Os noventa anos de Adriano Moreira foram amplamente celebrados, com várias entrevistas, reportagens e homenagens. É mais que justo. Adriano é não apenas um digno Senador ou ancião, no melhor sentido da palavra, quando o havia, mas um dos políticos mais lúcidos e dignos que Portugal teve no último meio século. Transmontano de raiz, habituado a lutar com pouco, tem uma distintíssima carreira académica, com a criação de cursos em Angola e Moçambique, a direcção do ISCSP e a presidência actual da Academia de Ciências de Lisboa. Ocupou lugares governamentais de destaque no anterior regime, onde percebeu bem a questão colonial, e em que tomou medidas de justiça ímpar, como a extinção do Estatuto do Indigenato, passando assim todos os habitantes dos territórios ultramarinos a ser reconhecidos como cidadãos portugueses. Depois de um breve tempo no Brasil, dada a situação do PREC, voltou a Portugal, foi eleito deputado por Bragança pelo CDS, e mais tarde liderou este partido. Mas eleições de 1987, com a onda laranja, os eleitores prefeririam o "Portugal de sucesso" de Cavaco e deram ao CDS o seu pior resultado, reduzindo-o ao célebre "partido do táxi". Adriano deixou assim a liderança do partido e a política activa, dedicando-se à carreira académica.
Ao ouvi-lo numa entrevista televisiva, vi-o demonstrar de novo a sua sabedoria tranquila e as suas preocupações. Que diferença para com os governantes dos últimos anos, falhos de cultura, carreira académica, idoneidade moral e sentido de serviço público! É sintomático que da única vez que se apresentou a eleições lhe tenham dado tão poucos votos: afinal, a classe política é o espelho do povo que neles vota. Felizmente, Adriano Moreira continua aí, como referência moral política indispensável, respeitado à esquerda e à direita. Parece estar em melhor forma que Mário Soares, por exemplo. É curioso que o outro vulto que melhor aconselha à boa governação do país, com ideias que tardam em ser adoptadas, Gonçalo Ribeiro Telles, também tenha este ano chegado aos noventa. Ao que parece, a sabedoria e a dignidade política são hoje quase exclusivas de nonagenários. Ouçamo-los e sigamo-los enquanto é tempo.
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