Se em França uns desaparecem fisicamente, no Reino Unido outros desaparecem politicamente. Os resultados do referendo não só trouxeram um terramoto para a Europa (e possivelmente para a própria União britânica, com a possível secessão da Escócia), mas também sacudiram totalmente a classe partidária dirigente local.
David Cameron pediu de imediato a demissão do governo e do partido, como se sabe. Boris Johnson, o seu grande adversário e um dos grandes vencedores da votação, que todos imaginavam já em Downing Street daqui a meses, sentiu-se com a chão a fugir depois do seu aliado Michael Gove, responsável governamental pela justiça, lhe ter puxado o tapete e anunciado a sua própria candidatura, e deixou tudo boquiaberto quando em conferência de imprensa na semana passada, quando todos achavam que ia anunciar a previsível corrida à liderança torie, declarou que o homem que governaria o Reino Unido não seria ele. Fica-se sem saber se Boris teria aquela ambição ou se é demasiado fraco para avançar à menor dificuldade. Em todo o caso, a sua carreira política ficou seriamente comprometida, a sua popularidade caiu a pique e provavelmente caiu um mito na política britânica. Em todo o caso, a facada nas costas de pouco serviu a Gove, já afastado da corrida à liderança por duas senhoras. Do mal o menos: com a sua face meio ET meio criança de colo, não seria certamente Gove a restaurar o prestígio britânico..
Entretanto, entre os Trabalhistas, a coisa está também a ferro e fogo. Já se sabia que Corbyn não reunia grande simpatia por parte da maioria dos deputados Labour, mas as suas posições europeias algo ambíguas e as acusações de que terá entrado na campanha a favor do "remain" tarde e com pouca convicção (fazendo com que muitos eleitores trabalhistas optassem pela saída) causaram furor no partido, tendo perdido um voto de confiança dos membros da câmara dos Comuns. contam-se espingardas, já há candidaturas à liderança a ser lançadas, como a de Angela Eagle (que bem parece uma espécie de Boris Johnson em versão feminina).
E no partido que mais ganhou o referendo, o UKIP, Nigel Farage está de saída, considerando a sua missão como cumprida. Desta vez parece ser a sério, não uma falsa partida como em 2015. Não se sabe o que acontecerá ao partido, agora que a sua razão de existir se eclipsou. Mas sabe-se o que acontecerá a Farage nos próximos tempos: mantém o seu lugar no Parlamento Europeu, numa instituição com a qual quer acabar, mas que lhe paga o seu avultado salário (ou "o gasto mais inútil da União Europeia", como disse Guy Verhofstadt). O representante do "little people" continua a mostrar todas as suas virtudes e o seu grande sentido de estadista. é duvidoso que lhe tenha passado pela cabeça sair do PE, mostrando uma réstia de dignidade.
Parece que só entre os liberais-democratas, os verdes e os nacionalistas é que as lideranças estão postas em sossego, a salvo dos terramotos que varrem a classe política dominante. Tudo isto numa semana em que o relatório Chilcot arruinou ainda mais a imagem de um dos primeiros-ministros mais duradouros da história do país, Tony Blair.
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