinha escrito uma celebérrima e orelhudíssima música, George Michael, de quem nunca fui especialmente fã mas que era sem qualquer dúvida um músico talentoso e inteligente. E ainda poderíamos acrescentar Pierre Boulez ou mesmo o Coro do Exército Vermelho, desparecido na sua maioria há dias num desastre de aviação no Mar Negro, e a quem referi aqui precisamente no último dia de 2014.

Mas se na música tivemos um ano negro, o cinema não tem menos razões de queixa. Talvez tenha passado mais despercebido, mas a quantidade de realizadores que morreu em 2016 é considerável. Assim, lembro-me de Michel Cimino, Abbas Kiarostami, Jacques Rivette, Hector Babenco, Curtis Hanson,  e até Gary Marshall (o realizador de Pretty Women). E nestes últimos dias, desapareceu Carrie Fisher seguida da sua mãe, Debby Reynolds.

Torçamos para que 2017, em termos cinematográficos, seja melhor. E noutras áreas também. Para começar, já aí está o último do bom e velho Kusturica, com a presença suplementar e sempre apreciada da nóvel cidadã lisboeta Monica Bellucci. Já é um bom começo.


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A praga das virtudes privadas


Entre o Natal (que espero que tenha sido bom para todos os leitores) e o Ano Novo, os "acontecimentos do ano" substituem as notícias. são um autêntico maná para muita comunicação social, porque permite algum descanso: não é preciso estar-se atento a todas as notícias e manchetes, basta ir-se fazendo uma síntese do ano que acaba nas suas várias dimensões. Se o trabalho de casa for feito ao longo dos meses, nem será um período muito trabalhoso.

Mas a verdade é que o país abranda mas não para. E assim temos também os habituais faits-divers da terra. Esta semana, tivemos as frases de Augusto Santos Silva numa confraternização do PS, comentando com Vieira da Silva, em tom jocoso, que o acordo de concertação social para o aumento do salário mínimo "parecia uma feira de gado". Bastou um jornalista mais manhoso (e ainda por cima o inefável Moura-Pinto) e um microfone suficientemente perto para a notícia ecoar e estalar a "polémica", onde não faltou até quem pedisse a demissão do ministro. Que não teve lugar, claro, mas qua ainda assim não escapou a um pedido de desculpas. E para efeitos de comparação, a situação é bem diferente da de João Soares, que proferiu as suas ameaças para todos os que o pudessem ler.

Uma das praga dos nossos dias é esta constante intromissão no que as pessoas dizem ou deixam de dizer ou de pensar fora do âmbito dos seus cargos públicos. Com a tecnologia e as redes sociais, ninguém está a salvo. E temos uma opinião pública muito pouco esclarecida, que cada vez mais confunde o público com o privado. A influência desta lamentável confusão é, muito provavelmente, fruto da cultura protestante anglo-saxónica (e não só: não é por acaso que os programas como o Big Brother nasceram na Holanda), e do seu puritanismo avassalador, procurando sempre os pecadilhos da vida privada. Vê-se no Reino Unido, com a imprensa tabloide e as revistas de mexericos, mas sobretudo nos Estados Unidos e a devassa total com laivos de moralismo exacerbado (quem não se lembra da perseguição enxovalhante a Bill Clinton em finais dos anos noventa?). Uma coisa que até há pouco tempo não tínhamos por cá. Mas com o telelixo, as redes sociais mais as suas frases "indignadas" e mal escritas de gente que acredita mais em sites manhosos de teorias da conspiração e uma espécie de moralismo para quem é indiferente o aborto mas que fica em brasa com piadas entre amigos, ninguém mais está seguro. O cúmulo aconteceu há pouco tempo, quando um qualquer grupo LGBT espanhol quis uma investigação para saber se um jogador do Atlético de Madrid tinha chamado "maricas" a Cristiano Ronaldo num habitual bate-boca a maio do jogo.
 
Bom seria que a próxima vítima apanhada numa fala mais politicamente incorrecta num momento privado e que seja apanhado por um qualquer microfone indiscreto admitisse não só o que disse, mas o reafirmasse a se recusasse a pedir desculpas. Só assim se pode travar esta mania sufocante, sinistra, da confusão entre vida privada e pública. Que em 2017 haja muitas reacções assim.

quinta-feira, dezembro 22, 2016

Bisalhães, Património Cultural da Humanidade


Sabiam que os barros negros de Bisalhães, arredores de Vila Real, são desde há dias Património da Humanidade, classificação da UNESCO? A notícia passou algo despercebida, mas é verdade. Esta louça transmontana, que data de há séculos e que hoje em dia tem apenas meia dúzia de artesãos envelhecidos, que vendem a sua arte à entrada da cidade, tem agora estatuto de Património cultural da Humanidade e goza de maior protecção, nomeadamente de incentivos e formação na arte (embora a verdadeira instrução passe de pai para filho, ou de mestre para aprendiz). As noites de S. Pedro vão poder continuar a exibir a feira dos pucarinhos, com a louça negra a bordejar o largo da barroca Capela Nova. Pode parecer exagerado tanto património mundial, o que a prazo levará a um igualitarismo inconsequente, mas a verdade é que este país não é só fado, cante ou chocalhos.

sexta-feira, dezembro 16, 2016

Recordações e curiosidades dos mancusianos em Portugal

A recordação de concertos dos Pixies e Cure levou-me um que vi dos James, há dois anos, por esta altura, no pavilhão multiusos de Guimarães, por ocasião do início das festas Nicolinas. Não era a primeira vez que os via, não achei que tivesse sido o melhor concerto da minha vida, embora o público tivesse enchido o recinto, mas teve a sua piada. Não tanto, provavelmente, como o outro que tinha havido na véspera, em que a banda inglesa, muito habituada a vir a Portugal (e que até tem elementos a viver cá na terra), tinha dado em pleno átrio da estação S. Bento

Os James, de Manchester, são uma banda com mais de trinta anos e com uma discografia de respeito. Nos seus primórdios, Morrissey disse serem o melhor grupo do Mundo, mas ficaram aquém do que valiam. Talvez por serem perseguidos por duas estranhas maldições: uma é a de que (defendiam eles) os títulos dos álbuns se reflectiam na vida da banda, pelo que decidiram fazer um chamado Millionaires (embora as vendas nem tivessem sido nada do outro mundo). A outra é a de que alguns grupos que fizeram as primeiras partes dos seus concertos acabariam por se tornar maiores do que os James. A lista é elucidativa: Nirvana, Radiohead, Coldplay, Stone Roses (aqui a "grandeza" de um grupo que só lançou dois álbuns é mais duvidosa)...Não sei se houve outros, mas os exemplos atrás mencionados parecem confirmá-lo. Assim, se algum grupo quiser alcançar a fama e a glória, é fazer as primeiras partes dos James, já que as probabilidades de êxito são grandes, mesmo nestes tempos de desmaterialização e "partilha" (o roubo) de música, em que já não se vendem milhões de CDs.

Em todo o caso, honra aos James, que continuam a lançar discos com regularidade, contra ventos e marés. Fiquem com um pequeno excerto do concerto que deram no átrio de S. Bento, entre azulejos que contam a história de Portugal e uma pequena multidão em delírio.

terça-feira, dezembro 13, 2016

Guterres na ONU


A 1 de Janeiro começarão os seus trabalhos na ONU. Mas aposto que esperava um mundo ligeiramente melhor quando se dispor a candidatar-se ao cargo de Secretário-Geral. E daí, talvez não: quem lidou com refugiados durante estes anos de chumbo talvez soubesse ao que vinha. Seja como for, não lhe gabo a sorte. Só lhe desejo as maiores felicidades.
 
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segunda-feira, dezembro 12, 2016

Pós-derby


E pronto, o fantástico JJ  lá voltou a perder na Luz (já não acontecia aí desde 2012). Até acho que o resultado mais justo depois de um jogo tão intenso seria um 2-2, com as diversas oportunidades do Sporting e o retraimento do Benfica, mas tudo o que enterre os planos do inenarrável Bruno de Carvalho merece a minha concordância.

Entretanto, parece que anda tudo furibundo com a arbitragem porque ficou um penalty (há quem diga dois) por assinalar contra o Benfica. Pois ficou, mas no ano passado, nos TRÊS jogos em que o Sporting nos venceu, ficaram sempre outros tantos por marcar a favor do Benfica (num deles até partiram o braço ao Luisão). Não se lembram? É natural, não andamos a choramingar esses erros pelo campeonato fora. Mas quando algo do género acontece ao Sporting, é um sem fi de acusações, recriminações, queixas e comunicados.

A vitória recoloca o Benfica a distância segura na frente e redime a semana anterior, ainda que o nível exibicional precise de melhorar - rodando mais a equipa com jogadores que precisam de ritmo, por exemplo. Já o Sporting, pelo contrário, teve a sua semana horribilis: saída definitiva das competições europeias, arquivamento pela UEFA da queixa dos vouchers contra o Benfica, derrota no derby, e até a equipa B perdeu contra a do Porto. Não admira: o Natal está quase aí. E há certas tradições que dificilmente mudam.


Ah, e há outras coisas que merecem ser vistas. As bancadas também o outro espectáculo, fora do relvado. É também disto que os clubes constroem a sua mística.

domingo, dezembro 11, 2016

Derby

 
Diz a vox populi,, não sei baseado em que mito futebolístico, que ganha o derby entre Benfica e Sporting a equipa que estiver pior. É difícil dizer qual das duas está em pior forma: depois de duas derrotas seguidas, uma num terreno onde normalmente vence e outra em casa, com uma boa mas não fantástica equipa, mostrando debilidades defensivas preocupantes, o Benfica apanha o Sporting numa altura delicada. Mas o adversário também deixa dúvidas: derrotado na Polónia pela pior defesa da Liga dos Campeões, arredado das competições europeias (de propósito?), e desgastado por uma noite no frio de Varsóvia e menos um dia de descanso que o Benfica, o Sporting também não está numa forma invejável. Por isso, qualquer previsão é temerária. Só desejo que Rui Vitória troque Luisão por Lisandro e Salvio por Rafa (ou Carrillo, que pode estar com pica por defrontar a antiga entidade patronal), para que as probabilidades de as coisas correrem melhor aumentarem. O resto é esperar que seja um bom e empolgante jogo, e que Bruno de Carvalho não fique satisfeito.  
 
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terça-feira, dezembro 06, 2016

Barafunda política à italiana


A política italiana é, decididamente, cada vez mais confusa. Não que alguma vez tenha sido simples, à imagem do povo que a encarna. Mas pelo menos até ao início dos anos noventa sabíamos mais ou menos dividir os grupos partidários: ao centro, e sempre no governo, a Democracia-Cristã, apoiada pelos liberais, republicanos, sociais-democratas, e a partir de certa altura, os socialistas. À esquerda, o grande opositor era o PCI. À direita, os neofascistas do MSI, e, durante um tempo, o partido monárquico do armador e sindaco de Nápoles Achille Lauro.

Por 1993, a 1ª República italiana deu origem à segunda, e a velha partidocracia desabou, dando origem a novas formações. O PCI já se tinha convertido nos Democratas de Esquerda, de ideologia social-democrata, ocupando o lugar do PSI (que acabou), e agrupando formações centristas, enquanto que a facção comunista constituía a Refundação. A DC e restantes satélites pulverizaram-se, dando origem à Forza Italia, de Berlusconi, que pulou dos negócios e do futebol para a política, ao Partito Popolare, tentativa de reconstituição do partido com o mesmo nome anterior ao fascismo, e a mais uns quantos partidos menores, ao passo que o MSI seguiu um caminho semelhante ao do PCI, transformando-se em Aliança Nacional e trocando o neofascismo pelo conservadorismo, antes de se aliar a Berlusconi e formar o Povo da Liberdade. A Liga Norte de Bossi, xenófoba e regionalista, cresceu e juntou-se também a Berlusconi. E mais uns partidos, listas e coligações quantos que mudavam de dois em dois anos.

Se esta situação já era confusa, então agora ainda mais. Os Democratas de Esquerda uniram-se com ex-democratas cristãos para constituírem o actual e maioritário Partito Democratico, que depois de várias lideranças colocou o promissor e desejado Matteo Renzi no comando. Berlusconi acabou com o Povo da Liberdade para ressuscitar a Forza Itália, ao passo que outros criaram o Novo Centro-Direita que está próximo dos Democratas. Formações esquecidas foram sendo recauchutadas, e no meio disto tudo, irrompeu o inclassificável, ultra-populista e abrangente Movimento Cinco Estrelas, do já famoso Beppe Grillo, que em 2014 ficou em segundo lugar nas eleições parlamentares, e cujas ragazze conseguiram conquistar os municípios de Turim e de Roma.

Agora, com a recusa por larga margem do referendo constitucional apresentado por Matteo Renzi que, entre outras coisas, permitiria que os governos ganhassem nova solidez e novos poderes e maior suporte no parlamento, aliviando a sua normal curta duração, a situação mais confusa fica,. Renzi conseguiu governar durante mais de dois anos e implantou algumas reformas, bateu o pé tanto quanto pôde a Bruxelas e mostrou que também entre os partidos do centro é possível uma liderança carismática, reformista e inovadora. Mas apostou tudo no acto eleitoral, personalizou demasiado o seu mandato, e conseguiu virar contra si uma coligação negativa unindo o Beppo Grillo, Berlusconi, a Liga Norte, a extrema direita, a esquerda radical e até vários sectores tradicionais do seu partido. Dir-se-ia que 90% dos políticos italianos ou são maquiavéis ou são palhaços. Mussolini tinha um pouco dos dois, como Berlusconi. Poucas são as excepções, mas por vezes lá surge um estadista que realmente obtém resultados, como De Gasperi, ainda que postumamente, mas que conseguiu um país próspero, pacífico e unido, ou outros que foram impedidos, como Moro.
Renzi, que ainda pode chegar a esse patamar, perdeu e afastou-se do governo, deixando a Itália com os seus velhos problemas políticos, uma economia anémica e um sector bancário quase na ruína. Não haverá eleições para já, mas se Renzi, que conta apenas 41 anos nm país em que a classe política se arrasta normalmente até aos noventa, não se afastar da liderança do partido, poderá voltar com renovada força e quebrar a dos adversários, já que Berlusconi, com 80 anos, não é eterno e Grillo já terá perdido o efeito surpresa. Até lá, resta esperar que a banca não desabe.

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domingo, dezembro 04, 2016

O Bloco e a birrinha anti-monárquica


Aquela atitude imatura e parvinha dos tipos do BE não se levantarem com o Rei de Espanha presente no Parlamento (em contraste com os do PCP, que não aplaudiram mas se levantaram) recordou-me a homenagem feita às vítimas do regicídio, cem anos depois, a 1 de Fevereiro de 2008, no Terreiro do Paço. Estava presente uma multidão ainda numerosa, quando já para o fim surge, e pára a uma distância ainda "segura", uma trupe de mascarados com uma faixa que dizia em letras garrafais mais ou menos isto: "viva o Buiça, viva o Costa" (apelidos dos regicidas), enquanto iam gritando vivas aos mesmos. Ficaram ali uns minutos a guinchar, sempre de máscara, e quando sentiram demasiados olhares a virar-se para eles, bateram em retirada, espalhando panfletos com slogans anarquistas, ou coisa vagamente parecida. Mas na tal faixa grande que levavam à frente notavam-se ainda inscrições de uma qualquer campanha do Bloco, com símbolo e tudo. E certamente que o folclórico grupo de entusiastas dos regicidas não o encontrou no lixo. Aliás, entre os tipos que regularmente fazem uma romagem ao cemitério para homenagear os ditos assassinos, conta se o major Tomé, antigo líder da UDP e um dos fundadores do BE. Donde o antimonarquismo do Bloco, que incluiu louvores aos regicidas, já vem de longe, e portanto não será de ficar muito admirado com parvoíces no hemiciclo. Até porque, recordemos, há ali afinidades grandes com o Podemos, que não hesita em suspirar por esses "belos" tempos dos anos 30 e da efémera república espanhola, que tão bons resultados trouxe, e que o deputado Soeiro não deixou de relembrar.
 
No fundo, é uma velha tradição que o Bloco se esforça por proteger. O que não deixa de ser paradoxal, num movimento que se diz tão anti-tradicional.
 
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