A morte de Miguel Portas não é totalmente inesperada, mas julgava-se que ainda ficaria mais algum tempo entre os vivos. Mas a doença venceu-o, em Antuérpia. Apesar de algum sectarismo e radicalismo de esquerda, era um homem de valor, sincero, afável, idealista e lúcido, como se prova nesta entrevista que deu ao Expresso no Verão passado. Teve uma carreira multifacetada, entre o jornalismo, lançando várias publicações (chegou a haver piadas quanto ao toque anti-Midas de Portas, que não conseguia fundar uma jornal/revista sem que o mesmo falisse em pouco tempo), a animação cultural e as actividades culturais da câmara de Lisboa (um dos impulsionadores das Festas da Cidade), e a política, participando no catolicismo progressista herdado do seu pai, militante heterodoxo do PCP, de onde saiu para a Plataforma de Esquerda, e por fim como um dos fundadores do Bloco de Esquerda. Era aliás dos mais valorosos dirigentes desta movimento (e dos menos irritantes, por comparação com Louça e Fazenda), e há vários anos que era deputado no Parlamento Europeu, funções em que se manteve até ao fim.
Apresentou e criou também um excelente documentário televisivo, Mar das Índias, onde percorria as Arábias, a Índia e sobretudo a Etiópia. Na única vez em que lhe dirigi a palavra, para lhe falar desse programa, respondeu-me com a sua proverbial simpatia, revelando-me que já estava a preparar outro sobre o Mediterrâneo, que de facto viria a exibir na televisão, mais tarde. Pergunto-me se haverá hipótese de rever esses programas, em reposição na TV ou em suporte DVD...
Outra das razões de Portas ser conhecido era porque a sua família próxima é igualmente afamada. Tanto a mãe, Helena Sacadura Cabral (que aliás bloga no Delito de Opinião), como o pai Nuno Portas, viveram para assistir a isto, a esse acontecimento anti-natura dos pais sobreviverem aos filhos. Hoje, por casualidade, estive em Guimarães, na exposição O Ser Urbano, homenagem a Nuno Portas por ocasião da Capital Europeia da Cultura, com uma colóquio/debate que contaria com a presença do próprio arquitecto, e que por razões óbvias, não compareceu. Terá sido provavelmente na abertura da exposição, em Março, que os três irmãos, Miguel, Paulo e Catarina Portas, estiveram juntos, com o pai. Seguramente que Miguel Portas saberia que não lhe restava muito mais tempo, mas dificilmente adivinharia que resistiria até um 24 de Abril, uma semana antes de chegar aos 54 anos. Um dia que certamente não desejaria para se despedir.
Um comentário:
excelente Post Pimentão.PM
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