quinta-feira, outubro 03, 2013

Rescaldo autárquico (global)

E vamos agora aos resultados das autárquicas fora do Porto. Ouviram-se muitas análises, mais ou menos a quente, muitas absolutamente divergentes, algumas totalmente desconexas.

O PS ganhou. Não há que relativizar nem camuflar. O PS é o vencedor destas eleições e muda assim o ciclo de doze anos, em que normalmente o panorama camarário dá uma volta - tinha sido assim em 1989 e 2001. Ganhou em Lisboa com uma maioria inédita para um só partido (eu sei que a vitória é de António Costa, mas que eu saiba ele ainda é do PS, e seria bom não esquecerem os movimentos de Helena Roseta e Sá Fernandes), reconquistou Sintra, Gaia, Gondomar e Valongo (para quem não reparou, voltou a ser o partido dominante no Grande Porto), conquistou pela primeira vez Vila Real e o Funchal (com uma larga coligação), e teve um resultado no Porto que não envergonha. Como as autárquicas são uma infinidade de eleições, também teve alguns desaires de monta, como a Guarda, Braga (finalmente), e sobretudo as que perdeu para a CDU: as capitais distritais Évora e Beja, a populosa Loures, Grândola, Alcácer, etc. No cômputo geral, é uma vitória clara - ganha metade das câmaras - mas não tem muitos mais votos que o PSD. E o aviso dos independentes também se lhe aplica. Nos próximos 12 anos deverá ser o partido maioritário nas autarquias.
 
O PSD perdeu com estrondo. Perdeu o Porto de forma humilhante, Sintra, Gaia (aqui perdeu cerca de 40 pontos em relação a 2009), Vila Real, Coimbra, Funchal, e nos grandes centros urbanos, a começar por Lisboa, teve resultados anedóticos, mesmo em coligação com o CDS. Símbolos maiores da clara derrota foram o Porto, para onde Menezes tinha deslocado mundos e fundos, e a Madeira, onde o jardinismo se esboroa a olhos vistos e da totalidade das câmaras passa a apenas quatro, perdendo mesmo a capital regional. De conquistas de registo temos a Guarda, desde sempre do PS, e Braga, onde Ricardo Rio conseguiu à terceira tentativa acabar com o feudo de Mesquita Machado e herdeiros. Manteve ainda capitais de distrito onde o anterior titular se retirava (Bragança. Aveiro, Viseu, Santarém, Faro, Ponta Delgada). Não sei quais os "efeitos nacionais" que se podem retirar daqui, mas de certeza que não são muito bons.
 
A CDU faz lembrar aquele exemplo do relógio parado que acerta duas vezes ao dia. Depois de tantos anos a afirmar que "os objectivos foram cumpridos", teve enfim toda a razão: ganhou inequivocamente e atingiu os seus grandes objectivos: subiu em votos e mandatos e reconquistou câmaras emblemáticas, como Évora, Beja, Loures e Grândola. Voltou a dominar o Alentejo e a margem Sul do Tejo, afirmou-se novamente como uma poderosa força autárquica, meteu o Bloco no bolso e rejuvenesceu o eleitorado e os candidatos (se bem que tenha recorrido a alguns "dinossauros"). A acompanhar com atenção.
 
O CDS pode esboçar algum pequeno sorriso, mas longe da euforia de Portas e do "penta". Travou um declínio até agora imparável, descolou da única câmara que tinha, conquistando cinco, aumentou a influência nas ilhas e acompanha o PSD nalgumas vitórias de coligação. Mas ao mesmo tempo partilha com os "laranjas" algumas derrotas humilhantes, e em termos de votos nacionais subiu pouquíssimo. E olhando mais de perto, teve votações residuais, quase invisíveis, em autarquias que tem tempos dominou (Bragança, Vila Verde, Paredes, S. João da Madeira). Tem uma quota parte de mérito na vitória de Moreira, mas menos do que o que quiseram fazer crer. Já não é o partido de uma câmara só, mas está ainda muito longe de voltar a ser uma força local a sério (como a CDU).
 
O Bloco confirma-se como agregador de votos urbanos nalguns nichos específicos. Municipalmente, vale quase nada. Ninguém está interessado em atitudes de protestos e propostas fracturantes para resolver os problemas locais. Por isso perderam Salvaterra e nem o "coordenador" conseguiu entrar na vereação de Lisboa, mais uma vez. Deve ser a maldição de Sá Fernandes. No Porto, outro resultado decepcionante, e nem os movimentos que apoiaram em Braga e Coimbra tiveram grande êxito. Comparativamente com a CDU, fazem figuras de anões. Não adianta falar na "derrota do governo", até porque nas explicações para o desastre meteram os pés pelas mãos.
 
Os independentes, guindados pela sucesso de Rui Moreira (mas também pelos casos de Matosinhos ou Portalegre) ganharam um enorme destaque. Já não era sem tempo. Já lá vai o tempo em que os partidos se julgavam donos e senhores dos votos e das câmaras, mas aparentemente nem todos entenderam isso.
 
Gostei: obviamente da vitória no Porto da candidatura, que apoiei e na qual quase ninguém acreditava no início; das mudanças em Vila Real (desde 1976 nas mãos do PSD, e a que o meu Avô presidiu no tempo da outra senhora) e Braga, do triunfo de Guilherme Pinto em Matosinhos e do terramoto na Madeira. Não gostei da vitória dos Isaltinos em Oeiras e da derrota do PSD em Caminha (o candidato parecia-me um homem sério). Bem vistas as coisas, foram umas boas eleições.
 
Momentos que ficaram da noite: Guilherme Aguiar e CAA a reivindicarem ambos terem sido a escolha pessoal de Luís Filipe Menezes e a histeria em volta de Isaltino, que levou uns quantos perturbados a irem vitoriá-lo junto aos muros da prisão.

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