Há já uma semana que morreu Eduardo Prado Coelho. Surpreendi-me bastante com esse desaparecimento, até porque a doença que o afectava não parecia letal (ainda que grave), apesar das sucessivas interrupções do seu artigo diário no Público e do ar patibular que tanto o modificou. Acabou no entanto por ser um ataque cardíaco o causador da sua morte.
Eduardo Prado Coelho era o típico "intelectual de esquerda", a quem só faltava mesmo o cachimbo. Recordava frequentemente os anos de Paris e utilizava por vezes um jargão filosófico sobre as suas referências pouco acessível ao comum dos leitores. Mas andava frequentemente entre os comuns mortais, e fazia gala disso. Não raras vezes os seus artigos incidiam sobre as suas pequenas obsessões e prazeres: a qualidade das salas de cinema, os produtos de beleza, os pastéis de nata, o Sporting, as telenovelas, e muitas outras coisas. Ainda no último ano publicara um álbum, intitulado "Nacional e Transmissível", onde constavam outros elementos das suas vivências, como os cafés lisboetas.
Os seus artigos incidiam sobre uma panóplia de assuntos, sobretudo filosóficos e políticos. Nos últimos verificava-se uma enorme concordância com as políticas do actual governo, com algumas críticas pontuais, sendo o último Ai, Simplex imagem disso mesmo. Como quase sempre,. EPC teve sempre esse oportunismo político, desde a sua ligação ao PC, passando pelo apego ao cavaquismo, e até aí se notava o seu cunho de intelectual afrancesado, qual Jacques Lang sem poder.
Que me lembre, vi-o só uma vez, numa série de conferências na Bolsa. Apesar de alguma irrritação que certos artigos do "Almôndega" (assim era conhecido nos tempos de faculdade) me provocavam, outros havia que eram imperdíveis. Admira-me aliás o imenso coro de homenagens que lhe fazem agora. Sempre o vi como um homem criticado por tudo e todos, de forma exagerada e por vezes maldosa, principalmente pelo seu francesismo, que como se sabe não está na moda, e caricaturado como o representante intelectual Rive Gauche em Portugal. Mas já se sabe que a morte produz milagres de opinião e honrarias. Assim, serei obrigado a concluír com o que outros disseram: deixa inequivocamente um lugar vago na cultura e na opinião portuguesa; e sim, fará muita falta ao panorama intelectual e jornalístico. Jamais reabriremos o Público sem nos lembrarmos do omnipresente O Fio do Horizonte. Um espaço em branco não apenas presumido, mas bem visível.
Já agora, assinale-se também outro desaparecimento de outro homem da cultura, mas da pop, e de Manchester: Tony Wilson, mentor dos Joy Division, New Order, Happy Mondays, da Haçienda e da Factory, e amigo de Miguel Esteves Cardoso. Conheci-o, como muita gente, no filme 24 Hours Party People. Um belo documento, aliás, para quem quiser conhecer a sua obra entre os anos 70 e 80, o urbano depressivismo e a loucura da Rave e do Madchester.
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