A par das presidenciais, um dos grandes assuntos políticos do momento é a saída de Paulo Portas da liderança do CDS-PP e a sua difícil sucessão.
Sobre isso, tem havido artigos e artigos, dúvidas e interrogações, sobre a carreira de Portas e o que fará a seguir. A carreira é conhecida: jornalista desde muito novo, militante da JSD durante algum tempo, director do Independente nos anos do Cavaquismo, arquitecto do "monteirismo, deputado de rompante do CDS-PP, líder do partido, ministro da Defesa, e depois de um hiato de dois anos, de novo líder do partido e retorno ao governo, à importante pasta dos Negócios Estrangeiros e ao recriado cargo de Vice-Primeiro-Ministro. Um longo percurso político, mais rico do que o de qualquer ex-líder do seu partido (e não me esqueço de Adriano nem de Freitas), contrabalançado pelas inúmeras controvérsias, das intrigas políticas e quezílias birrentas aos casos mal explicados, acabando tudo na famosa "decisão irrevogável", que até hoje ainda não percebi se foi uma atitude racional ou um impulso.
Portas é das figuras políticas mais interessantes dos últimos quarenta anos. Desde logo porque não é muito comum ver-se um jornalista, para mais com ares rebeldes, entrar na política e ascender a uma cúpula partidária. Conseguiu dar outra importância ao CDS-PP, não deixando tombar de novo no "rigorosamente ao centro" que o tornou no "partido do táxi" e corrigindo um caminho demasiado para a direita e o eurocepticismo, e levou-o novamente para o governo, por duas vezes. Permitiu também que aparecesse uma nova geração de quadros. Mas, talvez dado o seu carácter pouco fiável, a sua ânsia de tudo controlar no partido e a alguns azares de percurso, falhou no objectivo de tornar o CDS num grande partido liberal-conservador oposto ao PS, deixando o ambíguo PSD para trás. Falhou parcialmente no mais modesto desejo de reconstruir o partido a nível local e regional, como se vê pelo declínio nas autarquias, que nem a tímida recuperação de 2013 disfarça que em tempos tenham controlado câmaras como Aveiro, Leiria ou Viseu (escrevi parcialmente por causa das conquistas de deputados em círculos como Faro e Coimbra e sobretudo à posição de primeiro partido da oposição na Madeira). E falhou, e aí sim, imperdoável, no guião da reforma do estado, aquilo a que se dispunha a criar enquanto nº2 do Governo, que podia ser o seu grande legado político e que não passou de um manual de banalidades burocráticas e abstractas e letra aumentada. Esse é o grande falhanço de Portas, que poderia redimir tudo o resto.
Sai da sua posição compreendendo que o ciclo político mudou e que são precisas caras novas. Para a liderança do partido perfila-se o mui popular (internamente) Nuno Melo e a igualmente popular (externamente) Assunção Cristas. Mota Soares e João almeida eram outras hipóteses, sensatamente descartadas. E haverá provavelmente a interferência de Filipe Anacoreta Correia, provavelmente recordado do brilharete surpresa de Ribeiro e Castro. Seja quem for, o legado de Portas pesará.
Quanto ao futuro do ex- nº 2 do Governo, segundo o próprio, será de trabalhar e criar empresas, com a experiência, o savoir-faire e os contactos adquiridos nas funções governamentais dos últimos anos. Uma nova etapa para Portas, embora seja provavelmente um intervalo até à sua próxima aparição política, coisa a que voltará forçosamente um dia. Há quem aposte que irá tentar Belém, o que não deixaria de ser estranho num homem filiado na Causa Real. Seria preferível que se dedicasse aos seus velhos projectos de escrever romances e guiões para cinema. Poderia sair algo de interessante, e depois um bom guião de cinema sempre seria a forma de compensar o falhanço do guião para a reforma do Estado.
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