quarta-feira, janeiro 12, 2005

It´s not the end of REM as we know them (and I feel fine)


Aqui há poucos meses, Miguel Esteves Cardoso falava, na sua crónica semanal na Blitz, à qual em boa hora regressou, das bandas "que já não se podem aturar"( não era bem assim mas anda lá perto). O exemplo que dava era o dos REM, mais concretamente do seu último álbum, Around the Sun. MEC considerou o disco "uma seca", opinando que o grupo de Athens devia terminar. Não me lembro de tudo textualmente, mas deu para ver que o ex-líder do PPM ten um pequeno ódio de estimação pela banda. De qualquer forma, provou-se que, apesar de ainda lançar de quando em vez uma prosa interessante, e de estar atento ao mundo da música. MEC está muito longe daquilo que era, ou seja, a grande referência para inúmeros colunistas, escritores e especialistas no pop-rock.
Confesso que não ouvi ainda bem Around the Sun, à parte o single Leaving New York e pouco mais. Tive essa oportunidade na Sexta, dia 7, no Pavilhão Atlântico, onde pela segunda vez a banda se deslocou, e em que pela segunda vez a pude ver ao vivo.
Ao contrário da opinião reinante não desgostei do espectáculo a que assisti em Junho de 99. Ouvi críticas como "desafinados", "retorcidos", barrocos", "desarticulados", mas quanto a mim apenas pude ver uma banda que se estreava em palcos lusos, com uma decoração que nomeava as outras cidades da digressão, à mistura com motivos do álbum Up, e um desfilar de canções que circulava entre os clássicos e as nóveis (e por isso mesmo mais desconhecidas). O público, já se sabe, quer festejar ante o que já conhece, pelo qual pagou o bilhete, e não fica muito convencido ainda que lhe digam que a digressão tem exactamente como objectivo promover o álbum que traz na bagagem.



Mas as críticas ao grupo de Athens (Geórgia) não se ficam pela sua performance em palco. São acusados de estarem pouco imaginativos, alheados, cansados, ou , como diz o MEC, "já não se poderem aturar". Posso até nem apreciar tanto as últimas criações dos REM, mas acho perfeitamente injustas as condenações por falta de criatividade e imaginação. Se há coisa que Michael Stipe e sus muchachos sempre tiveram foi capacidade para se auto-reinventar e mudar de estilo de um álbum para o outro, sem contudo perder os princípios essenciais que norteiam o bom pop-rock. A sua rica história prova isso mesmo. Recorde-se que os REM eram no início uma banda de universitários, que produziam uma mistura de punk/country que os transformou num fenómeno de culto, para além de terem uma militância política fortemente anti-Republicana ( no caso, anti-Reagan). A sua música "alternativa" começou a chegar ás massas com Document (que incluía hinos como "One I Love" e "It´s the End of the World as We Know It") e Green. Abandonaram então a sua pequena editora e assinaram por uma "major". Seguiu-se Out of Time e a banda explodiu a nível mundial, com singles como "Shinny Happy People" e, sobretudo, a (permitam-me) inimitável, intemporal e esmagadora "Losing my Religion". Mas apesar de todo o êxito, não hesitaram -lá está- em seguir com uma total alteração de estilo, numa aposta arriscada mas triunfante. Depois do rock FM com laivos de country de Out of Time, Automatic for the People era um disco mais acústico, mais doce e introspectivo (inclui "Man on the Moon e Everybody Hurts"), mas nem por isso deixou de ter um sucesso comercial semelhante. Com Monster passaram depois para um tipo mais rocker, próximo do Grunge que dava os últimos suspiros, naquele ano da morte de Kobain. Nessa altura, os REM eram a maior banda do Mundo, e só não vieram a Portugal porque uma carga de maleitas os apanhou a meio de uma digressão mundial. De qualquer forma, o álbum seguinte, New Adventures in Hi-Fi (o meu primeiro!) era constituído por músicas derivando entre a balada mais doce e o rock mais mexido, mas que, como dizia a Grande Reportagem da altura, podiam formar a banda sonora perfeita para uma travessia da América de carro, sobretudo na passagem pelo Oeste. Não admira: o disco foi criado e gravado na estrada, entre um e outro concerto em diversas cidades dos EUA. New Adventures não teve tanto sucesso com o público, talvez por não ser de uma facilidade imediata, mas tem um reportório irrepreensível de magníficas músicas - estou neste momento a ouvir uma belíssima: "New test Lepper".


O baterista Bill Berry, que sofrera um aneurisma, deixou a banda, que regressou com o mais electrónico, nebuloso e introvertido Up, também ele um álbum difícil (e com o consequente insucesso comercial), mas com argumentos válidos, depois de nele se entrar; o cartão de visita Daysleeper é das minhas favoritas da banda, mas aconselho outras, como a despercebida Falls to Climb, a última faixa do álbum.



Tendo feito a tournée mundial, com o tal primeiro concerto em Lisboa (onde apresentaram, em estreia mundial, a música Great Beyond, da banda sonora de Man on the Moon, filme de Milos Forman, com um videoclip em que a banda atirava dardos a Jim Carrey) os REM descansaram um pouco até editar Reveal, um disco mais "de Verão", mais açucarado e alegre, onde os raios de sol trespassavam o negrume anterior. O single principal, Imitation of Life, era prova disso mesmo, e a banda voltou aos tops. Como exemplo de balada menos colorida temos outro single, a belíssima "I´ll Take the Rain", uma das melhores músicas do disco. Seguiu-se o inevitável Best Of de fim do ano e o tal Around the Sun, disco que, como disse no início deste já longo post, ainda não ouvi nas melhores condições.
Tive pois essa oportunidade no concerto de dia 7. Ouve outros ecos nos blogs, ora entusiásticos, como o Nuno Peralta, ora desiludidos, como o Pedro Mexia (pela segunda vez), sobre a exibição dos rapazes. Mas, embora tenha gostado mais da decoração do palco e das imagens emitidas, não fiquei mais entusiasmado com este concerto do que com o de há cinco anos e meio atrás. Talvez por ser Inverno e no outro Verão, ou, mais importante, já não ter o entusiasmo de principiante que me levou a Lisboa de saco de viagem ás costas, a meio da época de exames da faculdade (que me correram bem, graças a Deus), com a alegria própria da novidade. Não. Desta vez sabia um pouco o que me esperava (como o facto de em nenhum concerto dos REM eles se esquecerem da Losing), revi algumas canções que já ouvira ali mesmo, e julgo mesmo que o público era mais "controlado" e menos juvenil do que em 99; provavelmente para muitos deles seria também a repetição. Confesso aliás que se um grupo grande de amigos não me tivesse desafiado para lá ir talvez nem me tivese dado ao trabalho de nova ida ao Atlântico. Mas também não fiz nenhum sacrifício, e pude mesmo ouvir a grande ausente de há cinco anos (Everybody Hurts), fiquei com uma melhor ideia do novo álbum e o concerto proporcionou um convívio agradável e um ambiente simpático. Não o faria por muitas mais bandas além dos REM. Michael Stipe, Mike Mills, Peter Buck & Cª merecem-no. E depois, nenhuma deslocação que permita ver ao vivo a performance de Losing my Religion se pode dar por inútil, seja qual fôr o valor do bilhete. Foi talvez o grande momento de comoção que senti naquele concerto; sentir que talvez nunca mais fosse ver aquela música a ser tocada ao vivo. E só por isso já valeu a pena ir ao Pavilhão Atlântico, numa fria noite de Janeiro de 2005.

Se quiserem ouvir algumas das minhas propostas, podem fazê-lo aqui

5 comentários:

Anônimo disse...

Foi exactamente nessa noite dos REM que tive conhecimento deste blog e, com oportunidade, não pude deixar de vir cá espreitá-lo. Encontro este texto sobre o concerto e não pude deixar também de me rever no escrito até porque, como o autor, também eu marquei presença no concerto de há uns anos. (E até porque, tal como o autor, mandei a época de exames da faculdade dessa altura para o galheiro e fui a Lisboa ver um dos meus grupos preferidos de então. Mas ainda deu para fingir que se estudava no comboio, certo Pimenta?). Bom texto, sim senhor! 1 abraço MC

Anônimo disse...

Foi exactamente nessa noite dos REM que tive conhecimento deste blog e, com oportunidade, não pude deixar de vir cá espreitá-lo. Encontro este texto sobre o concerto e não pude deixar também de me rever no escrito até porque, como o autor, também eu marquei presença no concerto de há uns anos. (E até porque, tal como o autor, mandei a época de exames da faculdade dessa altura para o galheiro e fui a Lisboa ver um dos meus grupos preferidos de então. Mas ainda deu para fingir que se estudava no comboio, certo Pimenta?). Bom texto, sim senhor! 1 abraço MC

João Pedro disse...

Nesse caso, sabes exactamente do que é que estou a falar. E até foram razões relaccionadas com o concerto que te trouxeram finalmente ao blog.A diferença é que agora já não precisaste de fazer uma deslocação a Lisboa de propósito.
Ah, e o estudo no comboio (de DIP, se não me engano)serviu para alguma coisa. Um abraço

A. Narciso disse...

Prometido é devido :) Concordo ctg quando disses que os REM tem uma boa capacidade para se adptarem. Tem havido claras mutações, evoluções. Tb gosto mais de trabalhos anteriores, mas mesmo assim gosto dos actuais. Um pouco à imagem dos U2
Abraço

João Pedro disse...

Exacto. Os U2 são o grupo que, pela sua longevidade, dimensão e qualidade musical mais se pode comparar aos REM, ainda que comercialmente estejam melhores.