terça-feira, dezembro 28, 2004

A colheita best-of 2004

O Natal já passou, mas nunca me importo de dissertar sobre as prendas mais previsíveis, e que por isso mesmo não surpreenderam ninguém pela sua atribuição. Falo não só dos clássicos e eternos pares de meias, de lenços e chocolates, mas sim de uma categoria discográfica muito vilipendiada pela crítica, mas extremamente apreciada pelo público (com este vosso escriba incluído, claro): os best-of, greatest hits, collections, enfim, as colectâneas musicais.
Alguns houve que já eram esperados mais dia menos dia: o de Robbie Williams, por exemplo, um aguardado sucesso de vendas. Também na teen-pop, Britney Spears não esperou por anos mais "maduros" e vá de lançar a sua primeira compilação, de capa a condizer, com minissaia e look presumivelmente sexy. Mas como não prestei grande atenção a este capítulo, deixo a contagem dos demais best-teen aos entendidos.
Durante o ano surgiram algumas colectâneas de grupos interessantes que passaram despercebidas. A dos Tinderstiks, por exemplo, um grupo tão apreciado em Portugal e que colocou as suas melhores canções num álbum que ostentava na capa, pela centésima vez, um burro. Todavia, como o simpático animal já é presença constante entre a banda de Stuart Staples, é justo que figure no respectivo best of. A aproveitar a boleia do Super-Bock-SuperRock (onde desgraçadamente não estive, como lhes dei conta na altura), os Pixies lançaram também a sua mostrazinha de melhores temas, dando-lhe o nome de um dos deles: Wave of Mutilation. Seria presença confirmada na minha discografia não fosse dar-se o caso de já lá constar o mais velhinho Death to the Pixies, que além do mais traz um cd-bónus de um concerto ao vivo na Holanda, em 1990. A registar ainda outros best-of saídos ou no fim do ano passado ou no princípio deste, como o dos Stone Temple Pilots, ou dos Spain.
Já mais cá para o fim de 2004, ou seja, na altura do costume, próximo do Natal, outras bandas semi-esquecidas revelaram o seu melhor. Caso dos The Verve, que para quem não se lembra andaram meses nos tops e nas rádios com o sublime Urban Hymns (um disco que me raz óptimas recordações), e dos Supergrass, uns ingleses não muito mediáticos mas que conseguem ser histriónicos - e divertidos- q. b.
Quem também não resistiu a editar a colecção foram os profetas do moderno glam-rock, os Placebo. O trio de Brian Molko só leva quatro originais na bagagem, fora um excelente DVD ao vivo, e estava em ampla ascensão para se tornar uma das maiores bandas do Mundo. Esta edição é como que uma interrupção do seu trabalho, mas nunca se sabe se os andróginos rapazes se fartaram uns dos outros, ou se pretendem dar novo rumo à banda. Ou se simplesmente a editora quis ganhar uns trocos a mais no Natal com a edição do CD, o que também não me espantaria. Apesar de tudo, o álbum, que até é duplo, aconselha-se a quem esteja em branco na discografia dos Placebo. Não esquecer They don´t care about us e Slave to the Wage, a minha favorita.
Registo semelhante tiveram os Guano Apes, banda alemã de nu-metal, com uma legião de fãs aqui na Pátria, sem dúvida devido à potência sónica da sua vocalista (coisa que já pude constatar de perto), e que depois de três lançamentos lançaram também o greatest da praxe. Provavelmente a rapariga resolveu enveredar por algo a solo, daí a edição do CD. Mas continuo a achar estranho como é que artistas ainda com repertório tão curto, de que estes Apes são bem o exemplo, possam já falar dos seus Greatest Hits. É que uma banda assim ainda não devia ter chegado a essa idade, deveria falar apenas dos seus Hits, sem espaço para que houvesse Greatest. E o mesmo se aplica aos extintos rock-evangélicos Creed, também eles alvo da homenagem best-of.
Quem amplamente merece essa distinção são os Pearl Jam. A banda de Seattle pode não ser a obra mais genial do rock, mas merece o respeito não só de ser a última resistente do Grunge mas também de se estar a marimbar para as campanhas promocionais e preços dos discos, além de que a voz d Eddie Veder é algo de incomparável. Com Kilos de puro rock, original ou ao vivo, mais melódico ou mais ruidoso, mas sem nunca envergonhar, o seu duplo Rearview Mirror é um testemunho de uma sólida e bem sucedida carreira, a merecer mais do que uma nota de rodapé na história da múscia contemporânea.
Ao que parece, também o diabólico Marilyn Manson e os raivosos Korn editaram as respectivas colectâneas. Não serão propriamente as hipóteses mais católicas para pôr no sapatinho, mas há gostos para tudo. Mais calmas e relaxantes são as propostas de Seal e de outra banda de culto em Portugal, os Lamb, também em estado de desagregação.
O post já vai adiantado, bem como a hora, e à memória já não me chegam mais lançamentos do tipo. Se alguém se lembrar de alguma colectânea portuguesa ( sem ser o disco ao vivo dos Silence 4) deste ano que avise. Até amanhã.

PS: lembrei-me de mais dois greatest-lançamentos deste ano: o dos melancólicos Travis e o dos pseudo-alternativos 10.000 Maniacs. A merecer também a sua pequena audição.

Os dias da catástrofe

Os dias de fim de ano estão decididamente a tornar-se apocalípticos: há um ano houve aquele terrível terramoto no Irão, que destruíu a cidade de Bam e matou dezenas de milhares de pessoas. Agora, a um sismo juntou-se um tsunami de efeitos dantescos, que varreu tanto o sudoeste asiático como parte da costa da África Oriental. Estamos sempre a pensar nos malefícios dos homens, mas a Mãe-Natureza encarrega-se sempre de os desvalorizar um pouco.

sexta-feira, dezembro 24, 2004

Natal em branco

Confesso: cada vez mais o Natal me aborrece. O período mágico da quadra, na infância, varreu-se. Os natais passados em Vila Real (onde era "mais Natal", ou mais autêntico) já lá vão, e duvido mesmo se lá voltarei a comemorá-lo, ao menos nos tempos mais próximos. O que vejo nos dias que correm são pessoas apressadas, filas e filas de trânsito, uma oferta consumista que raia a loucura, os sempiternos anúncios de brinquedos parvos na TV, pais natais por toda a parte. A propósito, gostava de saber porque é que em todos os programinhas natalícios perguntam sempre ás criancinhas "o que é que pediste ao Pai-Natal?". Mas quem é que lhes disse que acreditavam nele? E porque é que lhes têm de impingir à força a existência do ancião de vermelho? E já agora, porque é que não perguntam antes aos miúdos se sabem porque é que há Natal?
Eis a questão principal, afastada das bocas do mundo. A razão do Natal, o nascimento de Jesus, é o mais invisível traço alusivo à quadra, excepto nalguns presépios artísticos, ou na Missa do Galo. Fora disso, a recordação do nascimento de Cristo passa quase despercebida, face à torrente de "Péres-Noëls", grinaldas, embrulhos e pinheiros (de que até gosto muito) que por toda a parte pululam. Para uma pessoa que, como eu, jamais na sua infância acreditou no Pai Natal mas sim no Menino Jesus - coisa que me causava certa confusão, como a dificuldade do Menino andar por aí a comprar prendas- é uma ideia penosa. A sensação é a de que o Natal materialista usurpou o sentido espiritual da época, inspirado por Cristo.
É claro que há aspectos mais comezinhos, como o de não gostar de um único prato ou doce de Natal, ou de não o ter vivido com neve, como seria desejável. A neve, seja em horizontes a perder de vista, seja numa grande cidade, nunca deixou de me encantar e de me dar uma enorme sensação de paz. Infelizmente, os ares do Atlântico afastam-na daqui. O espírito de
Natal está vivo? Talvez, para os mais novos. Para os outros, creio que se lhes varreu no fundo da alma, apesar de externamente demonstrarem o contrário. A não ser que a inspiração de Cristo o tenha mantido. Para mim, o Natal ficou perdido algures em Trás-os-Montes.
De qualquer modo, um Santo e Feliz Natal para todos, na medida do possível.

quinta-feira, dezembro 23, 2004

Edificante...

... a troca de piropos entre Alberto João Jardim e Pinto da Costa. O ditador da Madeira, habitual participante de corsos carnavalescos, e conhecida sanguessuga dos fundos do Estado, em alegre recepção ao tiranozinho do FCP, amigo de tudo quanto é cacique regional e igualmente uma sanguessuga, mas da Câmara Municipal do Porto. Perante semelhante parelha não resta muito a dizer.

domingo, dezembro 19, 2004

The kids arent ´t alright (in the church)

Se há coisa que me irrita profundamente são as criancinhas aos berros na missa. Por mais que se tente escutar cristãmente a homilia - coisa que já de si nem sempre é assim tão fácil - a creche que nos cerca encarrega-se de nos tirar a pouca atenção. Ele é berros, choros, corridas pelas coxias, saltos para cima do banco, perguntas indiscretas a meio da consagração, e tudo isto sob o olhar aparentemente complacente dos paizinhos, que se limitam a um pobre sinal para se calarem. Ah, as vezes que me dá de lhes aplicar um valente tabefe...
Bem sei que Cristo disse "Deixai vir as minhas as criancinhas, pois é delas o Reino dos Céus". O que se passa é que o Salvador com certeza não teve de aturar tamanhos "terroristas" de palmo e meio; caso contrário, pedir-lhes-ia encarecidamente que não viessem, ou dir-lhes-ia que nos Céus se tinham de comportar. Se não O ouvissem, quem as aturasse, dada a santa paciência, teria garantido, sem a menor margem para dúvidas, o Seu Reino,

sexta-feira, dezembro 17, 2004

O sétimo céu basco

Peço desculpa pela futebolização momentânea dos posts, mas não posso deixar de referir este estrondoso resultado da Taça UEFA : o Athletic Bilbao, mítico clube basco, esmagou esta noite o Standart de Liége (cujo manager é o nosso saudoso Preud ´Homme), no terreno deste, por 7-1! com este triunfo, os jogadores euskadi conseguiram o primeiro lugar do seu grupo, e atiraram o Liége para fora da competição.
Perguntar-me-ão: mas o que vem aqui fazer o Bilbao a esta hora da noite? Responderei que o Athletic é um dos clubes estrangeiros que mais aprecio, que o facto de lá só jogarem jogadores bascos lembra-me o Benfica apenas com portugueses, que tal como o clube da Luz já voou mais alto, e que é um símbolo da cultura basca. Mas há uma outra razão, mais materialista: é o único clube do qual eu tenho uma camisola (na realidade, uma t-shirt não oficial com os símbolos e os campeonatos conquistados), adquirida numa pequena loja nas imediações do Estádio de San Mamés, verdadeira catedral do futebol basco, onde Guerreros, Exteberrias e Urzaizs são usualmente aclamados pelos seus indfectíveis adeptos. Sim, é verdade, não tenho nenhuma camisola do SLB, nem dos caríssimos vizinhos do Bessa, nem do Sport Clube Vila Real, ao qual antepassados meus presidiram - algo relutantemente. A única que possuo e que amiudadas vezes utilizo na prática desportiva ou no Verão é mesmo essa t-shirt basca com os dizeres Za zura nagusia. Não me lembro textualmente do seu significado mas quer dizer algo como um incitamento à glória, como a que tiveram esta noite, nos frios relvados da Valónia.

quinta-feira, dezembro 16, 2004

Esclarecimentos da bola

Alguém se admirou com a goleada que o SLB sofreu em Belém? eu não. Não tanto porque a equipa está desmoralizada, ou porque não tem qualidade, mas tão somente porque tinha toda a defesa principal lesionada, sem contar com as ausências de Nuno Gomes e Manuel Fernandes, e com os regressos de um Petit e de um Carlitos ainda sem ritmo. Claro que desatou tudo a caír sobre nós, inclusivé os próprios adeptos. Mas o que eu pergunto é: qual era a equipa portuguesa que, nas mesmas condições, com tão grande vaga de lesões, não sofreria um resultado idêntico?Resposta: nenhuma. E daqui a dias, com o Penafiel, há que temer novo desaire. É que a questão não tem a ver sequer com a qualidade de quem joga, mas com a quantidade. Ao que parece, não há jogadores em número suficiente para formar o meio-campo. Assim, se não perdermos podemos sempre ter esperança. Se perdermos, adeus temporada 2004-2005.

PS: no artigo futebolístico de Sousa Tavares desta semana pode-se ver como certas pessoas por vezes deliram quando falam de futebol. A habitual história do "nós contra todos", o achar que a detenção de Pinto da Costa é puro "show-off", que é tudo uma cabala para fazer o Porto ruír, "calúnias, difamações, falsificações históricas grosseiras", e que o "Porto é mais do que um homem" (mas não é ele o "Papa"?) é uma lengalenga a que já nos habituámos. O que eu não sabia é que o Poto tinha levado de vencida tantos clubes como "Real Madrid, Arsenal, Barcelona, Juventus," etc, e pasme-se, Valência e Milan! Alguém podia dizer-lhe que o Porto perdeu as Supertaças com estes últimos clubes? Agradecia-se o favor, embora não deva ser fácil.
Ah, e para que dúvidas fiquem esclarecidas, o Porto ganhou a Intercontinental (mau seria, contra o Once Caldas), mas isso não faz dele o "Campeão do Mundo". Para já porque não existem outros continentes à disputa, e depois porque o único verdadeiro Campeão do Mundo de clubes é o Corinthians de S. Paulo

quinta-feira, dezembro 09, 2004

Há um ano

Observei há pouco o Papa na televisão, rezando missa pela dia da Imaculada Conceição. Lembrei-me que o vi precisamente há um ano, quando ele se dirigia para essa mesma celebração em Roma, na Piazza di Spagna (o mais bonito local daquela cidade!), e passou à minha frente, na apinhada Via Condotti. Pude enfim mirá-lo num momento repentino, por entre a alegre multidão que o saudava, antes do papamóvel parar para os costumeiros cumprimentos a crianças, em que se divisava uma manga branca acenando. O público, que incluía o "sindaco" Weltroni, não arredava pé nem olhares. O fim daquela luminosa tarde estava frio, mas os estados de espírito estavam sem dúvida calorosos.

Ainda o Apito


Como pensei, Miguel Sousa Tavares não resistiu a cravar a sua farpazinha no processo "Apito Dourado", alegando que quando estudou Processo Penal "Portugal era ainda um Estado de Direito". Ora eu estudei-o mais recentemente e, apesar dos atrasos, conclusões pouco práticas e contradições que o Direito Processual Penal possa trazer em certos casos, o certo é que se continua a reger pelo método acusatório, básico em qualquer democracia avançada, o que esbate essa dúvida sobre se há ou não um "Estado de Direito". Terá razão nos casos em que se refere que alguns detidos que foram chamados a depôr, caso de Valentim Loureiro, ficaram mais tempo em interrogatório do que aquilo que a Lei permite. Certo. Havia motivo para que se anulasse os tais interrogatórios. Mas o mesmo não aconteceu com o objecto da sua apologia, Pinto da Costa, que se apresentou quando quis, saindo em liberdade sob caução. Assim, não vejo porque é que os casos serão extrapoláveis. Apenas penso que Sousa Tavares está obviamente enervado com o processo e atira-se a ele. Não é o único.
Como já disse dois posts abaixo, produziram-se algumas estranhas reacções à detenção do presidente portista, como aquelas em que alguns adeptos mais exaltados vociferaram que "era o resultado da conversa do Benfica com o ministro" (que por sinal já se tinha demitido), ou "é tudo boatos". Convém notar que situações destas são normais no nosso país. O que se passa é que são sentimentos que desta vez se camuflam com a camisola portista. Mas já os vimos antes: com Fátima Felgueiras, com Carlos Cruz no actual processo Casa Pia, com Vale e Azevedo e a sua meia dúzia de indefectíveis, e, num plano diferente, com casos como o de Canas de Senhorim. o que se passa é que, como sempre, certas pessoas bradam contra "os poderosos". Mas quando se trata dos seus "poderosos", é um "Ai Jesus" que tolera qualquer impunidade. Sim, é um sentimento genuína e abundantemente português, este que presenciamos à porta do Tribunal de Gondomar ou do Estádio do Dragão.

quarta-feira, dezembro 08, 2004

Parabéns, Soares

...por oitenta anos de luta pela Democracia. Apesar de ser laico, republicano e socialista, este blog católico, monárquico e preferencialmente social-democrata dá-lhe os parabéns. Por muito que isso irrite a esquerda radical e comunista ou a direita saudosista do 24 de Abril, a instalação da Democracia em portugal e entrada na CEE em 86 devem-se a este homem, sempre interventivo e não raras vezes cáustico. Que conte muitos mais, Dr. Soares.

terça-feira, dezembro 07, 2004

O apito em marcha

A propósito do post de ontem: as bocas do mundo andam agora com um amigo de Luís Filipe Menezes, também conhecido como Presidente (Papa, para os indefectíveis) do FCP. Aquilo que se dizia baixo durante anos aparece escarrapachado nos jornais. Sórdidas histórias envolvendo árbitros, empresários, mulheres de "vida fácil" e o diabo a quatro. Sinais de que pode vir aí uma barrela ao futebol português. Era de esperar que um dia acontecesse: em relação a Espanha e Itália já estamos atrasados vinte anos.
Quanto aos adeptos do FCPorto, é natural que estejam nervosos e queiram demonstrar solidariedade com o seu presidente no pior momento. O que não podem alguns exacerbados dizer é que é tudo uma "Cavala", ou que "é só para desviar as atenções de outras coisas piores", ou ainda, e este é o argumento mais grotesco, "se ele está há mais de vinte anos no futebol, como é que só agora vêm investigá-lo?" Alguém devia responder ao atónito comentador que quanto mais tempo se está ligado ao dirigismo futebolístico maiores são as probabilidades de se dar passos em falso. De qualquer forma, os nervos instalam-se -alguns sustentados por aquele bando de simpáticos rapazes conhecidos como Super Dragões, que aliás formaram guarda ao tribunal de Gondomar para que o "Papa" (Cruz, Credo!) entrasse. Fico à espera para ver o que escreve Miguel Sousa Tavares amanhã.
Mas já que se quer fazer uma limpeza a fundo, que se faça a tudo. Sejam quais forem os clubes. Para que as dúvidas se dissipem.

segunda-feira, dezembro 06, 2004

Campeão da incoerência

O incoerente-mor da política portuguesa voltou a atacar. Luís Filipe Menezes, o autarca de Gaia que é "do Sporting pelo coração e do Porto pela razão" (percebe-se a ideia), ainda há três semanas tinha afirmado que não se voltaria a candidatar pelo concelho da margem Sul, com um vocabulário estilo "Mourinho", que envolvia termos como "Porto" e "Chelsea". Agora, como se previa, Menezes deu o dito por não dito e disse estar disponível para encabeçar nova candidatura à mesmíssima Gaia. Fê-lo, aliás, com um abraço ao seu adversário de sempre, ao seu ódio de estimação, Rui Rio, que, se fôr homem prudente, certamente estará à espera de ouvir cobras e lagartos de Menezes num futuro não muito longínquo.
Mas talvez nem tenha sido este o seu cúmulo da incoerência. Quem não se lembra das suas palavras, naquela noite autárquica de Dezembro de 2001, em que bramia que "se Guterres tivesse um pingo de vergonha pediria de imediato a demissão" (horas antes do mesmo Guterres fazer exactamente o que Menezes lhe exigia)? Pois bem, o sr. presidente da Câmara de Gaia deve ter mudado completamente de ideias. É que há uns tempos veio com a surpreendente afirmação de que "o eng. Guterres fugiu do governo e das suas responsabilidades". Ou Menezes acha que fugir ás responsabilidades é ter vergonha na cara ou então diz descaradamente o que mais lhe convém no momento. Parece-me que, pelos antecedentes, será esta a hipótese mais plausível. Não haja dúvidas, o edil da margem Sul é um autêntico campeão da incoerência.
Breve sumário da "queda do poder no regaço".

No Eixo do Mal de ontem mencionou-se de novo que "o poder caiu no regaço de x". A expressão não é nova na vida política portuguesa, mas é sistematicamente restaurada quando a cadeira do executivo muda de mãos. Diz-se isso a propósito de Santana e Guterres, mas a realidade, para os mais rigorosos, é bem diferente.
Pode-se dizer que, até 1985, a tal "queda" não tinha ainda feito a sua aparição - embora estivesse próxima disso, no Verão Quente, perante a ameaça da esquerda mais radical tomar o poder. O PS soarista (tanto o de 76 como o do Bloco Central) e a AD alcançaram o poder por si mesmos, e não por força das conjunturas. Mas em 85 o poder voa pela primeira vez. Com o Bloco Central no poço da impopularidade (de forma injusta e ingrata, reconheçamos), golpeando de forma mais dura o PS, e aproveitando a ascensão fugaz de um meteórico PRD, o PSD de Cavaco Silva lá conseguiu a sua primeira maioria, de menos de 30%, que lhe permitiu governar por dois anos, até o PRD e o PS cometerem a imprudência de votar uma moção de censura. As posteriores maiorias são já de total responsabilidade de Cavaco himself.
Dez anos mais tarde, com a chegada de Guterres ao poder, Marcelo Rebelo de Sousa diria que o mesmo lhe tinha caído no regaço por acaso. Nada mais precipitado: Guterres teve total merecimento na ascensão ao governo, pela forma como decorreu a sua campanha e como derrotou Fernando Nogueira, apenas com a ressalva do PSD estar naturalmente desgastado por 16 anos no poder.
Este voltou a cair no regaço de alguém, sim, de nome Durão Barroso, que tinha-se aguentado periclitantemente à frente do partido laranja, com as ameaças de Santana e Marques Mendes, mas que quando chegou a hora atingiu a maioria graças mais ao estertor do Guterrismo e à inabilidade de Ferro Rodrigues do que aos seus trunfos pessoais. Cumpriu-se assim a sua máxima "serei Primeiro-Ministro, só não sei em que dia". Algo em que poucos acreditavam.
Como hoje se sabe, Barroso deixou-se tentar por um cargo de inegável prestígio internacional - apesar de ser uma segunda escolha para o lugar - e impôs Santana Lopes no seu posto. O Partido, servilmente, acedeu, o Presidente concordou, e o autarca de Lisboa chegou assim ao cargo que nem os mais ferrenhos santanistas lhe vaticinavam: a chefia do Governo. Se algum exemplo de "queda no regaço" haveria a apresentar, ele aqui está, em todo o seu esplendor. A sorte saiu de forma avassaladora a Santana Lopes. Não procurou jamais este poder: ele encarregou-se de o encontrar.
Caído o desastrado (oso) executivo, com fim anunciado para Fevereiro, ainda que possa ser continuado, os ventos de mudança parecem agora acompanhar José Sócrates, o recentemente empossado líder do PS. Este certamente não esperaria ir a votos tão cedo, o que o vai obrigar a despachar a estratégia de combate e as anunciadas "Novas Fronteiras"- o regresso dos Estados Gerais, agora sob a mão hábil de Vitorino. Se, como se prevê, venha a ganhar as próximas Legislativas, poder-se-á dizer um pouco que também no regaço de Sócrates cairá o poder. Caber-lhe-á provar que o merece, e para isso pede-se-lhe que se deixe de evasivas e diga o que realmente pensa. É que para políticos a quem o poder inesperadamente aterra nas cabeças sem que tenham o menor mérito, já nos bastou Santana.

quinta-feira, dezembro 02, 2004

1 de Dezembro

Para todos os que não se lembram do autêntico dia da Liberdade.

PS: Alvíssaras! A RTP lembrou-se enfim que hoje era feriado. Nos últimos anos, a informação da TV pública parecia não se recordar de mais nada para dizer excepto que era o Dia Mundial Contra a SIDA (homenagem respeitável, apesar de tudo), e mostrar sempre uns generosos minutos da Gala dos Travestis, coordenada por Carlos Castro (isto sim, intolerável, se tivermos em conta que não dedicavam uns míseros segundos sequer para lembrar aos telespectadores porque é que era feriado).
O culpado

Inesperadamente, desafiaram-me ontem a ver a apresentação do DVD do Gato Fedorento, na FNAC de Stª Catarina. Depois de uma corrida por baixo de uma cortina de chuva, tive de aguentar longo tempo no calor próprio do recinto, entre a abafação reinante. O pior de tudo é que, por supostas razões técnicas, não houve lugar à projecção de "sketches" do DVD, pelo que a sessão se resumiu a um discurso de ocasião e à parte de perguntas e respostas, sempre temperada com o bom humor dos rapazes (com a ausência do Zé Diogo Quintela). A dada altura, do meio da turba, não resisti a perguntar se o blog do Gato - que no fim de contas deu início a este enorme sucesso mediático- tinha realmente acabado ou não. Resposta de Ricardo Araújo Pereira: que não, não tinha acabado, mas também não podia continuar, porque agora andavam muito ocupados com sessões como aquela, com motes de chatos como aqueles, e portanto a culpa da paragem do blog (e rematou-o com largo brado) "É TUA, MEU MENINO!"
E pronto. fiquei pois esclarecido. A culpa do blog dos Gatos estar vegetativo deve-se única e exclusivamente a mim. Aceito mails e comentários de indignação. Repreensões. Chibatadas com cinto ou pau de marmeleiro. Arremesso do DVD à cara. Só peço é que tão cedo não me ponham em novo compartimento Fnaciano tão abrasador como o de ontem.