Como disse no anterior post, é extremamente curioso que dez candidatos tenham obtido todas as assinaturas necessárias para concorrer às eleições presidenciais. Nunca se tinha visto semelhante coisa, já que implicam uma certa máquina de campanha que não está ao alcance de todos, muito menos de quem não é apoiado por estruturas partidárias.
Mas à parte isso, e além de Marcelo Rebelo de Sousa, temos mais nove candidatos. Alguns despacham-se num instante. Jorge Sequeira não parece desprovido de juízo, mas não percebo a razão da sua candidatura. O mesmo se diga do socialista Cândido Ferreira (em dez candidatos há dois socialistas de Leiria, o que é extraordinário dado que o PS nem tem uma grande base eleitoral nesse distrito), que ainda não percebi se desiste ou não. O Tino de Rans, calceteiro e "cantor", ex- presidente de junta, ex-congressista do PS, ex-concorrente de reality-shows, concorre provavelmente para ganhar mais algum protagonismo (nada contra se trouxer algo de positivo à terra). Paulo Morais parece mais bem preparado e fundamentado do que quando lança atoardas abstractas sobre a corrupção, mas também não fala de outro assunto, ainda que aquilo de que fale seja de primeira importância. Edgar Silva e Marisa Matias não são reais candidatos à presidência, mas sim, como sempre, peões dos seus partidos para marcar posição. E o ex-padre madeirense nem parece conhecer bem as funções presidenciais. Também Marisa traz demasiada ideologia para a campanha.
Henrique Neto, o primeiro a lançar a candidatura, já teve sondagens interessantes, mas com a chegada dos concorrentes afundou-se nas intenções de voto. Ainda assim tem alguns nomes interessantes na sua lista de apoiantes, reunindo gente do PS, PSD e CDS. A experiência como empresário de real sucesso e a credibilidade pelas denúncias internas no PS dão-lhe algum prestígio. Pode ser prejudicado pela abundância de candidatos nas mesmas áreas, embora seja "polivalente" o suficiente para pescar em vários sensibilidades partidárias.
Restam então Maria de Belém e Sampaio da Nóvoa. A ex-Ministra da Saúde e da Igualdade foi uma jogada estranha de certos sectores do PS, alguns para aborrecer Costa, outros porque lhe eram devedores de apoios passados (Alegre, por exemplo), e ela própria porque se julga com uma importância política bastante superior à real. Se as suas sondagens são favoráveis e nalguns casos até a colocam em segundo lugar, deve-se provavelmente a importantes apoios de quadros, a apoiantes do PS que não se revêm em Nóvoa nem em Neto e numas franjas do centro. Demasiado para alguém de currículo político mediano e que francamente, só com muita imaginação se consegue imaginar como chefe de estado. Para ser mauzinho, depois de Miguel Sousa Tavares a dar o exemplo da revista presidencial às tropas, a ideia de Maria de Belém a fazer um comunicado da maios alta importância à Nação é algo do domínio do surreal.
Sampaio da Nóvoa, enfim. O reitor que se tornou conhecido do público pelos seus discursos, empolgantes e arrebatadores para alguns, líricos e vazios para outros. É salutar que haja pessoas sem uma carreira partidária como suporte a candidatar-se ao cargo, mas a verdade é que Nóvoa, tirando uma respeitável carreira como académico, e a sua tarefa de unir a Clássica à Técnica formando assim a Universidade de Lisboa, não tem um currículo político (que nunca teria de passar pelos partidos) particularmente notável. Para isso já tivemos Fernando Nobre, com uma carreira mais estimável, mas que se revelou um desastre na política. O seu "Tempo Novo" significa exactamente o quê? Uma achega do V Império? Ou um conluio demasiado próximo do actual Governo? Outro aspecto singular mas nem assim positivo da campanha de Sampaio da Nóvoa é a profusão de mandatários por cada causa, ainda por cima num sistema de paridade, o que na realidade dá dois por causa, havendo mesmo lugar a uma "coordenadora das causas", Gabriela Canavilhas. Tudo isso dá-lhe um travo demasiado burocrático, o que a juntar ao seu discurso enigmático não deixa entrever quem é na realidade Sampaio da Nóvoa e qual o seu real valor. Francamente, custa-me a imaginá-lo como chefe de estado de Portugal, ainda que tenha o apoio de três anteriores PRs. Mas Soares já teve escolhas estranhas além dele próprio, e Eanes esteve por duas vezes na comissão de honra de Cavaco. Mas para conhecer melhor Nóvoa, se é que isso é possível, talvez uma segunda volta não fosse pior. Senão, resta a curiosidade de saber o que fará ele depois das eleições.
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