terça-feira, novembro 30, 2004

Poesia na biblioteca

A apresentação das escolhas poéticas de Mário Soares, Freitas do Amaral, Miguel Veiga e Urbano Tavares Rodrigues (este ausente, quem sabe se para Almada), patrocinadas pelo Público, decorreu (na Biblioteca Almeida Garrett) num ambiente sem grandes multidões a acotovelar-se, ou jornalistas de microfone em riste procurando a última opinião política dos intervinientes. Não. Houve os discursos da praxe, uma peroração necessária, a declamação de alguns poemas por Alberto Serra e a costumeira sessão de autógrafos. Soares mais humorísitico, Veiga mais autêntico, Freitas mais emocionado (talvez a minha intervenção peferida), revelaram-nos as suas mais queridas recordações poéticas. Algumas eram belíssimas, mas causa-me estranheza que certas pessoas, mesmo antes de as ouvir, já se manifestem horrorizadas por apenas pertencerem áquelas personagens. Que as odeiem deliberadamente, é lá com eles, mas deixem a sensibilidade dos outros em paz.

segunda-feira, novembro 29, 2004

O governo, depois da saída de Henrique Chaves - e sobretudo, pelas razões apresentadas - podia tentar controlar o défice recorrendo a apostas; vai ou não durar até ao Natal? É até um favor que fazia aos portugueses: melhorava as receitas e ia gozar uma merecida reforma.
Lokomotiv

Ainda falando de futebol, o Sporting goleou o outrora temerário Dínamo de Tbilissi. O clube, representante do deprimido futebol georgiano, ostenta um nome muito comum em equipas do antigo bloco do leste, nas quais que avultam o já falado Zagreb ou o de Kiev, que continua a impôr respeito por essa Europa fora (agora também com o motivo acrescido do impasse eleitoral ucraniano), ou ainda os Minsk, Moscovo e Bucareste. Em termos de nomenclaturas pós-queda do muro temos também a categoria dos "Estrelas" - mais popularizada nas suas versões jugoslava ("Zvezda", aliada a "Crvena") e romena (Steaua); a dos CSKAs (Moscovo e Sófia), em tom marcial; os mais mecânicos Torpedos, Rotors, o estratosférico Zenit, o siderúrgico "Mettalurgs" ou os pretensiosos Sparta/Spartak. Mas a minha favorita é a classe dos "Lokomotiv". É uma designação poderosa, que nos lembra possantes máquinas rolando orgulhosamente sobre carris moldados no aço forjado do socialismo. Seria talvez esta a imagem que quereriam imprimir ao descuidado adversário, para além, claro, do mero facto destes clubes estarem sempre ligados ás respectivas instituições ferroviárias nacionais. O certo é que a denominação sugere mesmo o poder do vapor e lenha sobre carris - pelo menos a mim.
Lokomotivs há-os de várias proveniências: Moscovo, Plovdiv, Vitebsk, na Bielorrússia, e Tbilissi, cujo estádio é aquele mesmo onde os nossos "Lagartos" obtiveram a retumbante vitória. Tendo já tido momentos de glória, é justo que se diga que os tempos não correm de feição para as já enferrujadas máquinas futebolísticas. A exepção é exactamente o de Moscovo. À sombra das glórias dos seus vizinhos durante o período soviético, o Lokomotiv Moskva está hoje bem oleado, com um título russo conquistado há uma semana e sendo presença regular na Liga dos Campeões. É pois o único representante da classe dos "Lokos", chamemos-lhes assim, que continua a dar cartas por essa Europa - e essas estepes- fora. Quanto aos outros, resta-lhes, pelo menos por ora, manter as suas recordações do período rubro de setenta anos e sonhar com melhores dias, em que enfim os carris se libertarão das ervas ruins que os escondem e as máquinas de aço flamejante voltarão a cruzar as pradarias e os estádios, fazendo ouvir o som dos estridentes apitos e dos seus enrouquecidos adeptos.

sábado, novembro 27, 2004

Goleados na falésia

Tal como o Sporting (e talvez o Porto), o SLB quase garantiu a passagem à fase de eliminatórias da UEFA. Fê-lo sem grandes sustos perante o histórico Dínamo de Zagreb, velha glória da Croácia, mas que aparenta estar longe dos melhores dias. A prova é que tinha acabado de realizar uma "chicotada psicológica" depois de uma copiosa derrota diante do Rijeka, num estádio que, segundo a imprensa desportiva, "se assemelhava ao de Braga". Por causa ficar rodeado de uma superfície rochosa.
Contudo, o tal recinto desportivo fica, em espaço físico, comodidade e beleza, anos-luz atrás do recinto bracarense. O mesmo não se poderá dizer da zona envolvente, em que avulta o azul do Adriático, que mete no bolso qualquer subúrbio da cidade dos Arcebispos. Nem os estádios do Restelo ou Barreiros têm hipóteses. Admire-se, pois.

PS: o sr. Pinto da Costa na semana passada tinha pronunciado a eloquente frase "quem se queixa das arbitragens é porque pretende esconder alguma coisa". Depois da derrota do seu clube frente ao Boavista, o senhor queixou-se das mesmas arbitragens, mas não explicou o que é que escondia (talvez um maço de cigarros para fumar subrepticiamente em recinto público). À partida para Moscovo, e a propósito da visita do Benfica ao Ministro Henrique Chaves, afirmou (ironicamente, dizem alguns) que "iria fazer queixa a Vladimir Putin pelas últimas arbitragens". Só que se esqueceu que o presidente russo encontrava-se não na gelada Moscóvia mas sim na sua tão odiada Lisboa. As piadinhas de Pinto da Costa já não têm a eficácia que tinham antes.
O táxi, o seu líder e as gravatas dele

Vai longa a discussão sobre o artigo de Pedro Mexia no DN, visando o PP (os partido e o seu mentor). A resposta que deu no Fora do Mundo à crítica do Acidental pôs muitos pontos nos is. As consequentes contra-respostas no referido blog deixaram-me algo elucidado. Luciano Amaral deu talvez a melhor delas todas, embora não concorde com parte da crítica que faz a Mexia. José Bourbon Ribeiro esmiúça umas defesas, mais ou menos formais, que acabam por ser mais superficiais do que a superficialidade que diz ser a substância do artigo de Pedro Mexia, acabando por se tornar num óbvio alvo do mesmo (sim, creio que era exactamente a pessoas destas a que o artigo se referia).
Vasco Rato dá igualmente uma resposta em que mostra que não entendeu (ou finge não enentender) o que é o verdadeiro PP actual: um reflexo político do seu líder, um grupo sustentado unicamente por Portas, que sem ele se esboroará inevitavelmente, a não ser que mude radicalmente de figurino...como Mexia prevê, e como refere que a cada novo ciclo aconteceu, para que o partido subsistisse. Raramente um partido se identificou tanto com o seu líder em Portugal - tirando Eanes e o seu PRD. Nunca uma sigla teve tanta razão de ser. Mas deste texto retive outra certeza: politicamente, não há nada que eu tenha em comum com Rato. Aquilo que lhe desgrada no PP (ou seja, a "perspectiva cristã" e a "agenda social") é precisamente o que mais aprecio no partido. Confirma-se assim que Rato é o autêntico "neo-con" lusitano.
E já que se fala no Acidental, aproveito para (mais uma vez) recomendar o post de Rodrigo Moita de Deus, intitulado "Uma pequena teimosia". decididamente, começa-se a tornar num hábito.

PS: até gosto dos fatos de Portas e restantes colaboradores. Que não seja nisso que concordo com Mexia.

quarta-feira, novembro 24, 2004

"Alhadas" no asfalto

Julgava que semelhantes situações só sucediam no cinema. Mas este fim-de-semana pude enfim descobrir que também é possível na vida real. Sobretudo quando o contador vermelho da gasolina está avariado, fazendo crer que ainda não se chegou à reserva. Assim, vi-me (não sozinho, ao menos) parado na berma de uma auto-estrada que nem conhecia, com uma placa indicando o nome da terra onde nos encontrávamos, que, para cúmulo, era um precioso indicador da situação : Alhadas. Mas pude ao menos satisfazer um desejo de infância, ou seja, experimentar um daqueles telefones SOS que comunicam directamente com a BRISA, para dali pedir socorro - e combustível. O que eu não sabia é que o pedido se fazia pressionando um simples botão e esperando a voz metálica da central; sempre pensei que fosse um telefone a sério, com uma despachada telefonista do outro lado. Enfim, sonhos de meninice desfeitos pela dura realidade dos meios de comunicação.
Basta dizer que uma vez atestado o veículo, o nosso destino surgiu à vista duas curvas depois. Ao menos os meus queridos vizinhos axadrezados encarregaram-se de me repôr a boa disposição.

sexta-feira, novembro 19, 2004

O insulto na blogoesfera

A blogoesfera está na realidade a passar por uma fase demasiado insultuosa para o meu gosto, ou de qualquer ser que se preze. Um dos exemplos mais visíveis é de alguns posts mais infelizes do Acidental, que parece atravessar um período mais quezilento e agressivo, o que infelizmente tolda o espírito e retira qualidade a muitos textos que seriam um bom motivo para uma discussão mais séria. Refira-se que quase todos esses posts têm como alvo o Barnabé (a propósito, de que falaria Paulo Pinto de Mascarenhas quando se referiu à "esquerda do acho extraordinário"), numa troca de tiros infantil e maçadora. apropósito, há que dar os parabéns pelo milhão de visitantes do citado blog de esquerda. Pena é que nas suas caixas de comentários continuem a surgir criaturas que, a coberto do anonimato, insultam da pior forma, e sem exprimir qualquer argumento, quem quer que seja que os contrarie. Eu próprio fui aí alvo das injúrias de um qualquer garoto suburbano a coberto de um pseudónimo supostamente nacionalista.
Mas a propósito desta questão dos insultos blogoesféricos (e creio mesmo que por causa de alguns dos casos atrás mencionados) Pedro Mexia escreve um magnífico texto, próprio da referência dos blogs que é, dissecando a questão, dando exemplos e deixando a sua marca moral, camuflada por um ligeiro tom blasé. Um post que devia ser obrigatório para todos os que blogam ou escrevem nas caixas de comentários, sob pena de se ficar sem acesso à net durante seis meses.

Adenda: não se pense que O Acidental está totalmente em pé de guerra; recorda também "coisas boas", como o demonstra o Rodrigo Moita de Deus.

quinta-feira, novembro 18, 2004

Ler as Cartas

Sobre os posts que escrevi acerca do anti-francesismo (um pouco abaixo) leia-se o que Bruno Cardoso Reis, do Cartas de Londres, pensa sobre o mesmo fenómeno (exepto que o nome que dá aqui é o de "francofobia", o que no caso também se adequa). E também a resposta e contra-respostas que dá a Diogo Belford Henriques a propósito da intervenção na Costa do Marfim, entre outras.

quarta-feira, novembro 17, 2004

Responsável: Pinto da Costa

No concurso Quem quer ser Milionário surgiu a pergunta "quem é o actual treinador espanhol do FC Porto"? A concorrente protamente deu a resposta, considerada como certa; não me espantou em demasia, já que as outras hipóteses eram Lili Caneças, Vítor Melícias e outra qualquer figura que não me vem à memória. Só que a resposta dada foi "Luis Fernandez", que como se sabe é um técnico francês, e com quem Pinto da costa confundiu o espanhol Victor, aquando da apresentação deste último. E fica assim resolvido mais um mistério televisivo: o responsável pelas questões do programa do horário nobre da RTP-1 é afinal de contas o presidente portista. Não haverá aqui um problema de incompatibilidades? Ou será que os tentáculos do "Sistema" já atingiram a RTP?

Ps: enfim um artigo de Miguel Sousa Tavares na Bola com o qual concordo em quase tudo.

terça-feira, novembro 16, 2004

Mais pactuantes com o terrorismo

O Irão vai suspender o seu programa de enriquecimento de urânio a partir do próximo dia 22 de Novembro. A Agência Internacional de Energia Atómica recebeu ontem uma notificação oficial de Teerão a confirmar que renuncia a esta técnica, vital para a construção de armas nucleares.

A Alemanha, a França e o Reino Unido tinham negociado há duas semanas com o irão um pacote de incentivos económicos e tecnológicos em troca da suspensão total do enriquecimento do urânio.

E pronto. Os suspeitos do costume a negociar com um elemento do Eixo do Mal. Deviam saber que estas coisas se resolvem com uma boa invasão, jamais com negociações. E nem ao menos tiveram a gentileza de falar primeiro como Presidente Bush!
51º Estado?

Descobri agora que o Valete Fratres! cessou a sua actividade. Devo confessar que o seu fim não me dá especial emoção. O blog auto-intitulava-se "neoliberal" (lá para o fim substituiu essa designação por "defensor da economia de mercado", mas o que fica na memória é mesmo o primeiro nome) e era um claro entusiasta do Sr. W. Bush. Houve também situações que não primaram pela elegância, como quando se referia aos "blogs comunas" sem usar os respectivos links. Era além disso um fervoroso católico, mas de um catolicismo em que não me revejo muito, mais fundado no Catecismo do que nos Evangelhos, no que se baseou, por exemplo, para defender a pena de morte e a "guerra preventiva" contra o Iraque (embora fossem duas matérias que o Compêndio da Doutrina Social da Igreja claramente condenava).
Tudo questões de opção ideológica ou doutrinária (excepto talvez a dos "blogs comunas") que apenas diziam respeito ao autor, embora as constantes copy paste de textos de referência - geralmente em inglês- do Valete o transformassem numa leitura um pouco para o entediante, o que me fez duvidar das suas capacidades de escrita em português (pronto, era apenas uma piada mázinha).
Mas no seu post final, e na frase que definitivamente encerra o blog, o autor (de seu nome João Noronha, se não me engano) deixa um desejo de que "talvez um dia a UE se converta no 51º estado federado...se eles (os americanos) nos aceitarem..."
Arrisco dizer que por trás desta ironia gulosa está um real desejo de se juntar de armas e bagagens aos States, sobretudo agora que George W. Bush ganhou o direito a mais quatro anos de
presidência. Não é o único: outros há que defendem um rumo na esteira das acções da actual Administração norte-americana, embora não exactamente a sua "junção". Mas parece-me que com o "cisma" de valores que tem dividido as duas grandes potências ocidentais, o sonho do "51º estado" é uma hipótese menos que remota. Lamento, meu caro Valete, mas a adopção da pena de morte, das Patriot Acts e do corte de todo e qualquer subsídio estatal não parece ser o futuro da UE. Mas descanse, que ao menos não teremos toda aquela profusão de Igrejas Evangélicas a dizer-nos em quem votar.

segunda-feira, novembro 15, 2004

La fausse colonisation

Noto que, no seguimento do meu último post, as suspeitas que lá descrevi se confirmaram, embora por razões diversas. Diogo Belford Henriques considera que "a França acaba de conquistar uma nova colónia (Costa do Marfim) e um novo protectorado (Palestina)". Querendo a todo o custo justificá-lo, este senhor vem corroborar porque, segundo ele, há palestinianos que dizem coisas como "Os Estados Unidos controlam Israel, mas por Chirac tenho muito respeito".
Ficamos todos a saber que respeito agora significa submissão. Que o facto se agradecer algo a determinado país faz com que imediatamente se seja transformado na subserviente condição de "protectorado" desse mesmo país. Se assim é, Israel há muito deve ser protectorado dos EUA, até pelas reacções contra "a Europa anti-semita", ou a atitude de justificação dos States quando o Estado Hebraico "combate o terrorismo" (isto é, quando invade campos de refugiados, destrói edifícios lançando famílias na rua, etc), e a forma como bloqueia resoluções no conselho de Segurança da ONU quando se trata condenações ao referido estado.
Mas e o que dizer da "nova colónia" francesa? Apenas isto: que para tentar travar, ou ao menos minimizar uma guerra civil que tende a contaminar os próprios vizinhos da Costa do Marfim, estabeleceu-se uma força de manutenção da paz para aquele território, composta maioritariamente por forças francesas, cuja destruição de parte da força aérea governamental deu origem aos motins que se observam. Esclareça-se desde já que tal força assenta, como é óbvio, nas Resoluções 1464, 1498, 1514, 1527 e 1528 do Conselho de Segurança (procurar aqui), aprovadas pelo CS, e não em supostas missões mesiânicas, nem tanpouco para derrubar o regime vigente. a mesma ONU que, não sendo nem tendo pretensões a ser perfeita, é o único resquício de ordem mundial existente, com regras aceites pelos seus integrantes.
Curioso é que o mesmo blogger que fala nesta suposta "colonização" é um apoiante da guerra contra o Iraque, que como se sabe se baseou num misto de mentiras sobre ADMs e "sentido de missão cristão" (Bush afirmou recentemente que "falava com Deus", mas provavelmente não levou a sério os conselhos do Altíssimo, nem do Papa) para lançar o caos no país; à frente do qual- ou de algumas partes do mesmo- está um governo nomeado pelos EUA, que por sua vez condiciona a reconstrução do Iraque ás empresas exclusivamente aprovadas por eles próprios. Para colonização, pode-se dizer que o exemplo americano é perfeito.
Bem sei que a política externa francesa é dúbia, oportunista e a maior parte das vezes hipócrita. Mas lançar estas acusações aprovando casos bem piores mostra apenas que se confirmam as minhas piores suspeitas. Por isso, nem estranho. O anti-francesismo já nem precisa de se insinuar: ele aí está, sem disfarces nem pudores.

sábado, novembro 13, 2004

Já estava mesmo à espera

Estou demasiado cansado para grandes posts agora, mas prometo que no fim-de-semana actualizarei devidamente o blog.
Mas gostava antes de deixar um pequeno comentário. Com toda a confusão que se gerou à volta da morte de Arafat, e tendo essa morte ocorrido em França, país que só por si atrai os ódios de meio mundo (a começar pelos adeptos de Mr. W. Bush & Co), não me admirava nada que viessem os suspeitos do costume acusar o Hexágono de "país anti-sionista", "amigo dos terroristas", "política internacional hipócrita" (aqui com certa razão), e outros disparates do gênero. Ao que parece, a caça ás bruxas francesas já começou, embora de forma tímida e desconfiada, com esta suspeita de apropriação de fundos levantada pelo Blasfémias. Não é muito, mas já é um começo.

quinta-feira, novembro 11, 2004

A dúvida

Ainda falando de figuras que atormentam o presente do diário de Notícias, lembro-me de uma passagem no novo programa da SIC-Notícias "Eixo do Mal", que conta com a participação de Nuno Artur Silva, cCara Ferreira Alves, José Júdice, Pedro Mexia e Daniel Oliveira. Tem uma certa piada, com um debate bem humorado mas esclarecido, embora se note que lhe falta alguma rodagem, mas nada que não possa ser corrigido com o decurso do tempo (e já agora, era bom que CFA perdesse um pouco aquele tom poseur, como quando esclarece qual o sentido de "nojo" naquele contexto).
Mas a parte que me interessa ( e que também está relacionado com o período de nojo de Clara) é esta: numa peça rápida, mostra-se Luís Delgado, com ar apressado, dizendo que "já fui Cavaquista, Barrosista, e agora sou Santanista". A declaração deu azo a comentários (sobretudo o de Daniel Oliveira, que afirmou ser Delgado "arraia-miúda da comunicação social"). Mas o que releva é o facto do Administrador da Lusomundo se dar com os líderes do PSD como Deus e os anjos (não por esta ordem). Não há nenhum que tenha sido PM e que ele infalivelmente não apoiasse. Mas fico cá com uma ideia: será que Luís Delgado, durante o executivo socialista, não teve uma fraqueza e metamorfoseou-se em dedicado Guterrista? Disso não fala ele, talvez por temor governamental. Há que investigar, há que investigar.

terça-feira, novembro 09, 2004

Os lunáticos

Já será um pouco tarde, e vários blogues já o divulgaram, mas não resisto a postar sobre um artigo de há uma semana do inenarrável António Ribeiro Ferreira, antigo guerrilheiro do MES, e actual funcionário do Governo, além de admirador incondicional de George W bush, como se poderá ver. Ah, e também sub-director do DN, essa referência jornalística posta agora numa situação lamentável.
No dito artigo, o colunista diz que "a Velha Europa" (expressão rumsfeldiana, que colheu bastantes entusiastas) odeia a América e inveja a sua democracia", "é falsamente pacifista, antiamericana sempre", "é anti-semita(...) está de alma e coração ao lado dos terroristas palestinianos", "soltou umas lágrimas de crocodilo com o 11 de Setembro, sonhou com um novo Vietname no Afeganistão, tentou tudo para evitar a libertação(!!!) do Iraque". Além destas barbaridades, Ribeiro Fereira acusa a "Velha Europa" de tudo e mais alguma coisa: anti-semita, como se disse, mas ainda nazi, fascista, terrorista, amiga dos soviéticos, etc.
Para quem fala em ódio, revela-o em demasia nestas linhas. O ódio a tudo quanto seja europeu e que resista ás tentações imperiais da América mais conservadora e ganaciosa. O ódio a uma civilização com raízes profundas, que viu nascer a Democracia, o Direito e o respeito pelos Direitos Humanos, não obstante uma luta sem tréguas para que tais objectivos fossem alcançados. Palavras de alguém que se atiraria da ponte abaixo se W. Bush assim o ordenasse, não se lembrando que a história não tem duzentos anos, que o anti-semitismo se pratica igulamente ás claras do outro lado do Atlântico, que há inúmeros soldados da "Velha Europa" no Afeganistão, e que na sua "cobardia capitulacionista" não permite infâmias como Abu Grahib a Guantanamo.
De certa forma não admira o estado a que o DN chegou, com gente desta à frente. Gente que chega a invocar Francisco Sousa Tavares, só para aborrecer o filho deste último, Miguel. O problema é que o homem do megafone não daria qulquer importância ao paranoico sub-director: dir-lhe-ia apenas que faz parte daquele tipo de pessoas que "comem à manjedoura do Estado", como deixou claro num dos seus últimos escritos em vida.

Mas as declarações lunáticas não se ficaram por aqui. Sabidos os resultados das eleições norte-americanas, João Pereira Coutinho, durante um debate televisivo com Azeredo Lopes (que tinha antes feito uma curiosa alusão à "institucionalização da boçalidade da Administração dos EUA"), comentou que, á semelhança do voto da Austrália, que pouco tempo antes reconduzira John Howard ao poder, não tinha ganha "o voto terrorista". Embora já me tenha habituado ás declarações explosivas do ex-Infame, não posso deixar de me espantar com a desilegância de tais declarações, apelidando todos os votantes de Kerry de terroristas. O mínimo que se pode dizer, para além de que este é um pensamento muito pouco democrático e tolerante, é que certas pessoas perderam a noção do ridículo e do aceitável, vogando num estado de paranóia latente, para quem todos os que não sigam à risca as suas ideias são perigosos assassinos, à espera de colocar uma bomba na próxima esquina.
E já que se falou em eleições dos EUA, dê-se uma olhada aos registos de Nuno Guerreiro nas mesas eleitorais de Los Angeles, sobretudo aos votos dos judeus russos, agora devidamente naturalizados. Um melting pot delicioso, superiormente registado no Rua da Judiaria (link atrás).

domingo, novembro 07, 2004

Ainda o Acidental

O que disse no post anterior não me impede de criticar o Acidental sempre que julgar oportuno. E o texto de Luciano Amaral (assim como o artigo acoplado do Independente) merece seriíssimos reparos. Não considero o autor "estúpido", "fascista" ou "nazi", epítetos demasiado simplistas e insultuosos, mas não se escapará sem que eu lhe diga que pratica uma boa dose de facciosismo.
Desde logo, quando acha que o "Ocidente tem de perder a vergonha de si mesmo" e que o "Vietname foi uma guerra justificada e militarmente ganha que se transformou, por obra e graça de gente como Kerry, no maior desastre militar da história americana". Quanto à vergonha do Ocidente acho muito bem que continue a tê-la, relativamente a certas acções: guerras escusadas, bombardeamentos injustificados, violação dos direitos humanos, factos como Guantanamo, Abu Grahib, conflitos coloniais, bombas atómicas sobre o Japão, apoio a ditaduras de rara bestialidade, creio que chega, não? O oposto de tudo isto é a arrogância e o não reconhecimento de tantas acções infames cometidas pelas nações europeias e americanas, cujo campeão máximo é o (desgraçadamente) reeleito W. Bush. É a crença de que o Ocidente é perfeito e não comete nunca erros, ao passo que todos os outros são os bárbaros que se devem submeter à nossa suma razão. Depois, claro, vêm os ódios, para espanto de W. e demais seguidores. Sobre o Vietname, não só não vejo qualquer justificação para o envio de centenas de milhares de soldados - quanto muito percebia-se algum apoio material ao Vietname do Sul - como acho que considerar que os EUA ganharam militarmente a guerra é puro delírio: não só perderam contra uma guerrilha mais tenaz e conhecedora do terreno como retiraram rapidamente, permitindo que o Vietname do Norte se apoderasse de todo o território, deixando atrás de si milhares de mortos e estropiados.

Onde é que Luciano Amaral vê a "vitória militar" dos EUA é que eu gostava de saber. Depois, atirar as culpas para a geração Kerry é uma tremenda fuga às reais causas da derrota. Acontece que os grandes apoiantes dessa guerra eram sobretudo aqueles que se safavam dela, e que não conheceram os horrores da luta na selva e nos pântanos, nem assistiram às crueis sevícias aí praticadas. Amaral diz no texto que as violações eram "fantasias". Sabe-se hoje que não só eram comuns, como comuns eram também as práticas de despejar napalm sobre simples aldeias inteiras, na esperança que lá estivessem vietcongs. Ao contrário do que o autor do texto nos diz, praticaram-se terríveis atentados aos direitos humanos durante essa guerra cruel e inútil, denunciados por pessoas como Kerry, que, como qualquer ser de bom senso, teve vergonha do seu país ao assistir a tamanhos actos. Mas Luciano Amaral nega-os ou não lhes liga importância. Abu Grahib também nunca existiu, não é verdade?

Haveria muito a dizer sobre esse texto, mas só queria referir mais este facto: a de que o autor considera que os vencedores da Guerra Fria foram Reagan e Tatcher. É natural, tiveram parte da fama e parte do proveito. Felizmente que a outra parte ficou para quem os merecia: aqueles que viveram do lado de lá da Cortina de Ferro, e que a rasgaram graças à sua acção firme e à sua coragem. Gente como Gorbatchov, Walesa, João Paulo II, Havel ou Dubcek. A eles se deve a queda do Bloco de Leste. Que haja gente que acredita que foram os dois títeres do neoliberalismo anglo-saxónico dos anos oitenta não me admira. Também há quem diga que quem causou o colapso do comunismo foram os Mujahedin. A opinião era de um certo Bin Laden, conhecem?

Para terminar, parece-me particularmente preocupante que o autor do texto ache que "em Bush reside a cura" e que a sua vitória "poderá dar à Europa um cunho reformador". Atirar o destino para os braços de um boçal como Bush é grave. Mas querer que a Europa siga como um cão de fila esta América fanática, ignorante e agressiva que os Republicanos criaram parece-me gravíssimo. Deus nos livre de algum dia o nosso continente, criador da Democracia e do Direito, voltar a aceitar a pena de morte e as prisões da tortura. Quem precisa de uma cura urgente são os EUA, visto que a sua Democracia está gravemente doente. Cada vez penso mais que ser europeu é um privilégio. E que se Luciano Amaral não quer ser tratado como um imbecil que não é, devia estar mais atento ao que escreve, procurando um mínimo de honestidade.
Mea culpa

Rodrigo Moita de Deus, do Acidental, mencionou o post da "Nega caprichosa"que está visível um pouco abaixo, brincando com o facto de o ter considerado o blog governamental por excelência, devido ao facto de não o ler. Leio-o, é certo, mas nem sempre dou a devida atenção a todos os posts, sendo que alguns se me escaparam. Mais atentamente pude constatar que as opiniões são mais heterogêneas do que supunha inicialmente (exemplo claro disso são os "Acidentais por Kerry"), e que talvez a designação que utilizei possa não ter sido a mais justa.
Por isso, as minhas desculpas ao Acidental, sobretudo ao Rodrigo.

terça-feira, novembro 02, 2004

Manifesto d´A Ágora

Estamos já a 2 de Novembro. Um dia que, como todos sabem, poderá ser decisivo não só para os Estados Unidos da América mas também para a Terra inteira, pela relevância que o país tem na actualidade, sobretudo numa época em que predominam o fanatismo e a psicose do terrorismo como nunca antes se viu.
Pela incompetência da actual Administração Americana em combater tal flagelo, desviando os esforços para uma guerra baseada não só em meros erros de cálculo mas também na mentira e em puras obsessões; pelo desprezo a que votou o Direito Internacional e a diplomacia; pelos ódios e fanatismos que tem ajudado a criar; pelas situações de total desrespeito pelos Direitos Humanos que sistematicamente demonstra, cujo exemplo máximo encontrar-se-á na infame base de Guantanamo; pelas políticas económicas e sociais que marginalizam os mais carenciados e fizeram com que o desemprego e a pobreza aumentassem em flecha nos últimos anos; pela forma parcial e interesseira com que trata a questão israelo-árabe, um problema fulcral para o futuro do Médio Oriente e da luta contra o terrorismo; pelas agressões cque se dispõem a fazer contra o ambiente, recusando desdenhosamente o Tratado de Quioto e ameaçando fazer explorações petrolíferas em reservas naturais, sem a menor intenção de apostar em novas formas de energia alternativas; enfim, por toda a arrogância com que encararam todas as questões que não fossem do seu interesse directo - sobretudo o económico - é absolutamente imperioso que John F. Kerry ganhe as eleições presidenciais, sem margem para dúvidas ou "votos desaparecidos". Graças a George W Bush, os EUA são hoje uma nação com uma Democracia degenerada e caótica. Que os eleitores americanos se lembrem de tudo o que atrás foi enunciado e retirem os Republicanos da Casa Branca. Se tal acontecer, haverá ainda alguma esperança para este planeta. Mas se a actual administração permanecer mais 4 anos no poder, esperam-nos negros tempos, sabendo nós que o Mundo não está para graças.
Que a verdadeira Democracia, a Verdade e a Tolerância voltem a fazer parte da América do Norte.

Wait and See
João XXIII

Ainda relacionado com o meu post de ontem, e como se fosse de propósito, a RTP emitiu hoje um telefilme sobre o Papa João XVIII. Deu para ver como serão as conspiraçõezinhas entre os cardeais no seio do Vaticano, e a exagerada influência que por vezes têm sobre o Sumo Pontífice (que poderá ser ainda mais significativa se o Papa estiver debilitado, como é o caso de João Paulo II), para não falar dos interesses políticos que muitos mantêm - embora na época em questão, em que a Itália era governada por uma Democracia Cristã ameaçada por um poderoso PCI, pudessem ser ainda mais relevantes.
João XXIII era sem dúvida o tipo de homem que os tradicionalistas a que aludi ontem jamais gostariam de ver no Trono de Pedro, ou não fossem furiosos opositores do Concílio do Vaticano II e de todas as consequências que dele se retiraram. Ainda hoje se batem pelo regresso aos velhos ritos que perduraram até aos anos 60. E a sua força não será assim tão dispicienda: afinal, quem é que me explica por que razão o último Imperador Austro-Húngaro está já beatificado (por razões insuficientes, a meu ver, embora fosse de uma bom senso irrepreensível), ou o taciturno Escrivá de Balaguer foi em tão pouco tempo canonizado, e o processo de canonização (pese a sua beatificação, há 4 anos) do Papa do "aggiornamento" continua parado? Por falta de milagres? Se a razão é essa, não se preocupem: haverá sem dúvida neste Mundo inúmeros seres que se curaram das suas maleitas depois de umas rezas que incluíram o simpático mas atento Angelo Roncalli. Se até ao Imperador Carlos da Áustria se reza...
Mas talvez a explicação seja mais de ordem cinéfila que teológica ou moral. É que o actor que encarna João XXIII na produção, Bob Hoskins, também já representou figuras mais controversas, como Nikita Khrushchev, que era aliás o líder soviético por alturas do Vaticano II. Coincidência ou não...

segunda-feira, novembro 01, 2004

Fundamentalismo religioso

Acho graça aos que apelidam o Papa e o demais figuras do Vaticano de "Fascistas Católicos". É óbvio que têm um conhecimento nulo do que é o catolicismo e seus princípios, além de ignorarem o que João Paulo II passou enquanto era Karol, ou seja, assistir à ascensão do Nazismo e do Comunismo com a sua Polónia por cenário. Mais ainda, não conseguem distinguir Conservadores de Tradicionalistas. Por muito rígidos que possam ser, o Cardeal Ratzinger e semelhantes clérigos fazem parte do primeiro grupo. O segundo, próximo do qual estará a franja mais extremada da Opus Dei (embora com prudência), é o representado pelo antigo Bispo Lefebvre, cujas acções anti-Vaticano II lhe valeram a excomunhão.
Não sem uma pontinha de paradoxo, é a França, país conhecido pelo seu laicismo militante, por vezes até demasiado (o que lhe vale por parte dos seus detractores epítetos como "país de Jacobinos"), que serve de base aos seguidores do controverso personagem. Ontem mesmo, durante uma celebração na Catedral de Notre-Dame, a propósito do Congresso Internacional para uma Nova Evangelização, um jovem "Lefebvrista" abordou D. José Policarpo, interrompendo-lhe a prédica e chamando-lhe "herético". O motivo devia-se aos encontros ecuménicos entre membros de diferentes créditos no Santuário de Fátima, que mereceram violentos ataques verbais de alguns grupos mais extremistas. Pelos vistos, das palavras passaram aos actos, espalhando propaganda contra a "heresia" dos não-católicos. Para esta rapaziada, todos os que não comungarem da fé católica são incapazes de alcançar a Salvação.
Não é preciso muito para perceber porque é que o Vaticano os exclui liminarmente, ou que o Sr. Le Pen já os tenha invocado. A comparação com os Salafitas muçulmanos ou a ortodoxia judaica é inevitável. O que aqui se prega é no fundo o ódio aos não-católicos (ou a quem não seguir as prédicas dos seus "clérigos"), a obediência cega, o retorno aos vetustos rituais, como a Missa em Latim, em suma, o retorno total à velha Igreja pré-Vaticano II, com tudo o que isso tem de castrador e reaccionário. Não lhes chamarei "fascistas", uma vez que o termo está gasto e a ideologia é diversa. Mas "miguelistas" é um nome que se lhes colaria muito bem. Sim, porque estes cavalheiros também clamam contra os pedreiros-livres, como faziam os frades em tempos do Senhor D. Miguel.
Semelhantes ideias tem um movimento brasileiro, o Tradição, Família e Propriedade, que em nome do seu "pacífico, laborioso e religioso povo" (podiam acrescentar em muitos casos "analfabeto", o que lhes devia dar imenso jeito, por causa de certas dúvidas algo incómodas) prega contra a "esquerda católica", que "articula os tentáculos da acção subversiva para encaminhar o país pelas sendas da miséria e da fome". A imensa hipocrisia das ideias desta sombria associação, que tem como princípios morais coisas como o sexo ter uma mera necessidade reprodutiva, ou a mulher não dever ser exposta à sociedade, advém do facto de, sem a tal "esquerda católica", a miséria e a fome a que fazem alusão nunca teria sido denunciada e combatida, nem teria havido uma maior ajuda ao próximo. Tais problemas sociais são fruto de uma desigualdade gritante contra a qual a dita Tradição e Etc nunca moveu uma palha, bem pelo contrário. As suas ideias ultramontanas são baseadas numa segregação social muito em voga durante os regimes absolutos , que ao que parece deixaram um punhado de saudosistas.
Algumas destas ideias que atrás descrevi sei-as porque as recebi num mail, há já uns tempos, que me enviaram não sei porquê nem a que título. O que é certo é que os ditos senhores não contam com o meu apoio nem para uma palestra, o mesmo se aplicando aos integristas franceses. Provavelmente não me conteria a acusá-los de todos os horrores que proclamam. Mas qual Ratzinger, quais Opus Dei qual quê! É gente desta, ainda mais radical que os seguidores de Escrivá de Balaguer, que contribui para o afastamento progressivo das pessoas do Catolicismo, distorcendo totalmente a mensagem de Cristo, pregando mesmo o seu oposto, exprimindo ódio em vez de Amor, submissão no lugar da Justiça, e privilegiando as trevas em detrimento da Vida. Tais pessoas são, na realidade, o rosto do fundamentalismo Católico. Longe, muito longe, de ser melhor que os restantes fundamentalismos.