quinta-feira, dezembro 31, 2015

A srª Varoufakis, a aspirante a common people, uma das melhores histórias do ano



Uma das revelações mais divertidas do ano terá sido a de que a inspiração de Common People dos   Pulp não só era real como adquiriu imenso mediatismo neste ano que acaba. A rapariga grega que had a thirst for knowledge, que studied sculpture at Saint Martin's College", cujo  her Dad was loaded e que queria to live like common people era, segundo a imprensa grega e a britânica, tão só Danae Stratou, a muito elegante mulher do ultra-mediático ex-ministro das finanças grego Yanis Varoufakis, umas das figuras mais em voga de 2015. tudo se conjuga: a sua passagem pela Saint Martin´s College nos anos oitenta (que confere com a idade), onde estudou escultura, o facto de ser filha de um abastado empresário grego, e sobretudo o facto de ter conhecido o vocalista e letrista dos Pulp, Jarvis Cocker, nesse período. Quis o destino que a música se tornasse em meados dos anos noventa no maior êxito dos Pulp e numa das grandes músicas da Britpop, superior à grande maioria, e numa fonte de inspiração para classes médias-baixas britânicas que aspiravam a algo mais. E que também Danae Stratou se tornasse numa artista plástica com algum reconhecimento internacional e que se casasse com Varoufakis, que se tornaria conhecido pela sua atitude (e pela imagem que criou, reconheça-se). Uma bom trabalho de investigação ou simples lembrança levaram ao enigma. Stratou não confirma nem desmente, antes manda a bola para Cocker, que sobre o assunto permaneceu mudo. A "musa" grega chegou a vir a Portugal há uns meses, ver a bienal de Cerveira, curiosamente a poucos quilómetros de Paredes de Coura - local onde tive o prazer de ver os Pulp e Mr. Jarvis a tocar ao vivo em 2011, e como não podia deixar de ser, a interpretar Common People, deixada para o fim para delírio do público - mas nenhum jornalista português ou galego perguntou o que quer que fosse. a inspiração de Stratou para o single dos Pulp é assim uma das boas histórias que 2015 nos trouxe.










Ficaram outros assunto para explanar aqui, mas deixo-os para Janeiro, ou seja, para daqui a pouco. Boas entradas e um bom 2016 para todos.

quarta-feira, dezembro 30, 2015

Natal e tradições


Passou-se o Natal, mais uma vez. Os habituais encontros à volta da mesa, reencontros com familiares, publicidade e cores da época, etc. Infelizmente os dias não são de alegria para todos - para os que perdem um familiar em plena véspera de Natal por exemplo (como é que se festeja a quadra depois disso?). Enfim, acrescente-se o encontro com locais onde há muito quereríamos ir, e que parecem esconder-se misteriosamente atrás de um nevoeiro que substitui a neve e a chuva da quadra. Ou com tradições ancestrais, semi-pagãs, de comemoração do solstício de inverno à volta de enormes fogueiras, hoje reproduzidas nos madeiros que em certas regiões não faltam em nenhuma localidade.





Tradição única, para além do madeiro, é a que existe em Aldeia Viçosa, no vale do Mondego. Certa benemérita do Séc. XVII, crê-se, deixou em testamento que aos habitantes da aldeia (que na altura tinha o menos airoso nome de Porco) fosse distribuído todos os anos, no dia a seguir ao Natal, castanhas e vinho, em troca de uma missa pela sua alma. Os seus bens não pagaram indefinidamente a oferta, mas a tradição manteve-se graças à junta de freguesia e a alguns patrocinadores e todos os anos um grupo de rapazes da freguesia sobe ao campanário da igreja matriz, iça uns sacos de castanhas e lá do alto distribui (eufemismo para dizer que alveja) as castanhas pelos populares. Diga-se de passagem que quem quiser apanhar algumas terá de enfrentar umas valentes castanhadas em cima. Depois, acompanhados por grupos de música e ao lado do madeiro que ainda conserva brasas, distribui-se o vinho devido, além de azeite da região. Às seis da tarde, remata-se a tradição, com uma missa por alma da velha de quem nem os registos paroquiais conservam o nome. Mas o seu acto e a sua dádiva mantiveram-se ao longo dos séculos, até hoje.






domingo, dezembro 20, 2015

O regresso do multipartidarismo em Espanha


As eleições que prometem abalar o sistema representativo em Espanha estão à porta. Muito se tem falado no fim do bipartidarismo. Nada de errado, já que há mais de 30 anos que o PSOE e o PP, antes AP, têm dominado largamente a política espanhola, com melhores ou piores resultados. Mas isso nem sempre aconteceu no actual regime monárquico constitucional. Nas primeiras eleições, embora já houvesse dois partidos dominantes, não havia um tamanho oligopólio. A UCD ganhava com maioria relativa, o PSOE ficava um pouco atrás, e o PCE a a AP tinham resultados honrosos, embora aquém do que planeavam. Na recente biografia de Paul Preston sobre Santiago Carrillo, que já folheei, o velho líder comunista achava que o grande confronto seria entre o seu partido, símbolo da oposição ao franquismo e com militantes aguerridos (e o regresso da mítica Pasionária), e o de Fraga Iribarne, representante de saudosistas do regime anterior.  Ganharia a UCD de Suárez as duas primeiras eleições, seguida do PSOE do jovem González, deixando o PCE, de imagem mais envelhecida, muito atrás. Também a AP obteve resultados abaixo dos esperados. A UCD cindiu se depois, engrossando as fileiras do PSOE e da AP, depois PP, embora durante algum tempo Suárez se tentasse imiscuir com o seu projecto centrista, em vão. O PCE, agora na Izquierda Unida, decaiu. Daí data o bipartidarismo espanhol, que tem hoje data de encerramento.

quarta-feira, dezembro 16, 2015

O Palácio da Música que nunca o chegou a ser



Já tinha falado disso, aquando dos dez anos da Casa da Música, mas volto agora ao tema, com novas imagens. Lamentavelmente, pensei que a exposição que celebra os cem anos do nascimento de Agostinho Ricca, na galeria da biblioteca Almeida Garret, ficasse até Janeiro, mas só vai estar aberta até amanhã, 17. Entre várias obras concretizadas e celebradas do arquitecto portuense, como o complexo do Foco (incluindo o antigo e excelente cinema e a igreja), um conjunto de estabelecimentos bancários, igrejas, edifícios administrativos, habitações unifamiliares, e outros com mais ou menos interesse, podem ver-se os planos da alternativa à Casa da Música, e que nunca chegou a ser do papel ou da maquete. Na realidade chamar-se-ia Palácio da Música, teria atrás de si o imenso espaço do Parque da Cidade, e não a rotunda da Boavista, e o arquitecto seria português e não holandês. Como hoje se sabe, prevaleceu o "iceberg" de Rem Koolhas. A Casa da Música será provavelmente um projecto mais bem conseguido e esteticamente mais belo do que seria o de Ricca, mas para além de ser uma ideia arrojada e corajosa, o espaço envolvente talvez compensasse. O Palácio da Música seria mais atarracado, mais brutalista, teria um impacto estético menos vertiginoso, mas o cenário de fundo do Parque da Cidade torná-lo-ia igualmente um ex-líbris portuense. Aquele que seria o último grande trabalho de Ricca não vingou, mas o edifício consagrado à música que nunca chegou a ser pode ainda ser visto amanhã, na biblioteca Almeida Garrett, ou, do mal o menos, ficar com uma ideia pelas fotografias de baixo.



Maquete do Palácio da Música, com imagem do seu mentor em segundo plano.

terça-feira, dezembro 15, 2015

Águias que são fénix


 E quase um mês depois do terror nas ruas e nas casas de espectáculo, Paris regressa à vida e retoma-a no ponto em que estava quando os terroristas entraram em cena. Os U2, que tinham cancelado o concerto em que actuariam no dia a seguir aos tentados, realizaram-no agora, e com convidados especiais. A meio do concerto, Bono Voz recorda aqueles a quem tiraram o palco na noite fatídica e a quem pretende devolvê-lo. De imediato, entram os Eagles of Death Metal e começam com People Have the Power, de Patti Smith. Como sou um dos muitos que só ouviram falar dos Eagles... e das sua incrível e irónica existência pela triste circunstância dos atentados (embora já conhecesse bem o grupo-irmão, os Queen of Stone Age, ambos expoentes da cena musical de Palm Desert), deixo a palavra a quem sabe mais disto do que eu e as imagens do regresso do grupo aos palcos parisienses, desafiando o terror e a submissão.


segunda-feira, dezembro 14, 2015

Áustria-Hungria


A propósito dos adversários do grupo que a selecção portuguesa vai encontrar no Euro-2016 (Islândia, Áustria e Hungria), lembrei-me de um episódio passado com o Arquiduque Otto de Habsburgo, filho do último Imperador austro-húngaro (que está sepultado no Funchal): quando lhe disseram que ia haver um jogo entre selecções de futebol, quis saber quem jogava; "Áustria-Hungria", responderam, ao que perguntou: "e contra quem?"

sábado, dezembro 12, 2015

O declínio dos jornais



As últimas semanas têm sido negras para a imprensa portuguesa. As más novas não são exactamente uma surpresa, embora se fique sempre com esperança de que ocorram o mais tarde possível. Mas inevitavelmente acabam por acontecer.
As aquisições de grupos de comunicação social em situação deficitária por empresas estrangeiras (sobretudo angolanas) já faziam temer um futuro sem suporte quando os novos donos perdessem o interesse. Assim, o Sol, jornal fundado por José António Saraiva para rivalizar com o Expresso de que fora director e com o qual se incompatibilizara, perdeu as ajudas iniciais do BCP e acabou por ser adquirido pela Newshold de Álvaro Sobrinho; notou-se logo a mudança quando o preço surgiu também em kwanzas. Da mesma forma, o I, um jornal inovador no grafismo e atraente na estética(tanto que ganhou vários prémios) e nos artigos algo minimalistas, embora não desprovidos de informação, começou por ser propriedade do grupo Lena, passou por Jaime Antunes e por mais alguns proprietários, e acabou também na empresa de Sobrinho.
Agora, com a saída da Newshold, haverá um enorme remodelação dos dois jornais. O I continuará à semana e o Sol como jornal semanário. O modelo será este nos próximos meses, em que se avaliará se o projecto continua ou não. Entretanto, e com as remodelações, serão despedidos dois terços dos trabalhadores, mais de cem pessoas, em grande parte jornalistas.


Mas os despedimentos não se ficam por aqui ou por estes dois jornais. Também o Público se prepara para "reestruturações" e vai despedir mais umas dezenas de trabalhadores para fazer face aos défices repetidos. E a revista dominical, a 2, vai acabar. Julgo que será a primeira vez que o jornal não terá uma revista ao domingo, desde o pioneiro Público Magazine, a menos que haja algum sucedâneo menos dispendioso.


Ao mesmo tempo, surge a notícia de que as sedes do DN e do JN deverão ser vendidas. Sim, o histórico edifício da Avenida da Liberdade, construído por Pardal Monteiro nos anos quarenta para servir de raiz de quartel-general do DN, e que se tem mantido nessa função até agora, e o prédio brutalista da Gonçalo Cristóvão, símbolo maior do JN, vão ser alienados e os dois diários, embora sólidos, terão de procurar outro poiso. Felizmente já tive oportunidade de visitar a sede do jornal portuense. Convém despachar-me se quero ainda conhecer o DN por dentro no seu ambiente natural.









Desde que há imprensa que os jornais vão e vêm. Morrem títulos e outros surgem no seu lugar. Mas há já uns anos que assistimos ao desaparecimento de órgãos da imprensa sem que haja grande substituição. Nos últimos quarenta anos, depois de monstros como o Século, o República e o Diário Popular e o Diário de Lisboa, assistimos à despedida do Comércio do Porto e da Capital, de tablóides como o Tal e Qual e o 24 Horas e de jornais mais recentes mas que deixaram história, como o Independente. O Primeiro de Janeiro, outrora o melhor jornal português, está reduzido a um boletim. E se alguns dos edifícios que lhes serviram de poiso conservam em alguns aspectos a memória, como o de O Século (hoje Ministério do Ambiente), ou o d´O Comércio do Porto (uma sede bancária com a célebre garagem atrás sempre mantendo as funções originais), outros, como o de O Primeiro de Janeiro, hoje um shopping, só ficaram com a fachada.

Muitos prenunciam o fim dos jornais como o conhecemos - a versão em papel - e o advento definitivo do digital. Quero crer que isso ainda vem longe, até porque os livros têm resistido bem melhor do que se anunciava. Mas estas quedas de vendas, com os consequentes fechos de títulos, são já um sinal de que o papel tem muito menos importância de que outrora. Até porque hoje se dá grande importância à notícia curta e de preferência sensacionalista. As consequências negativas serão o "autojornalismo" de rede social, a informação deturpada ou mal tratada, a falta de profundidade e a ausência de artigos relevantes e explicativos. Nem sempre o progresso é amigo do conhecimento.

quarta-feira, dezembro 02, 2015

O neo-czar e o neo-sultão


Sobre a actual tensão entre a Rússia e a Turquia por causa do abate do avião daquela por esta entre as fronteiras turca e síria, e a morte de um dos pilotos russos, supostamente responsabilidade de uma milícia pró-turca que combate Assad (e por isso a Rússia), para lá das violações de espaço aéreo, de um eventual crime de guerra, da troca de acusações, das sanções russas - que se poderão repercutir no turismo - e dos interesses de cada um dos países no teatro sírio, retém-se sobretudo uma confirmação: Putin e Erdogan são dois autocratas que admitem muito pouca oposição e que têm ambições nacionalistas que pretendem restaurar, na devida medida e com as devidas adaptações, os tempos gloriosos dos antigos impérios russo e otomano. Sem se expandirem territorialmente mas alargando a área de influência. E apoio popular nos respectivos países não lhes falta. O neo-czar há muito que o demonstra, e a crise da Ucrânia é a melhor prova. O neo-sultão, afirmando-se progressivamente como a potência mais sólida no Médio-Oriente, a par do Irão, também tem dado provas sobejas, e o alargamento dos poderes presidenciais deverá ser o próximo passo. Recordar também que a Crimeia, anexada pela Rússia no ano passado, mantém uma importante minoria de tártaros aos quais a Turquia dá um discreto apoio. E que a saída dos russos do Mar Negro passa necessariamente pelo estreito do Bósforo e pela velha Constantinopla. 


terça-feira, dezembro 01, 2015

Depois de Kirchner



O kirchnerismo acabou, finalmente. Já não se aguentava com aquele populismo para os novos "descamisados" de Cristina Kirchner, com a economia a arrefecer, dívidas empurradas para baixo do tapete, uma relação próxima do chavismo e sobretudo alguns casos cuja explicação será no mínimo uma história de terror, como a morte do procurador Nigran, na véspera de ir ao congresso apresentar conclusões arrasadoras que implicavam Kirchner e o encobrimento de investigações a um atentado em 1994 contra judeus em Buenos Aires, ao que tudo indica da autoria do Hezbollah. E o Partido Justicialista, nome oficiall do partido peronista, que assume qualquer ideologia e a sua contrária para se manter no poder, coisa que tem conseguido com assinalável êxito, sofreu também uma pesada derrota, mesmo a nível provincial, apesar dos esforços do seu candidato, Daniel Scioli, de se demarcar de Kirchner.
O candidato Mauricio Macri, representante do centro-direita (mas com apoio da União Cívica Radical, em tempos à esquerda) ganhou em toda a linha e é o novo presidente da Argentina, prometendo uma ruptura. Para já, pediu a suspensão da Venezuela do Mercosul. Mas em termos de populismo, pode não ficar muito longe de Kirchner, noutro espectro, evidentemente. É que Macri distinguiu-se por ser presidente do Boca Juniors - um dos gigantes do futebol argentino - durante uma década. Com imensos êxitos, não haja dúvida, já que durante a sua presidência o clube dominou o futebol sul-americano e conquistou incontáveis títulos. Mas presidir a um clube, com tudo o que isso acarreta, não é a mesma coisa que presidir a um país da dimensão daqueles. Por isso, é bem possível que o populismo não deixe a Casa Rosada. Do que não há dúvida é que a geostratégia da América do Sul pode mudar, até porque daqui a dias há eleições na Venezuela. Um aspecto curioso será o de ver como é que uma presidência que pretende aproximar-se dos Estados Unidos vai lidar com a questão das Falklands/Malvinas.