Impressões do dia
Duas decisões de última hora levaram-me a sensações completamente diferentes nesta semana.
No último dia de exibição no Rivoli, assisti à peça "Visitando Mr. Green", do americano Jeff Baron. Diálogos com humor misturados em amargura, confissões, memórias, cumplicidades. E a oportunidade de ver ao vivo o grande Paulo Autran, sublime como sempre no papel de velho e rabugento judeu, esquecido no seu modesto apartamento novaiorquino, e a promessa Dan Stulbach, competente como o economista que é obrigado, em virtude de um acidente que provocou, a prestar trabalho comunitário, isto é, a visitar semanalmente o solitário Mr. Green (a vítima do atropelamento). Além de assistir ao espectáculo, ainda tive a sorte de encontrar os actores à saída, de falar uns minutos com eles, e, fiel e inevitavelmente, de ficar com os respectivos autógrafos - cumprimentar Autran é algo que nunca tinha imaginado . A digressão passaria ainda por Famalicão e acaba em Lisboa. Não percam pois a oportunidade, caros alfacinhas.
Já ao caír da noite decidi, por proposta de amigos, ir a Fátima pela primeira vez na véspera de um treze de Maio. Nunca fui demasiado devoto do Santuário, por achar que se pratica mais a crendice que a religião, o excessivo culto aos símbolos, que se dá mais relevo à Virgem e se secundariza Deus, e, claro, que muitos se aproveitam da devoção que o local provoca para fazer o seu negócio ou ganhar uns €uros extra. E depois, as multidões excessivas são sempre um factor de risco e de temor.
Sim, as tais multidões estavam lá (até SAR o duque de Bragança e família), e para se entrar no recinto era um sarilho. Mas uma vez lá dentro a circulação nem era difícil. E a Procissão das Velas é admirável, com um ambiente feérico e mágico digno do local, entranhado pelos cânticos marianos. A devoção e a Fé estavam lá, mas sem o histerismo colectivo que em ocasiões como esta resolvem entrar em cena. Claro que havia alguma beatice, bem como alguns dos elementos que atrás citei, os negociantes infindos, as pessoas a tentar furar com os carrinhos de bébé, ou pior ainda, o bispo do Porto a ler trechos da Missa. Mas ainda, a visão daquela massa ordenada e crente, com inúmeros peregrinos estrangeiros no meio, a serena adoração à Virgem, e a ameaça de violentos aguaceiros que apenas se concretizaram durante a viagem fizeram com que , pelo menos em parte, me reconciliasse com Fátima.
Por falar nisso, é um tipo de fé completamente diferente que anda a transtornar o país, sobretudo aquele que clubisticamente veste as cores da bandeira nacional. Prefiro nem dizer nada - excepto que amanhã se poderão abrir as portas do Paraíso ou desabarem as abóbadas dos céus- mas apenas e só recomendar a todos os benfiquistas que antes do faiscante derby de amanhã leiam o último Domingo Subjectivo do João Gonçalves. Leiam-no, devorem-no, absorvam-no, guardem-no, emocionem-se; ganhemos ou não, é um incentivo dos melhores.
E já que falámos de religião, parece que há um clima de indignação geral com as estapafúrdias declarações do padre durante a Missa de Sétimo dia da menina brutalmente morta no Bairro do Aleixo (recordo: "o aborto é mais grave que um homicídio destes, porque uma criança de cinco anos pode sempre gritar"). Não falamos de um clérigo xiita, mas de um sacerdote que, por sinal , até é o pároco da minha freguesia, Lordelo do Ouro. Mas se é quem eu penso, julgo que tenho a explicação: o dito clérigo é acima de tudo simplório, e muitas vezes nem medirá o que diz, ou nem verá o alcance das suas palavras. Só que manter um pároco que não controla os seus próprios dislates é um perigo que a Igreja corre. A Igreja e os paroquianos, bem entendido.
sábado, maio 14, 2005
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2 comentários:
Quanto ao Sr. Padre estamos completamente de acordo!
Detesto Fátima e tudo o q significa mas confesso q a Procissao das Velas é absolutamente arrepiante...
Grande abraço...
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