sábado, dezembro 12, 2015

O declínio dos jornais



As últimas semanas têm sido negras para a imprensa portuguesa. As más novas não são exactamente uma surpresa, embora se fique sempre com esperança de que ocorram o mais tarde possível. Mas inevitavelmente acabam por acontecer.
As aquisições de grupos de comunicação social em situação deficitária por empresas estrangeiras (sobretudo angolanas) já faziam temer um futuro sem suporte quando os novos donos perdessem o interesse. Assim, o Sol, jornal fundado por José António Saraiva para rivalizar com o Expresso de que fora director e com o qual se incompatibilizara, perdeu as ajudas iniciais do BCP e acabou por ser adquirido pela Newshold de Álvaro Sobrinho; notou-se logo a mudança quando o preço surgiu também em kwanzas. Da mesma forma, o I, um jornal inovador no grafismo e atraente na estética(tanto que ganhou vários prémios) e nos artigos algo minimalistas, embora não desprovidos de informação, começou por ser propriedade do grupo Lena, passou por Jaime Antunes e por mais alguns proprietários, e acabou também na empresa de Sobrinho.
Agora, com a saída da Newshold, haverá um enorme remodelação dos dois jornais. O I continuará à semana e o Sol como jornal semanário. O modelo será este nos próximos meses, em que se avaliará se o projecto continua ou não. Entretanto, e com as remodelações, serão despedidos dois terços dos trabalhadores, mais de cem pessoas, em grande parte jornalistas.


Mas os despedimentos não se ficam por aqui ou por estes dois jornais. Também o Público se prepara para "reestruturações" e vai despedir mais umas dezenas de trabalhadores para fazer face aos défices repetidos. E a revista dominical, a 2, vai acabar. Julgo que será a primeira vez que o jornal não terá uma revista ao domingo, desde o pioneiro Público Magazine, a menos que haja algum sucedâneo menos dispendioso.


Ao mesmo tempo, surge a notícia de que as sedes do DN e do JN deverão ser vendidas. Sim, o histórico edifício da Avenida da Liberdade, construído por Pardal Monteiro nos anos quarenta para servir de raiz de quartel-general do DN, e que se tem mantido nessa função até agora, e o prédio brutalista da Gonçalo Cristóvão, símbolo maior do JN, vão ser alienados e os dois diários, embora sólidos, terão de procurar outro poiso. Felizmente já tive oportunidade de visitar a sede do jornal portuense. Convém despachar-me se quero ainda conhecer o DN por dentro no seu ambiente natural.









Desde que há imprensa que os jornais vão e vêm. Morrem títulos e outros surgem no seu lugar. Mas há já uns anos que assistimos ao desaparecimento de órgãos da imprensa sem que haja grande substituição. Nos últimos quarenta anos, depois de monstros como o Século, o República e o Diário Popular e o Diário de Lisboa, assistimos à despedida do Comércio do Porto e da Capital, de tablóides como o Tal e Qual e o 24 Horas e de jornais mais recentes mas que deixaram história, como o Independente. O Primeiro de Janeiro, outrora o melhor jornal português, está reduzido a um boletim. E se alguns dos edifícios que lhes serviram de poiso conservam em alguns aspectos a memória, como o de O Século (hoje Ministério do Ambiente), ou o d´O Comércio do Porto (uma sede bancária com a célebre garagem atrás sempre mantendo as funções originais), outros, como o de O Primeiro de Janeiro, hoje um shopping, só ficaram com a fachada.

Muitos prenunciam o fim dos jornais como o conhecemos - a versão em papel - e o advento definitivo do digital. Quero crer que isso ainda vem longe, até porque os livros têm resistido bem melhor do que se anunciava. Mas estas quedas de vendas, com os consequentes fechos de títulos, são já um sinal de que o papel tem muito menos importância de que outrora. Até porque hoje se dá grande importância à notícia curta e de preferência sensacionalista. As consequências negativas serão o "autojornalismo" de rede social, a informação deturpada ou mal tratada, a falta de profundidade e a ausência de artigos relevantes e explicativos. Nem sempre o progresso é amigo do conhecimento.

Nenhum comentário: