terça-feira, julho 15, 2014

Acabou o Mundial


Acabou o Mundial e já estou com saudades das noites de bola, das surpresas, dos hinos nacionais e até da música do genérico antes de cada jogo. Não torci pela Alemanha, mas o título acaba por ficar bem entregue à equipa mais consistente, que mais trabalhou e se preparou para esta competição, e que há já uns anos, entre finais e meias, ameaçava mais competição menos competição erguer novo troféu. Aconteceu este ano, às custas de um Brasil menor e impreparado. A Alemanha já pode dizer que ganha mundiais sem ser a RFA, e os anos acabados em 4 revelam-se afortunados para a Mannschaft: conquistaram o título mundial em 1954 (contra a enorme Hungria), em 1974 (frente à Laranja Mecânica de Cruyft) e só falharam 1994, graças a uma extraordinária Bulgária, mas entretanto já tinham ganho em 1990. E pensar que tudo isto começou com uma bisonha derrota de uma velha equipa perante suplentes portugueses...Os 4-0 do primeiro jogo foram uma boa desforra, mas pelo menos Portugal pode dizer que só perdeu com a equipa campeã.

Nunca pensei que a Argentina chegasse à final. Teve alguma felicidade na maneira como o conseguiu, com pouco brilho e muita retranca. Conseguiu-o à custa de uma Holanda com medo de arriscar, ganhou nos penaltys e reeditou as finais de 1986 e 1990, quando as equipas das Pampas e dos tedescos dominaram os Mundiais de futebol. A verdade é que jogaram de igual para igual, com um rigor defensivo (mas porque é que o Benfica não esperou mais tempo para vender Garay?) e uma pressão notáveis, tiveram (escassas) ocasiões para marcar e só sucumbiram ao esgotamento físico, frente a uma Alemanha menos desgastada e a um fantástico golo do descansado Gotze. Tive pena por Enzo Perez e Garay - seria fantástico ter dois jogadores do Benfica, ou quase, campeões mundiais e titulares - e até pelo inconsolável Rojo. Mas a Argentina recuperou algum do estatuto de grande selecção que andava em baixo nos últimos anos. Prémio de consolação, e estranho mesmo, seria a nomeação de Messi para melhor jogador do torneio. Não haja dúvida que o argentino goza de excelente imprensa no mundo do futebol, ainda melhor que a de António Costa na política portuguesa...De resto, James ficou com o justo título de melhor artilheiro, e a Holanda em terceiro, também merecido.

O Brasil conseguiu encaixar dez golos em dois jogos, em sua própria casa. É obra. Depois do Mineirazo, novo banho. Scolari, claro, nunca poderia ficar, mas a futebol brasileiro terá que ser muito repensado e as suas estruturas alteradas. Tal como o português, aliás.

De resto, tivemos um excelente Mundial, que excedeu todas as expectativas (embora haje quem, inexplicavelmente, o considere um dos piores). Jogos emocionantes com muitos e belíssimos golos (o Espanha-Holanda, Alemanha-Argélia ou Brasil-Colômbia, por exemplo), selecções que surpreenderam (Argélia, Costa Rica, Estados unidos, e claro, a Argentina, como finalista), outras que confirmaram as suas boas indicações e que no futuro irão dar ainda mais cartas (Colômbia, Bélgica, Suíça) e as decepções (Portugal, claro, Brasil, Espanha, os mais clamorosos, Itália, uma vez mais, e de certa forma a Inglaterra, com atenuantes). Entre os golos, mais do que o de James ao Uruguai e o de Cahill à holanda, destaco o "salto de peixe "de Van Persie à Espanha e a fabulosa cavalgada de Robben no mesmo jogo, em que ultrapassou dois defesas, sentou Casillas e mudando de direcção atirou para o fundo. Simplesmente inesquecível.

De resto, o mundial teve episódios que não poderiam ser vistos noutras paragens: claques da Bósnia no Pantanal, O God Save the Queen entoado na Amazónia, protestos argentinos antes do jogo do Irão relembrando um terrível atentado com vinte anos, os jogadores alemães a confraternizar com índios da Bahia, fãs enlouquecidas a entrar nos treinos de Portugal para tocar em Ronaldo...O que fica para a história, são os vencedores, da Alemanha, e os vencidos mais evidentes:  Argentina, por chegar à final, e o Brasil pela forma estrondosa como o afastaram. Teve uma consolação: fugiu à completa humilhação de não ver os eternos rivais das pampas sagrar-se campeões em pleno Maracanã, apoiados pelas dezenas de milhares de adeptos argentinos que invadiram o Rio.


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