quarta-feira, maio 04, 2005

Queimava

Os estudantes da academia do Porto estão em plena queima das fitas. O clímax do evento deu-se hoje, com o tradicional cortejo de terça-feira, que pára meia cidade e leva milhares ao delírio. Goza-se uma semana de total liberdade, de excessos, de figuras tristes que ficarão para a posteridade. Vestem-se normalmente uns pólos com as cores do respectivo curso, trajes académicos até com um sol abrasador, "kits de caloiro" que incluem chupetas e toucas, e outras roupagens ridículas. O cortejo é um desfile de carros alegóricos onde se entoam palavras de ordem a louvar a respectiva faculdade ou a apoucar as outras (os mimos entre Engenharia e os diversos cursos de Direito são particularmente excitantes), bebe -se cerveja aos litros, tiram-se fotos com a família e salta-se nas escadarias do Palácio da Justiça. Por vezes o tempo não ajuda, e é ver tudo a fugir para baixo dos telheiros mais próximos, a improvisar guarda-chuvas ou a pura e simplesmente continuar a "curtir" com a água a escorrer, como se estivesse o melhor dos tempos. Depois, claro, há os jantares de "confraternização" ou de refúgio da caminhada do cortejo, a ida para o "queimódromo", os concertos (aos quais a maioria nem liga, excepto se fôr de qualidade superior, como o dos James, ou, para os caloiros, a presença no palco de Micaela ou Ruth Marlene) , as barracas, cada uma com um nome mais estrambólico ou uma "nova" bebida mais alcoólica, e o inevitável INEM, de onde partem as ambulâncias com uma carrada de gente com vodka a mais.
A confusão nesse recinto poeirento e desolador (desde que se saíu do mais verdejante Palácio de Cristal) é mais que muita, o perigo de brigas é real, sobretudo se tivermos em conta os níveis de alcoolémia, os velhos encontros são múltiplos, bem como as novas "amizades"; vêem-se sempre cenas inéditas, como tipos de traje a dormir no chão, à chuva, com um sapato a servir de almofada, ou centenas de vozes cantando "SLB, Glorioso SLB..."
Para quem é finalista há um sentimento de fim de festa (por isso mesmo mais acentuada), de nostalgia precoce, e de um sem-fim de compromissos, como o baile de finalistas, a missa da bênção das pastas, a entrega de insígnias, o Serrote (representação onde se goza com os professores do curso), o levar as bengaladas na cartola à laia de felicidades, mesmo que partam do Dr. Rui Rio à passagem da tribuna, etc. Para quem começa é todo um mundo novo que se abre, uma maior boémia, mas também o início de uma certa responsabilidade, e um conjunto de queimas que se seguirão, todas diferentes das anteriores.
Hoje, ao ver passar estudantes de todas as cores, feitios e anos a caminho do cortejo, não pude deixar de sentir uma ponta de nostalgia por todas essas situações que também vivi ao longo do meu curso. Só voltei a uma noite no queimódromo desde que me formei, e dei-me logo conta que estava já desfasado daquela realidade. Aquilo era agora para outros, não para mim. Até posso lá voltar, mas sempre com uma ponta de tédio, mesmo porque aqueles que comigo trilharam o caminho jurídico-estudantil estão também eles completamente afastados dessas vidas. Deixemos pois os estudantes gozar essa semana de insensatez e inconsciência, pois que ser algum está desprovido desses atributos. Apesar da chatice dos cortes de trânsito, da música em altos decibeis (de minha casa, a uns cinco kms, identifico as músicas dos Xutos) e das reclamações dos "futricas", talvez por nunca terem tido a oportunidade de passar pelo mesmo.
Por mim podem estar à vontade. Manter-me-ei como um mero espectador de circunstância, definitivamente fora desse mundo que agora pouco me diz mas ao qual já pertenci

4 comentários:

A. Narciso disse...

Tambem fiquei saudosista desses tempos que já lá vão. E estou como tu: agora limito-me a assistir.
Abraço

mfc disse...

Ainda sou do tempo do luto académico e da ausência de Queima.
Não me consigo libertar de ver alguém trajado e lembrar-me do siginificado que então tinha.
Não consigo, pois, gostar da Queima.

Anônimo disse...

Calculei logo que não percebias nada disto...

João Pedro disse...

O que é que não percebo disto?