domingo, janeiro 13, 2013

Chávez e o chamamento irresistível do poder


Como se esperava, Hugo Chavez não tomou posse como presidente da Venezuela. Continua em Cuba, meio enfermo, ninguém sabe bem em que estado, depois de mais uma operação ao seu problema oncológico. Apesar disso, a cerimónia de tomada de posse teve mesmo lugar, depois do tribunal constitucional venezuelano considerar que a presença do presidente não era indispensável. em Caracas, juntaram-se milhares de apoiantes de Chavez, clamando pelo "comandante" como se Cristo estivesse prestes a vir à Terra. Na bancada, o vice-presidente, membros do governo e órgãos de soberania, vestidos de fato de treino. Ao lado, alguns chefes de estado sul-americanos amigos de Chavez (exceptuando Cristina Kirchner, que preferiu visitá-lo pessoalmente em Cuba, enquanto ia redigindo no seu avião presidencial cartas abertas ao Reino Unido reivindicando as Falklands, para disfarçar a contestação popular), como o impagável Evo Morales, gritando a plenos pulmões que o presidente venezuelano era "toda a América Latina". Os líderes do Brasil, Colômbia e Chile provavelmente terão opinião diferente e não marcaram presença, talvez por estarem demasiado ocupados a fazer com que os respectivos estados progridam. Em suma, toda a cerimónia de tomada de posse do ausente teve o seu quê de cómico, idólatra, de delirante e até de narcótico, sendo de crer que Morales tenha levado da sua famosa coca para o evento.

Não sei qual a legitimidade para esta investidura de cadeira vazia, mas também não sou especialista nas normas venezuelanas que incidem sobre os seus órgãos de soberania, nem sobre a "constituição bolivariana". Toda esta manifestação de endeusamento não surpreende naquele regime. Chavez não é um ditador, bem entendido, mas também não é um democrata exemplar. Usa o petróleo para dar a impressão de que governa para o bem-estar da população, embora Caracas seja uma cidade ainda mais violenta do que quando chegou ao poder, indício de graves problemas sociais. Controla com mão de ferro a comunicação social, não hesitando em proibi-la se lhe é desfavorável, nacionaliza empresas a seu bel prazer quando está para aí virado, hostiliza as oposições, e dá-se com gente duvidosa como Ahmadinejad, Kadhafi (em tempos) e Fidel Castro. Aliás, oferece anualmente ums barris de crude aos compañeros cubanos, em troca de tratamento médico para os seus problemas que são a causa desta confusão, se bem que os serviços de saúde da ilha sejam muito mitificados. Chávez  não é um tirano, mas um caudilho eleito, alguém que abusa do seu poder e o usa para lá da sua legitimidade. Como tal, não lhe desejo nenhum mal físico, muito menos a morte, mas simplesmente que tivesse perdido ou perca no futuro as eleições.

O que não deixa de espantar nisto tudo é que Chávez já está doente há algum tempo, e teve recaídas. Apesar disso, não deixou de se recandidatar à presidência do seu país. O aroma do poder é irresistível, sobretudo para os populistas, e o seu exercício um vício. Mesmo no seu estado de saúde, sem saber se poderia cumprir as funções ou não, Chávez candidatou-se ao cargo para se reelegitimar e ouvir os brados da multidão endeusando-o, numa espécie da culto de personalidade adaptado às circunstâncias. Mas a vertigem do poder chavista pode levar a Venezuela a uma cadeira presidencial vazia e a uma crise política. A uma tomada de posse surreal, que teve lugar sem o titular, já conseguiu.

 

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