Balanço. Se não fosse o formalismo de se esperar pelo fecho das urnas em Itália e os boicotes em murça (não isentos de razão, pelo que vi), já teríamos os resultados completos e a distribuição final dos eurodeputados portugueses. Assim, temos de esperar mais um pouco. Mais pelos eleitos do que pelos números.
A abstenção, como de costume nestas eleições, atingiu níveis estratosféricos. Desta vez passou os dois terços do eleitorado. Nada que espante. Mas é curioso que quanto mais periféricos são os estados-membros, maior é o número de eleitores que não se dão ao trabalho de ir às urnas. Vejam-se os 87% de abstenção na Eslováquia e os 90% de participação na Bélgica. Portugal é definitivamente um país periférico.
O PS ganhou, ponto. Só que ganhou com menos de 4% de avanço. tudo o que fosse menos de 5% seria pouco satisfatório. E sejamos francos, menos de 31% é um número fraquinho. O número de Seguro, proclamando a "grande vitória", é patético, sobretudo olhando para a assistência socialista, tepidamente sorridente, e às próprias declarações de António Costa e de outros, que reconheceram que não era um grande resultado. Na primeira fila via-se Eduardo Lourenço, candidato simbólico pelo PS. Ver um dos principais pensadores portugueses cabecear de sono durante o discurso de Seguro devia levar as pessoas "a tirar as suas próprias ilacções".
A coligação PSD/CDS deve o seu paupérrimo resultado não apenas ao desgaste e à impopularidade do governo mas também à fraca campanha de constante disparo sobre o PS e sobre Sócrates. Uma campanha em busca de fantasmas, no fundo, e que surpreendeu pela negativa. Paulo Rangel é capaz de muito melhor. Provavelmente não se lembrou que em 2009 Vital Moreira recorreu ao mesmo cacete argumentativo e teve o resultado que se viu. A pomposa "Aliança Portugal" só não teve um resultado desastroso por comparação com o do PS.
Depois do reforço das autárquicas, a CDU teve mais um bom resultado. Não é estrondoso e ainda lhe falta confirmar o terceiro eurodeputado, mas conseguiu passar os dois dígitos numa eleição nacional. Depois de anos e anos a reclamar vitória com resultados fraquinhos, os vermelho/verdes conseguiram enfim acertar o discurso com a performance. Conseguiram cavalgar a onda de protesto com muito mais competência que o Bloco e estão aparentemente a ganhar com a renovação progressiva de quadros. Até onde é matéria que se deverá seguir.
O Bloco continua em queda livre. Por pouco Marisa Matias não conseguia ser eleita. A sangria de elementos conhecidos (Joana Amaral Dias é o último exemplo), o vazio das causas fracturantes, a falta de carisma na estranha liderança bicéfala (ou "paritária"), a intolerância a oposições internas e a pura e simples incompetência ditaram mais este fraco resultado. Desconfia-se que não fique por aqui.
O Partido da Terra, ou melhor dizendo, Marinho Pinto, surpreenderam ainda mais do que as sondagens mais favoráveis previam. Havia a hipótese de elegerem um deputado. Agora há a hipótese de elegerem dois. Perguntava há tempos qual seria o peso eleitoral do ex-Bastonário da OA. Está visto que o tem, e não é assim tão pouco. Agora vamos ver o que vale a sua acção no Parlamento Europeu, se mantém o seu populismo verbal e manual (que não de substância do discurso, bem mais moderado do que o estilo faz aparentar), como irá defender as suas ideias. E já agora, se o MPT ganha alguma coisa com isso. De qualquer maneira, está de parabéns: conseguiu ser a primeira figura pública candidata por um pequeno partido a ser eleita para Estrasburgo (Esteves Cardoso, Laurinda Alves e Victorino de Almeida já o tinham tentado, sem sucesso).
Os "pequenos" conseguiram um resultado global mais alto do que o costume. De entre as habituais décimas, ressalva-se de novo o MRPP e o Partido dos Animais, e sobretudo o novíssimo Livre. Um jornal qualquer, creio que o Público, classificava o seu resultado como uma derrota, com seta para baixo e tudo. Parece-me um erro prematuro. Afinal de contas, o Livre teve 2,2%, longe de servir para reeleger Rui Tavares, claro. Mas ainda assim, permitiria uns dois ou três deputados em legislativas. E convém recordar que o Bloco teve ainda menos nas primeiras eleições a que concorreu, precisamente umas europeias, em 1999, com outra máquina partidária, outro mediatismo e com apoiantes já com larga experiência política. Sem figuras públicas (apesar do apoio de algumas, como Ricardo Araújo Pereira) e sem grandes meios de campanha, pode-se dizer que os primeiros números do Livre são promissores. Afirmar que são uma desaire e uma desilusão é uma leviandade própria de quem não quis perder muito tempo com o assunto.
As consequências imediatas parecem estar a atingir, antes de mais, o PS. Quando é que um partido vencedor registou tal convulsão interna?
No resto da europa, o previsto: reforço dos eurocépticos e da direita radical no Reino Unido, Itália, França e Dinamarca, reforço da esquerda radical na Grécia (onde saiu vencedora) e em Espanha (além da Esquerda Unida, o novo movimento dos "Indignados", de inspiração chavista, teve quase 8%). Em Itália, as reformas de Mateo Renzi parecem estar a agradar aos italianos: o seu Partido Democrático obteve mais de 40%, o que num país tão politicamente instável e fragmentado é notável. Beppe Grillo voltou a conseguir números elevados, mas roubados directamente a Berlusconi e à refundada Forza Itália. É provavelmente a maior esperança para os partidos europeus mainstream.
Nenhum comentário:
Postar um comentário